Orçamento vigiado - 3, aspirina não chega!
Investimento de Iniciativa Pública e Crescimento
... As novas infra-estruturas criam a possibilidade de novos negócios por reduzirem custos de transporte, facilitarem o acesso a produtos e pessoas, ou reduzirem outros custos de contexto relevantes para as empresas.
... os investimentos públicos podem também contribuir para aumentar a competitividade e a internacionalização da economia, contribuindo, dessa forma, para aumentar a eficiência e combater o défice externo. As reduções de custos de transporte e a mais fácil circulação de pessoas, bens, energia e informação, permitem reduzir os custos das actividades exportadoras, alargam a possibilidade de atracção de clientes e turistas e geram um efeito de alargamento da escala de operação das empresas que resulta em ganhos de eficiência.
... Atendendo aos diferentes tipos de infra-estruturas, conclui-se que em casos como o das auto-estradas, Portugal apresentou uma evolução tão positiva nos últimos anos que está já próximo de níveis de stock óptimos, o que aconselha a que, nestas áreas, o ritmo de investimento seja menos acentuado no futuro. No entanto, Portugal apresenta ainda um forte atraso face aos países da UE no que se refere à qualidade e quantidade de infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, contexto tanto mais agravado quanto o País apresenta um forte crescimento da procura de serviços de transporte aéreo e de cargas e passageiros nos portos. — in Orçamento de Estado 2010.
Se a um doente que treme por todos os lados, com 40 graus de febre, lhe é detectada uma pneumonia, e um médico decide receitar-lhe fleumaticamente uma caixa de placebos, em vez da quarentena rigorosa da praxe e uma combinação adequada de antibióticos e vitaminas, o mais provável é que o doente, se for velho, morra, e se for novo e saudável, piore de forma imprevisível o seu estado de saúde e acabe por contrair alguma doença crónica grave. A um médico que assim trate um doente deve obviamente retirar-se-lhe a carteira profissional e levá-lo a tribunal pela sua inadmissível má prática. Ora é isto que, mudando o que há a mudar, ocorre no romance de cordel a que o sem-vergonha e cada vez mais inoperante governo Sócrates chama
Orçamento de Estado 2010. O merceeiro desonesto que o redigiu deveria ser obviamente expulso da Ordem!
A falta de rigor nos números (1) e de coragem nas decisões deu lugar a uma caricata
tesina de economia e finanças públicas pseudo-keynesianas. É penoso lê-la. A ignorância crassa sobre o transporte ferroviário; as falácias estafadas com que as agências de comunicação ao serviço do governo, e sobretudo ao serviço das tríades financeiras que há mais de 20 anos capturaram a democracia portuguesa e ameaçam levá-la à ruína, voltam a insistir no novo aeroporto de Lisboa, i.e. o mesmo negócio da Ota, agora em Alcochete (2); a vigarice das Parcerias Público Privadas (mais autoestradas); a teimosia olímpica em construir barragens inúteis (Tua, Sabor) ou assassinas (Fridão) para ajudar a inchar a bolha da EDP —entre outras calamidades—, levam-me a uma conclusão simples: este governo não é para durar. Mais, devemos todos fazer a necessária pressão que caia o mais depressa possível!
O erro suicida do OE2010, que reflecte o figurino esgotado da nossa democracia burocrática e o grau de captura do actual regime político-partidário pela historicamente decadente, néscia e inviável burguesia latifundiária e rentista portuguesa, é que confunde PIB com endividamento! Ou seja, quando o Estado se endivida no mercado externo de capitais —pois a poupança interna há décadas que se esfumou— para estimular artificialmente a formação do PIB, nomeadamente através de Parcerias Público Privadas ou do investimento público directo em obras que o consumo interno não suporta (como está demonstrado à saciedade nos casos de polícia que são as SCUT e o
aeromoscas de Beja), o que ocorre é tão somente o agravamento simultâneo do défice orçamental, da dívida pública e do serviço desta mesma dívida. Basta atentar na evolução do défice, da dívida e do serviço da dívida ao longo dos últimos 20 anos para concluir que assim é, e que portanto o exercício patético de teoria e mau jornalismo que confeccionou o romance de cordel chamado OE2010 não pode convencer ninguém. Não convenceu obviamente os mercados, nem convencerá Bruxelas, que em breve exigirá maior clareza e coragem aos Chico-espertos que insistem em levar Portugal à bancarrota.
A segunda grande falácia prende-se aos proclamados méritos do endividamento interno e externo do país como via heróica para o equilíbrio da nossa eternamente deficitária balança comercial. Basta, uma vez mais, percorrer as estatísticas para percebermos que:
- o endividamento para o consumo e para financiamento e sustento da burguesia rentista, da burocracia e da nomenclatura político-partidária, associado a uma moeda excessivamente forte, destrói a capacidade produtiva instalada e o potencial de exportação a benefício das importações de bens materiais e de capital, deteriorando inevitavelmente a nossa moeda sob a forma de um agravamento imparável do endividamento geral do país e de uma progressiva alienação da riqueza patrimonial historicamente acumulada — cujo impacto negativo na economia de cada um é traduzido por um terrorismo fiscal tão discricionário, quanto pesado e ineficiente;
- as nossas exportações, por força da valorização da moeda que temos, têm-se vindo a restringir cada vez mais à zona euro, deixando progressivamente de fora os antigos mercados coloniais, hoje economias emergentes, o que, dada a fraca sofisticação tecnológica, comercial e cultural daquilo que produzimos, acaba por atacar duramente e em tenaz a nossa capacidade de compensar o muito que compramos, com o pouco que vendemos. Nem exportamos o suficiente para a China, Brasil ou Angola, por termos uma moeda forte, nem exportamos o suficiente para Espanha, República Checa, Reino Unido ou Alemanha, e para os mesmos países emergentes, por falta de escala, qualidade, novidade e sofisticação;
- a importação de investimento e o endividamento nos mercados financeiros internacionais só raramente se destina a estimular o fortalecimento quantitativo e qualitativo do tecido empresarial nos decisivos sectores da agricultura, recursos marítimos e fluviais, indústrias e investigação científica e tecnológica. A maior parte deste endividamento (95%!) tem sido reiteradamente desbaratado na hipertrofia burocrática do pais, na corrupção da nomenclatura político-partidária, no enchimento especulativo, para efeitos de internacionalização, de grandes operadores estratégicos nos sectores energético e de comunicações (que acabarão por sucumbir às suas próprias dívidas, ou então à concorrência global), na mama das obras públicas, e nos casinos da especulação bolsista. Foi nisto tudo, e não no auxílio à economia real, que em 2009 se desbarataram milhares de milhões de euros pedidos emprestados em nome do povo português!
O problema de mais este Desorçamento é que se recusa teimosamente a enfrentar a crise sistémica da nossa economia. Desde Aljubarrota que a economia portuguesa depende basicamente do Estado e dos seus grandes empreendimentos: a Costa do Ouro, Malaca, Índia e China, o Brasil, a emigração e, por fim, a chuva dourada de Berlim via Bruxelas. Castela foi sempre uma inimiga, os Países Baixos serviram sobretudo de porto de abrigo para as nossas exportações e do Reino Unido só tardiamente aprendemos alguns modos empresariais e a beber chá sem por os cotovelos em cima da mesa. O que havia em comum neste longuíssimo capitalismo de Estado deixou de existir, ou deixará definitivamente em 2013-2015. Refiro-me às Patacas coloniais e à exportação de mão-de-obra barata que ao longo de seis séculos permitiram gerar um país essencialmente endogâmico, indolente e profundamente injusto. O Chico-espertismo de José Sócrates e da tríade de piratas que o criou e ampara é tão só a face novo-riquista e aparvalhada da moeda rentista dominante. Que um simulacro de socialista como António Vitorino se tenha transfigurado num sacerdote da Brisa e do Santander, diz tudo sobre a persistência genética de uma sociedade que o fim dos impérios tornará em breve obsoleta.
O tempo das vacas gordas dos Fundos de Coesão chegou ao fim. Malbaratámos esta oportunidade única de organizar as nossas vidas? Os políticos passaram o tempo a tomar conta de si mesmos? Deixaram o País de tanga e sem ideias? Vem aí um ciclo irreversível de recessões e uma imparável curva ascendente nos custos da energia e do dinheiro? — in "Manuel Alegre: o pragmatismo das causas", O António Maria, 26-09-2004.
Segundo os valores estimados para 2005, dos 214 países considerados, mais de metade (110) crescia a valores do PIB entre 4% e 26,4%. Cresciam a 8% ao ano, ou mais, 24 destes países. A generalidade dos chamados países desenvolvidos crescia abaixo dos 4%. A União Europeia, por sua vez, crescia a uma média de 1,7% ao ano. Portugal, ocupando a posição 202 entre 214 países, crescia tão só a 0,30% ao ano...
Dizer que este país cresce abaixo da média da União Europeia é, como se vê, uma verdade piedosa sobre a crise que efectivamente atravessa. Piores que os lusitanos apenas há 12 países: Itália, Tanzânia, Niue, Dominica, Monserrate, Saint Kitts and Nevis, Guiana, Iraque, Malawi, Seychelles, Maldivas, Zimbabwe.
Não fora pertencer à União Europeia, Portugal estaria hoje à beira de convulsões sociais muito sérias. A prosperidade aparente de que goza deve-se, basicamente, a cinco causas principais: as remessas dos emigrantes portugueses residentes na União Europeia (que deixaram de ser contabilizadas como receitas de emigração...), os fundos comunitários, a economia informal e clandestina, o turismo e o endividamento imparável do Estado. A balança comercial tenderá, porém, a deteriorar-se no médio e longo prazo, por causas mais ou menos óbvias: valorização do Euro contra praticamente todas as outras moedas, deslocalização crescente dos investimentos dentro e fora da zona Euro, destruição interna das actividades alimentadas por trabalho intensivo, barato e de baixa produtividade e falta de competitividade dos custos de contexto: carga fiscal, preço da energia, excentricidade geográfica, falta de transparência estratégica do país e falta de qualidade do sistema judicial. — in "Os sete pecados mortais de um país", O António Maria, 5-08-2006.
Quando José Sócrates matraqueia os média, como um qualquer boneco de feira, com o
sound bite "Pusemos as contas em dia!", não diz que
essa proeza apenas durou o exercício orçamental de 2007 e foi conseguido à custa de um mega-empréstimo externo de 22,5 mil milhões de euros! Nem diz que Portugal paga hoje em juros anuais pela sua dívida pública qualquer coisa como 5 mil milhões de euros, ou que para este lindo OE2010 vai ter que pedir emprestado lá fora mais 17,5 mil milhões de euros. Vamos ver quem emprestará tamanha soma de dinheiro e a que juros, depois do episódio grego e da recusa da China em socorrer possíveis candidatos a Estados falidos no interior da poderosa zona euro.
Grécia atira risco da dívida pública dos países da Zona Euro para recorde
O seguro para os investidores se protegerem contra o incumprimento no pagamento de dívida pública dos países da Zona Euro atingiu hoje o nível mais elevado de sempre. A culpa é da Grécia, com a crise nas finanças públicas helénicas a contagiar outros países, sobretudo Portugal. in Jornal de Negócios, 27-01-2010.
Fitch ameaça cortar 'rating' de Portugal
A agência de notação manteve o 'outlook' negativo para Portugal mas avisa que é agora mais provável um corte do 'rating', face à estimativa de défice para 2009 revelada ontem por Teixeira dos Santos.
"O primeiro aspecto que nos surpreendeu foi a revisão em alta do défice de 2009, o que foi bastante decepcionante. Um défice de 9,3% do PIB é significativo. São mais três pontos percentuais do que quando colocámos o ‘outlook' para a dívida portuguesa em negativo, em Setembro de 2009", afirmou Douglas Renwick, responsável da Fitch, em entrevista à 'Reuters'. — in Diário Económico, 27-01-2010.
Joining the queue for China cash
The decision of Greece, and its bankers, to ask Beijing for cash to fund its yawning fiscal deficit should come as no surprise. The Chinese capital is the first port of call for countries and companies that need money.
China has a huge stock of surplus cash, with $2,400bn (€1,702bn, £1,486bn) in foreign exchange reserves, amassed by a decade of largely fixed-exchanges rates, swelling trade surpluses and capital inflows.
... The implosion of the western financial system over two years from 2007, along with an evaporation of confidence in the US, Europe and Japan, almost overnight pushed China’s global standing several notches higher.
... Such sums might give the impression that China has been throwing its money around with abandon. But after some early loss-making forays, mainly through investments in US and European financial companies, China has become more cautious about where it places its money.
... In the case of Greece, money is not a problem. Buying up to €25bn in Greek bonds is equal to about two weeks’ worth of accumulation of foreign exchange reserves in China.
Chinese thinking is that Brussels could not let Greece fail, because the implications for the euro’s credibility are too dire. If that line of argument prevails in Beijing, then China may well be a buyer of Greek bonds. In the process, the Chinese may well be buying invaluable political capital in Brussels as well. — in Financial Times, January 26 2010.
O
Financial Times sugere num artigo muito provocatório e inteligente uma solução que não anda longe da que em 2005 sugeri, ainda que sob a forma de um banco de horas. Em 2005, numa proposta desenvolvida e apresentada conjuntamente com uma equipa de arquitectos (
o Grande Estuário), levantei a hipótese de se criar um banco de horas no nosso país, cujo efeito prático seria o surgimento de uma moeda de troca justa e solidária local. Em Novembro de 2009 voltei ao tema, desta vez explicitando a possibilidade se criar uma União de Crédito Solidário como instância financeira alternativa aos avarentos bancos cuja acção durante a recessão mundial tem sido basicamente a de obter empréstimos dos bancos centrais a custo zero (enfim, entre 0,5% e 1,5%) para depois mal emprestar a 2,9%, 11% ou 26%, ou não emprestar mesmo!
Em Portugal seria perfeitamente possível lançar uma rede de 50 Bancos de Crédito Solidário —abrangendo todas as capitais de distrito e concelhos das cidades-regiões de Lisboa e Porto, especializada, entre outros, nos seguintes ramos: habitação, comércio local, transportes e mobilidade, educação, saúde, solidariedade e redes profissionais. Cada um destes Bancos de Crédito Solidário teria, por exemplo, um capital público social de 5M€, e funcionariam em rede, federados por uma Organização de Comércio Social, a qual garantiria a necessária transparência e qualidade dos processos de implementação, gestão e sustentabilidade. Estamos a falar de 250M€ de investimento público inicial, a que se somaria um capital social solidário da mesma ordem, constituído por bens e serviços contabilizados numa moeda solidária de circulação restrita. Uma gota de água, quando comparada com os buracos financeiros e dívidas criadas pela máfias instaladas no sistema económico-financeiro e político-partidário português! — in Por uma União de Crédito Solidário!, O António Maria, 25-11- 2009.
No artigo de Charles Goodhart and Dimitrios Tsomocos, o ponto polémico é mesmo o da possibilidade de países como a Grécia, Portugal e Espanha escorregarem inexoravelmente para a bancarrota, por exemplo, no contexto de uma greve generalizada dos compradores de dívida soberana, como ocorreu precisamente durante as negociações gregas para salvar as finanças do país. A China rejeitou a hipótese de financiar os gregos, tal como terá já deixado saber a Victor Constâncio, ou Teixeira dos Santos, que fará o mesmo a Portugal. Se este cenário se vier a verificar, o que os colunistas do Financial Times propõem não é, nem a saída dos
PIGS da zona euro, nem uma operação de resgate em larga escala por parte do Banco Central Europeu (a qual provocaria certamente uma tremenda instabilidade no Euro.) A proposta deste inteligente artigo é o do regresso temporário à moeda pré-euro, no caso português, o regresso Escudo. Pelo período de quatro anos co-existiriam no nosso país o Euro, para os pagamentos externos, e um novo Escudo, valendo menos 25% do que Euro, para os pagamentos internos.
Greece and Portugal have two severe economic problems. These are, first, a fiscal position, deficit and debt ratio verging on the unsustainable, and, second, a serious lack of competitiveness (a real exchange rate which is much too high). Italy and Spain may also soon face a similar precarious situation. These countries’ membership of the eurozone constrains the solution to this joint problem.
For example, neither Greece nor any other country in a similar position could sensibly leave the eurozone, (indeed any sniff of thinking about that would cause an immediate banking crisis). Apart from the immediate effects on wages, prices and interest rates, existing debts are denominated in euros and any attempt to renege on that would, very likely, result in seizure of Greek assets abroad and expulsion from the eurozone, in addition to a cessation of European Union net transfers.
In this respect Greece is far more constrained than Argentina was.
... When a subordinate state in a federal monetary union has severe fiscal problems and runs out of money, what does it do? It issues IOUs. Think California or the Argentine provinces before 2000. For example, in Portugal, we could coin a phrase and call such IOUs escudo. Essentially the government passes a decree that states that such escudo IOUs would be acceptable for all internal payments, except tax payments, between Portuguese residents, but not for any external payments between Portuguese residents and foreign residents. All public sector and private sector wage payments shift on to an escudo basis as do interest payments by a Portuguese resident to another resident. Portuguese residents’ deposits and borrowing with Portuguese banks shift to an escudo basis; others remain in euros. — in The Californian solution for the Club Med, By Charles Goodhart and Dimitrios Tsomocos, Financial Times, January 24 2010 20:35 | Last updated: January 24 2010 20:35.
Estou a imaginar o incómodo e mesmo o sorriso de desdém da
blogosfera próxima ao ler estas palavras! Recomendo-lhe, porém, que medite seriamente no problema. Quem virá socorrer um cocainómano com mais cocaína? O OE2010 nada mais é do que o discurso
spidado de um viciado em dívidas, incapaz de parar, contando histórias da Carochinha na esperança de que algum distraído o ouça. Só que nesta fase de endividamento e recessão globais, não há distraídos.
Greece’s debt crisis returned to financial markets with a vengeance as agitated investors demanded the highest premiums to buy its government bonds since the launch of European monetary union over a decade ago.
The yield spread between 10-year Greek bonds and benchmark German Bunds widened dramatically on Wednesday, by almost 0.7 percentage points at one point, in what one trader called a “capitulation” to sellers worried about Greece’s ability to refinance its debt. — in "Chinese whispers drive up Greek yields", By Tony Barber in Brussels, David Oakley in London and Kerin Hope in Athens, Published: January 26 2010 22:59 | Last updated: January 27 2010 19:43.
Há pelo menos cinco possibilidades no que toca à saída da presente crise orçamental:
- O governo português vê aprovada a sua estratégia de avestruz por parte da burocracia de Bruxelas e pelo BCE;
- BCE e Bruxelas obrigam a revisão das metas orçamentais do OE2010 e a um claro corte na despesa pública;
- Face à segunda hipótese, o Governo cede, arrastando atrás de si parte da Oposição (PSD e CDS), mas provoca uma grave crise no interior do Partido Socialista, ou até a cisão do mesmo;
- Face à segunda hipótese, o Governo não cede e prossegue a estratégia de endividamento, sobretudo a favor da burguesia palaciana de que se tornou serviçal, arriscando-se fortemente a ver bloqueados os empréstimos externos, daí resultando a rápida implosão do governo;
- No caso da primeira hipótese ocorrer, existirá então uma forte probabilidade até 2012 de as crises de endividamento da Grécia, Espanha e Portugal se sincronizarem, causando um colapso do Euro, do qual poderá resultar a exclusão temporária destes países da moeda única, invocando-se então que tal não será uma tragédia comunitária, pois também a Libra Esterlina, a Coroa Sueca, etc. continuam fora do Euro.
Em qualquer caso prevejo a queda para breve do governo de José Sócrates. E no seu lugar poderá vir a estar um governo de grande coligação entre o PS, PSD e CDS, com Paulo Portas a chefiar.
NOTAS
- Vale a pena consultar um recente estudo do Instituto Sá Carneiro (Reflexões, PDF) sobre as contas indisfarçáveis da nossa realidade pública. Destaco apenas alguns números de arrepiar:
- Endividamento em % do PIB (2009) = ±111,8
- Crescimento potencial do PIB na última década = ±1% ao ano
- Na década de 60, crescemos em média 5,8%; na de 70, 5%; na de 80, 3,7%; na de 90, 3%; e na de 2000 0,5%.
- Peso da Exportações de Bens e Serviços no PIB (%) entre 1990 e 2009: 30,7; 28,6; 29,8; 28,5; 27,7.
- Défice externo em 2008: 10,5% do PIB.
- Endividamento externo líquido (em % do PIB): em 1996, 10.4; em 2000, 41,1; em 2005, 64,0; em 2008, 97,2; em 2009, 105,0.
- População residente (Set. 2009): 10 641 000
- População empregada (Set. 2009): 5 017 500
- População empregada excluindo funcionários públicos (Set. 2009): 4 321 106
- Funcionários públicos (Set. 2009): 696 394
- Beneficiários do Rendimento Social de Inserção (Set. 2009): 382 448
- Pensionistas activos [invalidez, velhice, sobrevivência] (Set. 2009): 2 841 789
- Beneficiários de Subsídio de Desemprego (Set. 2009): 346 899
- Total de "dependentes" do Estado: 4 267 530
- Para desmontar o logro da argumentação do governo sobre a Portela e o NAL vale a pena ler este artigo de Rui Rodrigues recentemente republicado pelo Público, de que destacamos algumas passagens.
"O Governo pretende, em 2009, privatizar a empresa ANA-Aeroportos que, no ano de 2007, gerou lucros de 48 milhões de Euros. Explorar aeroportos é um negócio fácil enquanto que gerir companhias aéreas é um negócio arriscado devido à forte concorrência do mercado."
"... A ANA, nos últimos anos, efectuou investimentos avultados no Aeroporto da Madeira e no Porto e nos próximos anos o mesmo se passará na Portela e em Faro. No Funchal investiram-se cerca de 500 milhões de Euros (fundos comunitários + verbas da ANA e ANAM e do Governo regional). No Porto, já foram gastos mais de 300 milhões de Euros (no início só estava projectado investir-se 60 milhões) e, em Lisboa, estão previstos serem gastos 400 milhões de Euros que serão perdidos com o fecho da Portela. A Portela é rentável e, actualmente, os seus lucros financiam outros aeroportos nacionais que dão prejuízo.
... Um novo aeroporto só pode ser pago pelas taxas aeroportuárias ou pelos contribuintes
O modelo de financiamento do novo aeroporto de Lisboa, em parte, é semelhante ao modelo do actual aeroporto de Atenas, na Grécia. O pagamento da nova infra-estrutura vai depender do valor das taxas aeroportuárias. No caso grego, as taxas do novo aeroporto são as mais caras da Europa, o que levou a “Olympic Airlines” à falência por ser o seu maior cliente. Recentemente, a administração desta empresa exigiu do Governo grego uma compensação financeira de 803 milhões de Euros pela "mudança obrigatória" da companhia, em 2001, para o novo aeroporto internacional de Atenas. Mais grave ainda, as ‘Low Cost’ não querem utilizar uma infra-estrutura com taxas de alto custo, o que está a obrigar à utilização de aeroportos secundários para “salvar” o turismo grego. O novo aeroporto de Atenas cobra cerca de 70 Euros de taxas a cada passageiro. São as taxas mais caras da Europa.
Em Portugal, a TAP é responsável por cerca de 50% dos voos em Lisboa, sendo as taxas aeroportuárias despesas fixas que têm um peso muito importante no seu orçamento, o que significa que, se um dia a TAP se mudar para Alcochete, onde as taxas serão elevadíssimas, vai acontecer exactamente o mesmo que ocorreu à “Olympic Airlines” e as ‘Low Cost’ irão abandonar Lisboa, o que levará ao colapso do turismo da Capital." — in Os aeroportos, a privatização da ANA e os terrenos da Portela, por Rui Rodrigues, Público online.
OAM 679 — 28 Jan 2010 16:56 (última actualização: 29 Jan 2010 00:26)