Sandro Botticelli — O Nascimento de Vénus (pormenor) |
Sem classe média não há democracia!
Se isto é verdade, não pode deixar de ser uma grande preocupação assistirmos ao processo recentemente acelerado de destruição da classe média portuguesa, que a bancarrota do país e os grupos parasitários ameaçam transformar num processo dificilmente reversível no curto e médio prazo, sobretudo se a própria classe média não reparar na gravidade da situação e se deixar lentamente engolir pelo cano de esgoto da fiscalidade brutal e insaciável que tomou conta do nosso presente e ameaça destruir o nosso futuro.
Os ricos sempre souberem viver e os pobres sempre conseguiram sobreviver em regimes absolutistas e ditatoriais, mas os democratas e liberais, não. Se deixarmos o bloco central que há mais de trinta anos atrai as maiorias eleitorais render-se de vez aos processos de captura e manipulação da sociedade por parte dos ricos rendeiros do regime, com a consequente desintegração ideológica da democracia, haverá um momento, mais próximo do que poderemos imaginar, em que a diversidade democrática portuguesa será brutal e repentinamente reduzida à lógica maniqueísta e populista típica dos regimes pré-democráticos, dando assim lugar a uma espécie de pós-democracia miserável, tecnológica, burocrática, autoritária e policial.
O perigo de caminharmos rapidamente para uma ditadura cibernética de aparência democrática, com simulações eleitorais cada vez menos concorridas e mais manipuladas, não é uma fantasia, nem uma hipótese teórica de uma qualquer teoria da conspiração. A expropriação fiscal da classe média, que arrasta atrás de um indecente cortejo burocrático e policial o roubo ilegítimo mas aparentemente legal das poupanças e outros ativos desta classe criativa —como a família, o amor e as amizades—, está em curso e ameaça aniquilá-la em menos de uma geração. Para impedi-lo será preciso mudar o curso suicida das democracias europeias e americanas num novo tempo histórico, em que a abundância de recursos acabou e o predomínio colonial do Ocidente deixou felizmente de prevalecer na ordem mundial.
As democracias ocidentais estão no início de uma metamorfose cultural desordenada, largamente manipulada por minorias que já capturaram estados e governos por esse mundo fora, e se preparam agora para anestesiar e depois liquidar a base social das democracias modernas. Queremos que assim seja?
Suponho que não!
No primeiro texto que escrevi, em Janeiro deste ano, sobre a urgência de criar um Novo Partido Democrata, o NPD, pode ler-se:
Quando será que este governo cairá na lama? No fim da legislatura? Antes mesmo? Tudo irá depender do tempo que Álvaro Santos Pereira aguentar. A sua saída ditará simbolicamente o fim da própria presunção de inocência do senhor Passos de Coelho e do cada vez mais irritante Gasparinho. Depois deste cabo dobrado, a corrida eleitoral recomeçará! Porque pensam que anda Sócrates e a corja que deixou plantada no parlamento tão agitados?
O cada vez mais débil António José Seguro precisará em breve de recorrer a uma Unidade de Cuidados Intensivos (estratégica e táctica). Esperemos que saiba encontrar o conselheiro certo. Mas, como venho insistindo, já não chega. Aquela roseira velha não recupera sem uma grande poda!
E nós, ou seja, os que hesitam entre deixar de votar de vez, e a ténue esperança de uma renovação do jogo democrático, precisamos doutro partido para mudar este estafado rotativismo em que estamos metidos há mais de três décadas e cujo triste balanço é a bancarrota. Já não acontecia há 120 anos!
(Ler texto completo aqui)
Portugal caminha rapidamente para um segundo resgate. As palavras desencontradas do governo escondem o óbvio: o país está profundamente falido e insolvente, depende dos credores internacionais para comer e para pagar os seus funcionários públicos, as reformas e assistência médica e social ainda prestada, e para manter a aparência institucional dos cadáveres adiados da banca, que mais não fazem do que executar o pouco sangue que ainda respira na economia.
Desde a assinatura do memorando com a Troika de credores, Portugal é um protectorado, alías um protectorado formalmente independente, isto é, onde o poder político resultante de processos eleitorais cada vez mais inexpressivos pode, apesar de tudo, continuar a destruir o país, em nome do salve-se quem puder, em nome dos grandes rendeiros, em nome da continuidade patética da retórica partidária e parlamentar, em nome dos privilégios das corporações profissionais, sindicais e partidárias. Quanto maior for o buraco cavado pelas elites assassinas do país, mais doloroso e prolongado será o nosso cativeiro e mais arrasadora será a destruição da classe média.
O maior problema que temos pela frente é pois o de saber se quando acordarmos ainda iremos a tempo de nos levantarmos!
Aos que dizem que Portugal não precisa de mais partidos, repito: com os que temos não iremos a parte nenhuma. Do CDS ao dito Bloco de Esquerda, as soluções estão esgotadas, e sobretudo as dependências de cada um destes partidos do orçamento público é de tal ordem que já nada mais farão mais do que reproduzir até à exaustão as suas cada vez mais impotentes e caricatas ladainhas.
Precisamos, sim, de novos partidos e sobretudo de uma democracia menos partidária!
Parece um paradoxo, mas não é. Portugal precisa de um Estado eficiente, isto é, mais leve, mais transparente, mais profissional, mais responsável, menos partidário, mais digno, em suma. E precisa de uma ligação mais verificável e orgânica entre eleitores e eleitos. Precisa também de estender o tecido democrático para lá das paredes do parlamento e da governação central e municipal, ou seja, precisa de uma sociedade mais democrática, transparente, responsável e pragmática em todos os seus níveis de organização, cuja reflexão e apostas cheguem facilmente e influenciem os níveis superiores de decisão e governo. Precisamos, ao mesmo tempo, de libertar a sociedade, a economia, a política e a cultura das carraças, dos piolhos, das pulgas e da sarna que a atormenta e vem consumindo de forma deplorável.
Eu estou disposto a colaborar no renascimento da democracia portuguesa. E você, está?