sábado, junho 09, 2012

Remarx?

Slavoj Zizek. d'aprés Luca del Baldo (2011)

Quem fará a revolução?

Slavoj Zizek em Atenas 2012 não é o Sartre cauteloso e realista que visitou Portugal em 1975.

O discurso proferido pelo filósofo radical esloveno Slavoy Zizek num debate promovido pelo partido Syriza, em Atenas no passado dia 3 de junho, e intitulado “The heart of the people of Europe beats in Greece”, merece o visionamento repetido por parte dos eleitores do PS, do Bloco e do PCP. Recomendo também que se complemente tal exercício com uma meditação sobre esta frase de Zizek retirada do seu volumoso The Paralax View:

(...) today, the only political agent that could logically be said to represent the interests of capital as such, in its universality, above its particular factions, is Third Way Social Democracy....)"

Quer dizer: Blair, Obama, Pinto de Sousa, mas também Hollande (mais perto do inspirador Olof Palm?) representam afinal o mecanismo crítico que tem garantido a continuidade do sistema que em retórica populista acusa de ser propenso à injustiça, mas reformável em democracia.

As contradições no interior do PPD/PSD, nomeadamente as que opõem hoje Balsemão e Cavaco a Passos Coelho, retratam de forma ímpar esta noção da representação contraditória, oscilante, rotativa, dos interesses dominantes do Capitalismo, mesmo numa fase de aparente implosão.

Ainda assim, creio que Zizek deveria inquirir a proveniência profissional da sua audiência interessada, antes de embrulhar entusiasticamente as suas palavras no calor das massas.

A burocracia, nomeadamente intelectual, nunca foi tão extensa, nem esteve tão integrada no aparelho político e administrativo do Capitalismo como hoje. Nunca tanta riqueza foi transferida das classes produtivas para os donos do capital, mas também para a crescente população, sobretudo urbana, cuja maior contribuição para o dito Crescimento tem decorrido sobretudo pelo lado do consumo e mais recentemente pela via sem saída do endividamento.



A intelectualização e burocratização do Ocidente foi conseguida através de duas vias: o desemprego do trabalho manual e das tarefas repetitivas a favor de tecnologias mais rentáveis e socialmente inertes, e a eliminação maciça de empregos rurais, industriais e mesmo pós-industriais para os antigos espaços coloniais, onde o preço do trabalho e os custos de contexto (higiene, segurança, ambiente) continuam a ser muito inferiores. Enquanto o preço do petróleo e do gás natural, e as novas sociedades asiáticas, africanas e latino-americanas, o permitirem, estas duas formas de substituir o trabalho produtivo na Europa e nos EUA continuarão a pressionar as economias destas regiões no sentido da sua desintegração financeira, social, política e cultural.

Desde 1973 para cá, o rotativismo keynesiano, mais social-democrata, ou mais neoliberal, foi garantindo a sobrevivência, embora empobrecendo, das chamadas classes médias. Mas a crise do endividamento explosivo das empresas, das famílias e dos governos, desencadeada em 2007-2008 com o rebentamento da bolha imobiliária americana e o colapso do Lehman Brothers, e que hoje se agrava hora a hora, está a levar os povos da Europa e dos Estados Unidos para um beco sem saída.

Salvo os mais ricos —pouco mais de cem mil portugueses, três milhões de americanos (EUA) e 5 milhões de europeus (UE)—, a crise ameaça levar ao empobrecimento muito rápido, pela via do desemprego, da falta de emprego, da queda das remunerações, e da subida criminosa dos impostos, mais de 806 milhões de europeus e americanos! Ora bem, não vejo eu, nem certamente Slavoj Zizek e muitos outros, como sairemos deste bloqueio em larga escala sem, ou uma paragem e reforma radical dos pressupostos da globalização, mediada até lá por uma revalorização do trabalho, das coisas e do dinheiro, ou então... uma revolução!

As ditas classes médias empobrecidas, quando perceberem que os mais ricos não irão em seu auxílio, por desorientação e impotência momentânea, mas também por puro egoísmo, ou mesmo banditismo descarado, e que o governo está irremediavelmente falido, irão progressivamente engrossar, nomeadamente com os seus conhecimentos específicos e grande potencial de fogo informativo, técnico e ideológico, as ruas do protesto democrático.

Os poderes instalados terão uma irreprimível tendência para reforçar as leis e as forças repressivas, sem cuidar sequer da constitucionalidade e legitimidade cultural das decisões. Gasolina, portanto, sobre uma fogueira que não pára de alastrar!

E agora?

sexta-feira, junho 08, 2012

Espanha?

Resgate iminente faz renascer a velha questão ibérica: uma Espanha única, impossível, ou uma Comunidade de Estados Ibéricos Independentes (CEII)?


As malfadadas torres Kyo, Caja Madrid e agora Bankia são um símbolo bem sugestivo do ascenso e colapso financeiro da Espanha

Entre 40.000 y 100.000 millones

La horquilla, pues, que se baraja sobre el dinero que necesitan las entidades españolas oscila entre los 40.000 millones y los 100.000 millones. En el seno del Partido Popular Europeo, su secretario general, Antonio López-Istúriz, ha asegurado en una entrevista en TVE que los bancos requerirán entre 80.000 y 100.000 millones para sanearse. "Las cifras que se están manejando están en torno a los 80.000 o 100.000 millones o menos, dependiendo de los informes", dijo el eurodiputado de la formación de Rajoy. El Mundo (8 jun 2012).


Más vídeos en Antena3

Los mineros retoman el corte de carreteras como protesta por la crisis en el sector

Los mineros del carbón intensifican sus protestas en su sexto día de huelga indefinida. Hoy han cortado varias carreteras en Asturias y León enfrentándose a los equipos antidisturbios lo que ha provocado retenciones kilométricas. El tráfico en la autovía A-66 ha estado interrumpido casi 4 horas. Además, los manifestantes también han interrumpido el tráfico ferroviario entre Asturias y La Meseta. Antena 3 (7 jun 2012).

Boa parte do buraco negro das finanças espanholas resulta de investimentos especulativos nos mercados imobiliários e de derivados financeiros OTC por parte de especuladores vários, mas também de fundos de pensões cujos rendimentos estavam a ser comidos pela inflação real e pela imprudente política de destruição das taxas de juros (BoJ, Fed, BCE). Se os especuladores devem assumir as suas perdas sem mais (é essa a regra do jogo!), já os fundos de pensões e as contas de poupança mais expostos criam um problema social grave. Aqui, os governos deverão intervir, protegendo as pensões e as poupanças, mas tomando o comando das instituições aventureiras.

Quanto à dívida pública espanhola, não há outro remédio se não encolher o Estado e as autonomias...

A Espanha poderá ter que caminhar para um estado federal — monarquia, ou república, não sabemos. Mas creio que seria prudente manter a monarquia durante mais uma geração, promovendo entretanto um estado federal, dentro do qual cada estado federado teria que viver, naturalmente, com o que produz e tem, deixando de reivindicar a Madrid uma ilusória e caríssima igualdade económica. Cada novo estado federado passaria a exigir democraticamente das suas administrações mais contenção de gastos, fim das mordomias e dos almoços grátis, e sobretudo estratégia económica, social e organizacional.

Numa segunda fase, já com a União Europeia bem adiantada, Espanha faria uma transição constitucional para o regime republicano federal a que Portugal se juntaria formando a Comunidade Ibérica de Estados Independentes. Esta Comunidade seria, por sua vez, uma das sub-unidades fortes da União Europeia consolidada.

A Espanha de hoje é um projecto político incompleto, sonhado desde o século X, mas que nunca foi cumprido, tendo dado origem a inúmeras e sangrentas guerras civis cujo resultado mais visível foi o atraso do nascimento de uma grande comunidade de nações livres, democráticas, responsáveis, pacíficas e produtivas. Sob bandeiras equívocas e ilusões sucessivas os povos ibéricos foram sendo arrastados ao longo da sua história católica para uma sangria sem nome nem desculpa, sobre a qual se erigiram os regimes arrendatários e déspotas que se mantiveram no poder até mais esta bancarrota geral da Ibéria.
El título de Imperator (totius) Hispaniae del latín, Emperador de (toda) España nació como término de la mano de los monarcas de León, al menos, en el siglo X. Fue usado esporádicamente en los dos siguientes siglos, según los reyes de la Iberia cristiana luchaban por la supremacía y por el imperiale culmen. Durante la Edad Media, el topónimo latino "Hispania", sus deformaciones (como "Yspania" o "Spania") o cualquiera de sus versiones romances (como "España" o "Espanna") se usaba, en singular o en plural, para referirse al total de la Península Ibérica — in Wikipedia.

Los monarcas que unieron las Coronas de Castilla y Aragón intentaron revivir el antiguo recuerdo de una Hispania romana o visigótica con el fin de promover una fidelidad mayor hacia una históricamente resucitada España in — España en Europa: Estudios de historia comparada: escritos seleccionados, página 75, Wikipedia.

Al final de la Edad Media, con el matrimonio de Isabel I de Castilla y Fernando II de Aragón, estas dos coronas peninsulares se aliaron, conquistando el Reino nazarí de Granada en 1492 y, posteriormente, el de Navarra en 1512 que continuó siendo un reino, acuñando moneda propia y con aduanas en el río Ebro hasta las guerras carlistas del siglo XIX. Los reyes navarros se refugiaron en sus posesiones allende de los Pirineos y posteriormente se convertirían en reyes de Francia — in Wikipedia.

Sem os abundantes subsídios da União Europeia e terminado o longo ciclo colonial do Ocidente, de que as teorias Keynesianas aplicadas à esquerda e à direita foram, percebemo-lo agora, mera manobra defensiva, a Ibéria volta a estar confrontada com os seus próprios demónios.

Voltaremos a repetir os erros do passado, deixando as elites fabricar um novo teatro de sombras para melhor reprimir as comunidades, ou seremos capazes de aplicar as nossas melhores energias, reagindo de forma criativa ao empobrecimento que aí vem, formando uma grande comunidade de nações ibéricas e europeias, democrática, solidária, justa, competitiva e livre?

TAP por 1 euro

Quem paga os 123 milhões de prejuízos da Ground, e os... 3MM da TAP?

Talvez fazer como o gajo de Braga: TAP a 1 euro, leilão no fim do mês!

Governo pediu aos sindicatos, com os quais estará reunido às 17h, para esperarem até esta sexta-feira por um aval à venda de 50,1% da operadora de handling. Se tal não acontecer, a tutela será responsabilizada pelos danos. Público, 8-06-2012.

Desde quando é que os sindicatos são parte interessada em processos de privatização, ainda por cima quando tais processos estão envolvidos por obscuras operações de encobrimento e transferência de dívidas?

As receitas até agora obtidas pelas privatizações realizadas sob supervisão da Troika não deverão chegar sequer para tapar o buracão escondido da TAP (que poderá ultrapassar os 3 MIL MILHÕES DE EUROS).

Faça-se, como há muito se vem propondo, uma auditoria independente ao Grupo TAP, incluindo naturalmente a Groundforce, a TAP Engineering & Maintenance, Fernando Pinto y sus muchachos, e a célebre compra da PGA ao BES. E só depois se desenhe um spin-off e a privatização integral ou parcial das empresas do grupo.

quarta-feira, junho 06, 2012

Groundforce é TAP!

Quem quer casar com a Carochinha?
Foto ©: Crisplant - Baggage Handling

Tentaram fintar o Álvaro, mas Gaspar estava atento e desviou para canto!

Impasse na privatização da Groundforce (2037 "colaboradores" !!!) causa reunião de emergência nas Finanças (Público, 6 jun 2012)

A Urbanos parece que já deixou cair a batata quente (Groundforce) inchada de dívidas impostas pela TAP do genial e catita gaúcho Pinto!

Como cocou um especialista atento:

    Em todo este processo onde se chegou a um passivo de 123 milhões não será licito concluir que houve uma deslocação da dívida da TAP para a Ground, ou seja, a TAP estabeleceu administrativamente o preço a pagar por cada operação (ex: bagagem, check in,...) que deveria pagar à Ground, independentemente do custo real que houvesse para a Ground. Por outras palavras, não esteve a TAP a atirar passivo para a Ground na esperança de que no futuro houvesse alguém que o fosse assumir.

    Indirectamente, [a TAP] "tentou" fazer-se competitiva à conta de uma empresa do grupo, "escondendo dívida" em terceiros, e agora está a "assobiar para o ar", como se nada fosse com ela. Num cenário destes, esta é de Mestre. Grande Gaúcho!!

    Caso não fosse o Gaspar a questionar o processo (não o passivo) o Álvaro perante [as fintas] do Gaúcho, não só comeu o isco, o anzol, a linha e a cana. Sendo o Álvaro um homem do Canadá, onde a concorrência está na ordem do dia, como é que o "coiso" enfiou um "barrete destes"!

A TAP é um dos dois únicos acionistas da Groundforce, com 49,9%, enquanto uma tal Europartners, ao que parece, nada mais do que uma empresa de fachada dos bancos BIG, Banif e Invest, detém 50,1% da sobre endividada empresa portuguesa de handling. Ou seja, para que a privatização pudesse seguir em frente de uma forma normal e civilizada, a TAP teria que assumir 61.377.000€ de prejuízos, e a Europartners teria que assumir a sua quota-parte do buraco, no montante de 61.623.000€.

A solução para a Groundforce não pode obviamente passar pela venda dos prejuízos à Urbanos como se fossem filets mignons!

A solução honesta e simples é esta: ou limpar a empresa de dívidas antes de a privatizar, ou na impossibilidade de o fazer, declarar falência e reabrir a Groundforce com novos acionistas, nova gerência e reestruturada.

Gaspar, com a Troika de sobrolho levantado, não permite mais jogos de passa-culpas e a sempre esperada faturação dos prejuízos, da incompetência e da corrupção aos indígenas que continuam a pagar impostos. Já ouviram falar da Bastilha? Há um momento em que ou o poder faz o que tem a fazer, ou sucumbe à ira dos povos!

Perguntas ao governo:

terça-feira, junho 05, 2012

Jubileu ao fundo!

Gráficos dos principais teatros de guerra financeira na Europa (com os EUA em pano de fundo...)


A dívida do Reino Unido, sobretudo financeira, é um barril de pólvora pronto a explodir!


Euro em situação dramática: sem um salto quântico federal, nada feito :(


Outra visão do mesmo problema


A Suíça já decidiu colar-se ao euro: 1€=1,20CHF


Afinal os EUA vão também a caminho da Fossa de Keynes !


CONCLUSÃO : o euro poderá vencer a guerra contra o par dólar-libra se e só se houver rapidamente um salto quântico no processo de unificação financeira e fiscal da Europa. 

Os EUA e o Reino Unido estão cada vez mais isolados, enquanto a Eurolândia continua a ter os apoios da China, Rússia e Suíça, e poderá em breve ter também a seu lado, imagine-se, Israel! A contenção do islamismo radical passará em breve a ser um assunto sobretudo europeu, russo e chinês, dispensando as provocações intermináveis e as ações militares ilegais, criminosas e desastrosas dos Estados Unidos.

Nesta conjuntura previsível, o interesse estratégico de Portugal passa obviamente pelo seu posicionamento geográfico e pelas suas relações de longa data com os países de língua oficial portuguesa (em particular, Brasil, Angola, Moçambique e Timor), assim como com a China.

A Alemanha, que é a locomotiva industrial, o banco e a principal estratega europeia, pode ter em Portugal um bom intermediário para as suas já intensas relações com o Brasil e a China, mas sobretudo pode esperar de Portugal a facilitação no acesso a uma zona do globo onde os germanos nunca tiveram grande êxito: África!

A Alemanha é pois o nosso principal aliado na União Europeia.

Não nos esqueçamos desta nova realidade a ponto de se concretizar. Se o euro soçobrar, a Alemanha sofrerá uma nova e estrondosa derrota histórica. Mas desta vez, se Wall Street e a City vencerem, toda a Europa sucumbirá a décadas de pobreza e grande violência.

Não nos fiemos mais na corja partidária e financeira que se habituou a viver de rendas, por cima e por baixo das mesas do poder e do criminoso tráfico de influências!


REFERÊNCIAS
Os gráficos foram retirados de artigos vários do ZeroHedge

Última atualização: 6 jun 2012 0:16

sábado, junho 02, 2012

Portugal, pagar até morrer


Só podemos saldar a dívida e crescer, com trabalho, poupança e equidade

Sem renegociar as PPP, sem privatizar a TAP e a exploração dos transportes ferroviários, e sem uma reforma profunda da administração pública e do Estado ficaremos escravos da dívida e da indecorosa nomenclatura que levou o país à ruína, pelo menos, até 2020!

Portugal é neste momento atravessado por três grandes dilemas:
  1. O nosso insustentável endividamento fechou as portas ao investimento externo e interno, forçando o Estado a submeter-se a um programa de resgate, sem o qual há muito teria deixado de pagar aos seus funcionários, não sendo por esta razão possível crescer significativamente, na medida em que tal crescimento, pedido pela retórica populista da Oposição (1), implicaria agravar o sobre-endividamento público e privado do país, por sua vez um cenário inaceitável para o único credor ainda disposto a ajudar-nos a sair desta situação: a Troika.
  2. Só uma parte, 50% a 62%, da dívida total do país, é passível de um PSI, também conhecido por haircut; e para piorar as coisas, dado que boa parte da dívida pública reestruturável está nas mãos dos principais bancos portugueses, nomeadamente a colossal dívida das PPP, uma renegociação da mesma, com vista a um desconto privado, corre o risco de rebentar simultaneamente com os principais bancos e grupos económicos portugueses, dada a exposição destes às tetas orçamentais da escanzelada República que uma nomenclatura de piratas sem freio conduziu à posição de refém indefesa dos credores de última instância;
  3. Não conseguiremos libertar-nos da colossal dívida acumulada, sem impormos uma racionalização drástica e urgente do aparelho de estado, das instituições democráticas e do setor empresarial público, exigindo frontalmente o fim da apropriação parasitária do bem comum pela nomenclatura financeira e partidária, e sem causar por outro lado uma redução dramática dos recursos humanos que constam da folha de pagamentos da administração pública.
Estes dilemas terão no entanto e de uma forma ou doutra que ser resolvidos, sob pena de o país inteiro ficar numa situação sem saída, caminhando rapidamente para a alienação progressiva da sua riqueza, e para o advento de uma instabilidade social de consequências imprevisíveis.

Cabe aos partidos em primeiro lugar (para isso vos pagamos) estudar e encontrar com urgência as soluções mais justas e equilibradas para estes dilemas. E cabe ao resto da sociedade participar neste debate. Caímos no poço da dívida. Teremos que saber e conseguir sair dele quanto antes!

Os recentes números da execução orçamental e do desemprego são dramáticos. Veremos o que nos espera na próxima Segunda Feira, ao tomarmos conhecimento do mais recente relatório da Troika.

Até lá será muito instrutivo ler três artigos recentes e interligados sobre Portugal, escritos sucessivamente por Dimitris Drakopoulos e Lefteris Farmakis, do Nomura's Research, Joseph Cotterill, do FT Alphaville, e Claus Vistesen, do Alpha.Sources.CV.

“The math here is very clear. With only about 50 to 62 percent of the debt outstanding liable to restructuring the idea that Portugal may return to the market under “normal” conditions is ridiculous, especially if we assume that this includes the prospect of international creditors doing the bid.

However, there is an important difference between Portugal and Greece. Where Greece had a substantial part of its debt outstanding held by foreign creditors the restructurable debt in Portugal is mainly held by domestic corporates and banks. This is due to the increasing re-nationalisation of sovereign risk on the back of the crisis and specifically the ECB’s LTROs which have incited banks to buy their respective sovereign’s debt. This adds another layer to the Portuguese case in the sense that if the private sector gets hosed, it will mean domestic banking and corporate defaults. The ensuing re-capitalisation would be impossible for Portugal to deal with without EU/IMF help.”

— in Alpha.Sources.CV, “Time Unlikely to be a Healer for Portugal’s Economy”, April 2, 2012

“If you don’t see what Nomura are getting at here, Portugal could burn bondholders, but increasingly those are its own banks. On the Greek pattern, it would then need a eurozone loan to recap those banks, making any debt relief a mirage. And any private bondholders remaining, all the more subordinated.”

— in “If you thought Greek bondholders were subordinated…”, Joseph Cotterill, FT Alphaville, Mar 29 2012 09:03

“In this report we discuss whether a PSI operation similar to that undertaken in Greece will be repeated in Portugal in the near future. Our view is that in the short term momentum has shifted towards the extension of a new financing package to Portugal for a few years (potentially covering its financing needs until 2015) without a PSI operation being set as a prerequisite. Over the medium term, however, we see a fairly high probability of a debt management operation going ahead in Portugal given the country’s significant macroeconomic imbalances and fiscal risks that are likely to significantly delay its return to financial markets.”

— in “Portugal: To PSI or not to PSI?”, by Dimitris Drakopoulos and Lefteris Farmakis, Nomura, 27 march 2012.

NOTAS
  1. A sustentabilidade da economia portuguesa sofre de quatro constrangimentos fatais: a sua aflitiva dependência do petróleo/gás natural; a sua escandalosa intensidade e concomitante ineficiência energética; a sua inaceitável dependência de capital, o qual financia basicamente o consumo mas não o trabalho propriamente produtivo, nem a suficiente produção de bens transacionáveis; e, finalmente, o envelhecimento e encolhimento demográficos que destruirão inexoravelmente a sustentabilidade do estado social que conhecemos nos últimos trinta anos, ficando o setor das exportações, o turismo e, uma vez mais, a emigração, como únicos travões ao empobrecimento em espiral do país. Os quadros e gráficos do estudo promovido pelo banco japonês Nomura são a este título elucidativos.

Última atualização: 2 jun 2012 10:52

sexta-feira, junho 01, 2012

Capitalismo: seis meses de vida?

Foi assim no Zimbabué. E na Europa como será?

Teremos seis meses, ou seis semanas para nos preparar?

Os bancos e o grande dinheiro em geral estão a refugiar-se debaixo das asas dos bancos centrais, comprando-lhes dívida soberana — na América, como na Europa, mesmo se os governos americano, alemão e agora também o suíço já não paguem quase nada pela emissão das suas dívidas soberanas, ou comecem até a cobrar por pedir emprestado! (1)

Nos casos da Grécia, Portugal, Espanha, ou seja, em países à beira da insolvência, os títulos de dívida são depositados no BCE como colateral para obtenção desesperada de liquidez em princípio destinada a economias paradas e endividadas até aos ossos. Acontece, porém, que os bancos dos países que se encontram na unidade de cuidados intensivos da Troika deixaram há muito de emprestar à economia, a não ser em casos pontuais para evitar o colapso de grandes empresas por sua vez endividadas aos bancos que se dispõem a renovar-lhes as linhas de crédito. Preferem mesmo deixar parte substancial do dinheiro que pediram ao BCE a 1% à guarda deste, recebendo em troca 0,25% ! (2)

A situação é desesperada. Sinais deste desespero são, entre nós, a subida imparável do desemprego, os "erros" da execução orçamental, a queda dramática das receitas fiscais apesar da violenta austeridade imposta a todos menos à nomenclatura execrável do regime, os prejuízos que começaram finalmente a saltar dos balanços escondidos das PPPs, grandes empresas do regime, bancos, empresas públicas e autarquias, ou ainda a falta de compradores para a TAP. Finalmente, a fuga de capitais para refúgios como a Suíça e o Reino Unido, que está em curso a grande velocidade, e ao contrário do que a subida dos depósitos domésticos poderá fazer crer, prova que a desconfiança de quem tem algum dinheiro no nosso país subiu para níveis que se podem perfeitamente classificar de corrida aos bancos, e que esta recai não só sobre a situação portuguesa mas também sobre o euro. O dinheiro está a fugir basicamente para a Alemanha, Suíça e Reino Unido.


Raoul Pal, The End Game

Em Espanha, o colapso do bad bank Bankia —que se propôs absorver os balanços catastróficos de boa parte das caixas regionais espanholas— ameaça todo o sistema bancário ibérico, cujo colapso em cadeia desencadearia de imediato a implosão do sistema financeiro mundial (3). O anúncio do Wall Street Journal (4) e subsequente desmentido do FMI (5) da preparação dum plano de resgate da Espanha só pode significar que a crise está a piorar de hora a hora (6).

É possível que uma chuva dourada de euros esteja ao virar da esquina para adiar por mais uns meses a tragédia. Mas é também provável que não chegue a tempo, ou que já não remedeie coisa nenhuma. E se assim for, talvez o futuro venha a decidir-se nos próximos seis meses (ou nas próximas seis semanas) com o pior dos desfechos.

Que tal um regresso aos anos 70 do século passado? Ou mais distópico ainda, que tal uma antecipação do Blade Runner para 2013 (a história passa-se em 2019)? Funcionarão os sistemas energéticos e informáticos se houver um colapso em cadeia na Europa, Reino Unido, Japão, China, EUA (7)?

Raoul Pal pensa que não... Vale a pena ler a sua sintética apresentação, cujos principais tópicos resumo:

  • os dez maiores devedores do mundo devem mais do que 300% do PIB mundial
  • 70 biliões de dólares (70x10E12) correspondentes apenas a uma parte da dívida do G10 (Bélgica, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Holanda e Reino Unido) são o colateral de contratos de derivados financeiros OTC com uma valor nocional de 700 biliões de USD, ou seja, 12x o PIB mundial
  • a crise da dívida britânica é tão grave quanto a da dívida soberana na zona euro
  • o Japão tem a maior dívida do planeta
  • a China afinal também tem um stock de dívida preocupante
  • e os Estados Unidos poderão andar 30 ou 40 anos para trás em matéria de rendimento per capita depois das próximas eleições presidenciais
  • ou seja, a conjugação, ou dominó iminente destas crises (que não nos dará mais de seis meses de tempo de fuga) acabará com o sistema bancário tal qual hoje o conhecemos (fractional reserve banking e fiat money)
  • os rendimentos das obrigações irão encalhar nos EUA, UK e Japão na casa dos 1% — e até provavelmente abaixo deste número, como provam os recentes leilões de dívida soberana na Alemanha e na Suíça (nota minha)
  • o mercado de obrigações irá pois morrer em breve :(
  • vários instrumentos de investimento, protecção e sobretudo especulação financeiras irão ser banidos assim que o colapso começar (short selling on bonds, short selling stocks, CDS, short futures, put options)
  • sobrarão apenas o dólar e o ouro depois do grande colapso...

“We don’t know exactly what is to come, but we can all join the very few dots from where we are now, to the collapse of the first major bank...

With very limited room for government bailouts, we can very easily join the next dots from the first bank closure to the collapse of the whole European banking system, and then to the bankruptcy of the governments themselves.

There are almost no brakes in the system to stop this, and almost no one realises the seriousness of the situation.” — in Raoul Pal, The End Game.

The End Game

NOTAS
  1. "Europe's "Teleportation To Safety" In One Chart". ZeroHedge, 05/31/2012.
  2. ECB key interest rates
  3. "IMF Begins Spain's Schrodinger Bail Out". ZeroHedga, 05/31/2012.
  4. "IMF Begins Talk On Spain Contingency Plans - Sources". Wall Street Journal, 30/05/2012.
  5. "Christine Lagarde nega plano de assistência do FMI a Espanha". Negócios, 31-05-2012.
  6. "Futuro do euro joga-se “nas próximas semanas”, diz o ministro espanhol das Finanças". Público, 31-05-2012 22:20.
  7. "Greece's debt woes mutate into energy crisis". Reuters, 1 jun 2012 10:09.
     
Última actualização: 1 Jun 2012 19:42