Fausto de Goethe, no filme dirigido por F.W. Murnau: "Faust - Eine deutsche Volkssage", Alemanha, 1926. |
Dos Quatro Cavaleiros do Apocalipse Financeiro a uma Europa reforçada, e a tentação de Fausto
Beijing hints at bond attack on Japan
A senior advisor to the Chinese government has called for an attack on the Japanese bond market to precipitate a funding crisis and bring the country to its knees, unless Tokyo reverses its decision to nationalise the disputed Senkaku/Diaoyu islands in the East China Sea.
By Ambrose Evans-Pritchard. The Telegraph, 8:31PM BST 18 Sep 2012
Debt crisis: central bank action is work of the devil, says Germany's Jens Weidmann
Jens Weidmann said that efforts by central banks to pump money into the economy reminded him of the scene in Faust, when the devil Mephistopheles, “disguised as a fool”, convinces an emperor to issue large amounts of paper money. In Goethe’s classic, the money printing solves the kingdom’s financial problems but the tale ends badly with rampant inflation.
By Louise Armitstead, Chief Business Correspondent. Telegraph, 5:56PM BST 18 Sep 2012
O QUE MUDOU NAS ÚLTIMAS SEMANAS NA EUROPA... E EM PORTUGAL
BCE mais forte, mutualização parcial dos riscos soberanos sistémicos, maior coerência comunitária nas políticas fiscais e orçamentais e correspondente reforço dos mecanismos de supervisão e aprovação sucessiva, atuações de tipo keynesiano à escala europeia (ex: rede de mobilidade sustentável para pessoas e mercadorias, com prioridade já assumida pela ferrovia europeia interoperável e pelo transporte marítimo e fluvial) e ainda, criação dos primeiros corpos e comando estratégico de uma defesa militar europeia comum, agora que a América se afasta inexoravelmente do Reino Unido —nomeadamente pelo escândalo sem precedentes associado às falcatruas da City Londrina nas chamadas operações de "re-hypothecation"— e do resto da Europa, deixando a NATO num limbo de ineficácia crescente.
Consequência: não há mais lugar para a dupla Passos Coelho-Vítor Gaspar, nem para Paulo Portas. Ou seja, é necessário formar e dar posse a outro governo PSD-CDS.
Mário Soares tem a intuição certa sobre a presente crise governamental ao sugerir uma mudança de governo. O Presidente da República pode e deve promover a metamorfose da coligação.
A AUSTERIDADE EUROPEIA E A TENTAÇÃO DE KEYNES
Custo da austeridade nos vários países europeus onde programas explícitos de austeridade constam das propostas para os orçamentos públicos para 2012 — segundo a AFP, baseada em cifras do Eurostat, Insee e OCDE. Clicar na quadro para ampliar. Ver mapa. |
A expansão da massa monetária, do aparelho de estado, do emprego não produtivo, e sobretudo do paternalismo governamental, com base em investimentos públicos suportados por cargas fiscais crescentes e saldos orçamentais e das balanças de capital e de pagamentos negativos, não é uma agenda que John Maynard Keynes (1883-1946) pudesse subscrever inteiramente, na medida em que Keynes encarou o cenário da intervenção do Estado em países onde o potencial produtivo e de exportações e a dimensão interna das economias são suficientes para gerar a riqueza e a poupança necessárias à superação das depressões e recessões que ciclicamente ocorrem, nomeadamente por efeito da inovação tecnológica e das assimetrias de preços dos bens e serviços que circulam através do comércio mundial.
Acresce que a estes dois factores de desequilíbrio verificados ao longo das últimas duas décadas, fruto de uma fuga em frente face aos efeitos do abandono progressivo da produção industrial e consequente destruição de empregos produtivos, a par da perda de competitividade e desvalorização do emprego associado a uma massa crescente de desempregados de longa duração e empregos burocráticos, tanto nos EUA como na Europa, levou-se a cabo um processo selvagem de globalização comercial e financeira destinado sobretudo a obter, pela via da especulação financeira e da sobre-exploração do trabalho global, uma compensação pelos rendimentos decrescentes nas sociedades ricas e desenvolvidas, mas onde o instalado círculo vicioso do bem estar social, do consumismo desmiolado e da suposta educação permanente acabaria por empurrar-nos para uma situação de debilidade estrutural silenciosa, mas a longo prazo fatal.
A liquidez dos Estados Unidos e da Europa é uma liquidez cada vez mais rarefeita que os emergentes “criadores de riqueza” tendem a descontar nas suas transacções comerciais, usando a enorme acumulação de dólares, de euros, mas também de outras divisas (rublos, pesos argentinos, ienes…), a par do ouro, para adquirir ativos mais sólidos e recursos futuros, nomeadamente, direitos de exploração no campo da energia, dos transportes e dos recursos naturais, com especial destaque para os alimentares. Basta olhar para as compras externas da China, sobretudo na América do Sul e África, mas também já na Europa e nos Estados Unidos, para avaliarmos o alcance potencialmente destrutivo dos desequilíbrios mundiais, que não param de crescer.
Uma agenda keynesiana não é possível no quadro da globalização em curso, na medida em que esta é uma globalização assimétrica: os países ricos e desenvolvidos empobrecem pela via da destruição das suas classes médias, da destruição de milhões de empregos e pela redução abrupta do consumo, alimentado durante décadas por vantagens financeiras e monetárias especulativas, enquanto os ditos países emergentes, ao mesmo tempo que superam atrasos económicos, sociais e tecnológicos de décadas, sugam, por assim dizer, uma a uma, décadas, se não séculos, de acumulação de riqueza ocidental, comprometendo a viabilidade dos mercados de trabalho na Europa, nos Estados Unidos e até já nos próprios países emergentes —pela mesma via tecnológica que eliminou milhões de postos de trabalho nos EUA e na Europa ao longo dos últimos quarenta anos, substituindo-os por uma nova massa assalariada com direitos sociais decrescentes, a que já se convencionou chamar precariado!
Está em curso, pois, uma tentativa inédita de levar as ideias de Keynes à economia global — mas com resultados que são opostos aos esperados!
Os exercícios em curso nos EUA e na União Europeia vão neste sentido, mas a sua originalidade é suicida. A liquidez gerada perde-se no buraco negro dos derivados financeiros especulativos (OTC), não chegando à economia, ao mesmo tempo que deixa os bancos em quarentena, coloca as empresas em situação cada vez mais complicada, e lança no desemprego vagas sucessivas de milhões de pessoas.
Assim, os países que foram caindo na armadilha do endividamento estão a ser tratados, por exemplo, no interior da União Europeia, não como partes efectivas de economias regionais com uma só moeda, mas como países estrangeiros! Desta forma, o nó que aperta hoje as economias grega, espanhola, irlandesa e portuguesa de forma intolerável é o oposto de uma receita keynesiana.
Os Estados Unidos acabam de anunciar o seu terceiro programa de expansão monetária (Quantitative Easing 3). A União Europeia, se quiser manter o euro, parece também não ter outra alternativa diversa desta espécie de redução do peso do endividamento pela via da inflação geral dos preços subsequente a uma tal forma de desvalorização da moeda. Vai pois pelo mesmo caminho dilemático.
O prolongamento das metas dos Memoranda da Troika, na Grécia, como em Portugal, assim como as facilidades mitigadas dadas até agora à Espanha, vão neste mesmo sentido.
O FMI e os Quatro Cavaleiros do Apocalipse Financeiro (JP Morgan, Bank of America, Citi, Goldman Sachs) apostam nesta forma de keynesianismo puramente financeiro, pretendendo assim reduzir administrativamente o valor das dívidas americana e europeia (haircut at large) aos credores e fornecedores internacionais, ao mesmo tempo que acreditam ser capazes de tapar com sucessivos maremotos de massa monetária o buraco negro dos Derivados. Veremos se o capitalismo de estado americano é mesmo keynesiano, ou apenas um estratagema destinado a salvar os Quatro Cavaleiros do Apocalipse residentes em Wall Street.
Quanto à União Europeia, terá que conseguir a quadratura do círculo, ou morrer na praia.
Ou seja, à medida que for forçada pelas circunstâncias a embarcar num programa keynesiano de expansão da massa monetária destinada a diminuir o peso das dívidas soberanas no interior da União, ou é ao mesmo capaz de implementar mecanismos de convergência orçamental, fiscal e de supervisão favoráveis a uma maior coerência económica, institucional e financeira em todo o espaço comunitário — ou o baralho do Euro ruirá com enorme estrondo.
PORTUGAL
Basta olhar atentamente para o quadro de austeridade europeia acima publicado [clicar na imagem para ampliar] para intuir a dor e o caos político e social que temos pela frente. Se não erguermos desde já barreiras de contenção ao terrorismo fiscal em curso, e que promete aumentar de intensidade, se não trabalharmos com coragem na emenda do regime degenerado que deixámos crescer à nossa volta como um campo de ervas daninhas, espera-nos o desastre — pela certa!
Mas também, sem um empurrão de fora, dificilmente conseguiremos derrotar os cleptocratas, os monopólios, as corporações e as burocracias privilegiadas pela captura que há muito realizaram do degenerado regime democrático que temos.
A reforma do nosso regime constitucional, absolutamente necessária e inadiável, exige sinais claros vindos de Bruxelas e de Frankfurt — para que o povo, as classes médias e uma parte das elites que não pertence à cleptocracia, possam reunir esforços suficientes para mudar de hábitos e de vida.
Precisamos de UMA NOVA CONSTITUINTE, de OUTRA CONSTITUIÇÃO e de uma QUARTA REPÚBLICA !