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domingo, janeiro 02, 2011

Grandes Obras

Portugal 2010-2020 
as três grandes prioridades de investimento chamam-se: ferrovia, eficiência energética e segurança alimentar

in Plan Estratégico Para El Impulso del Transporte Ferroviario De Mercancías En España, 14/09/2010 (PDF)

PS e PSD chegaram finalmente a acordo sobre as personalidades que irão coordenar o grupo de trabalho encarregado de reavaliar as Parcerias Público-Privadas (PPP): Guilherme de Oliveira Martins, mestre em ciências jurídico-económicas, independente próximo do Partido Socialista, e António Pinto Barbosa, professor de economia e fundador do PPD/PSD (1). Ambas as personalidades merecem grande respeito nas respectivas áreas profissionais, esperando-se que façam um trabalho tecnicamente competente e imune às pressões que sobre ambos pesarão enormemente, em particular, vindas do desmiolado e a caminho da falência Bloco Central do Betão — cuja miragem de salvação é o Novo Aeroporto de Lisboa, que não foi na Ota, como queriam, nem será em Alcochete, como querem e insistem todos os dias por todos os meios ao seu alcance. Nota importante: António Pinto Barbosa não é o irmão gémeo Manuel Pinto Barbosa, Presidente do Conselho Geral e de Supervisão da TAP!

Escrevi e repito que os nossos economistas têm grandes lacunas de informação em três domínios decisivos para o futuro do nosso país: energia, transportes e segurança estratégica —nomeadamente, territorial, marítima, hídrica e alimentar. Sem a frequência de seminários intensivos sobre estes temas correm o risco de falhar, como falharam estrondosamente até agora, nas previsões, nos modelos de desenvolvimento propostos, e nas consultadorias que prestaram.

Os casos Lusoponte, e aeromoscas de Beja —onde pontificaram as opiniões e propostas, respectivamente, de Joaquim Ferreira do Amaral e de Augusto Mateus, são a este título tristemente elucidativos: a ponte Vasco da Gama irá ser paga duas vezes pelos contribuintes, e o grande hub aeroportuário de Beja, de onde deveriam sair diariamente, segundo Augusto Mateus, toneladas de sardinhas —sim, sardinhas e carapaus!— para a União Europeia, está às moscas, provavelmente destinado a ser, no futuro, o parque de estacionamento para as aeronaves paradas da Portugália e da TAP que hoje atravancam as placas de estacionamento da Portela.

A grande pergunta a fazer, nas vésperas da entrada do Fundo Europeu de Estabilização Financeira e do FMI num país tecnicamente falido, é esta: se nos últimos dez anos, apesar do afluxo contínuo de avultadas verbas dos fundos de apoio comunitário, Portugal esteve praticamente estagnado, que poderemos esperar em matéria de crescimento numa conjuntura duplamente marcada pela diminuição drástica do apoio comunitário e pelo colapso financeiro em curso das economias cujo modelo de crescimento (virtual) assentou basicamente na desindustrialização, nas importações, no consumo desmesurado de energia, bens materiais e serviços, e no endividamento? A resposta só pode ser uma: nenhum crescimento, salvo se algum grau de proteccionismo regressar aos grandes espaços económicos e demográficos do planeta —à semelhança do que há muito sucede no Japão, e também na China.

A actual crise portuguesa deve ser vista, na realidade, como o ponto final do nosso modelo colonial de existência. Este modelo acabou de vez em 1974-75, mas os vícios por ele criados sobreviveram até hoje, nomeadamente na tipologia da nossa burguesia burocrática e palaciana, na presença desmesurada, paternalista e autoritária do Estado na sociedade (que as esquerdas marxistas reciclaram a seu favor), e na dependência sistemática do país e respectivas elites de uma qualquer árvore das patacas. O colapso do modelo colonial iniciado em 1415 foi progressivo. Começou com a independência do Brasil, teve outro grande abalo por ocasião da independência das possessões portuguesas na Índia, e culminou com a independência do resto do império entre 1974 e 1999. Cada uma destas perdas de território funcionou como epicentro de agudas crises económico-financeiras (1828, 1846-47, 1890-92, 1923, 1978, 1983), todas elas redundando, ao cabo de alguns anos, em graves crises de regime. O colapso financeiro de 2009-2011 terá como consequência inevitável o agudizar da crise de regime que já é patente, e a probabilidade de uma revolução institucional. O regime secular de autoritarismo burocrático, mediocridade técnica e institucional, incultura, clientelismo e dependência externa, perdeu os pilares sobre os quais assentou ao longo dos últimos seiscentos anos. Para sobreviver, Portugal precisa de se reinventar.

E precisa tanto mais de se reinventar quanto o resto do mundo se encontra também à beira de uma dolorosa metamorfose. Ninguém nos virá ajudar pelos lindos olhos que já não temos. Dependemos agora inteiramente de nós próprios para sair do buraco onde caímos.

O mundo, sobretudo o mundo desenvolvido e industrializado, está confrontado com três pontos de viragem potencialmente catastróficos:
  • o pico petrolífero, 
  • o pico alimentar e 
  • o pico do endividamento especulativo. 
 Resumindo: a produção de petróleo per capita decai desde 1970, a produção de cereais per capita começou a decair na década de 1980, e a bolha de derivados financeiros OTC, fruto de um modelo de crescimento especulativo pela via do consumo e do endividamento exponenciais, traduzia no final de 2009 um risco potencial de incumprimento de contratos de futuros equivalente a uns inimagináveis $615 trillions (615 biliões ou 615 milhões de milhões de dólares), quase 10x o PIB mundial (2).

A gravidade de cada uma das curvas exponenciais acima mencionadas é por si só evidente. Mas o pior é que duas delas —a curva da alimentação e a curva da especulação resultante da criação de dinheiro a partir de castelos no ar— decorrem directamente da descoberta, exploração, abundância e esgotamento a curto prazo dos principais hidrocarbonetos que alimentaram e continuam a alimentar a era industrial e a modernidade tal qual as conhecemos desde meados do século 19 —momento a partir do qual as máquinas começaram a ser alimentadas a carvão, electricidade e petróleo.

Vale a pena seguir o crash course de Chris Martensen sobre este tema...



E ouvir ainda Robert Hirsch a propósito do seu mais recente livro, The Impending World Energy Mess (Equal Time, audio, 50:19 mn)

As consequências do pico petrolífero têm um alcance potencialmente catastrófico para o mundo tal qual o conhecemos desde que Eça de Queirós escreveu A Cidade e as Serras (1892/1901). Teríamos mesmo que recuar aos tempos anteriores a 1830, quando pela primeira vez um caminho ferro e um comboio movido a vapor e alimentado a carvão ligaram duas cidades, Liverpool e Manchester, para imaginar o que poderá ser um futuro sem motores a vapor, ou de explosão, e um mundo sem electricidade, nem computadores, ou telemóveis. A humanidade poderá ver-se em breve imersa numa crise global de recursos sem precedentes. Para muitos analistas tal significará o fim de quase tudo o que hoje temos de barato e assumimos como dádivas naturais da civilização.

Antes, porém, do dilúvio, ou da grande seca anunciada, há coisas que as pessoas e os governos podem fazer para mitigar o inevitável. A primeira delas é não agravar, por falta de informação, estupidez ou ganância, os factores da crise sistémica do actual modelo civilizacional. No caso presente, e em Portugal, não agravar o nosso endividamento, não agravar a nossa dependência energética, e não agravar a nossa dependência alimentar.

Para não agravar, ou mesmo travar o crescimento exponencial do nosso endividamento público e privado, é preciso começar por redefinir as funções essenciais do Estado, aliviando a canga de burocratas e de burocracias que pesa sobre a sua eficiência, e sobre a viabilidade económica do país —nomeadamente na forma de tempo perdido e impostos assassinos (3). Neste ponto, diria que se não formos capazes de sensibilizar as lapas partidárias do regime, haverá que criar um movimento social contra os impostos e contra a burocracia, antes que estes inviabilizem definitivamente a independência nacional.

Para não agravar ainda mais a dependência energética do país teremos que fazer quatro coisas:
  1. diminuir drasticamente a intensidade energética da nossa economia;
  2. aumentar drasticamente a eficiência energética de indústrias, serviços, edifícios e comportamentos; 
  3. renacionalizar, pelo menos parcialmente, os recursos energéticos comuns, acabando ao mesmo tempo com os oligopólios que hoje impedem a sociedade civil de produzir e consumir em pequena escala energia fora das redes; 
  4. dar máxima prioridade ao transporte colectivo urbano, suburbano, interurbano e internacional alimentado por energia eléctrica produzida no país. As oportunidades de investimento neste sector estratégico são enormes e compensam largamente os planos condenados ao fracasso de retomar o business as usual na estafada economia baseada em combustíveis líquidos baratos (autoestradas, aeroportos e plataformas logísticas).

Para não agravar a nossa dependência alimentar, que acarreta por si só um agravamento automático da nossa dependência energética e do nosso endividamento (comercial, público e externo), é fundamental começar por definir um Plano Nacional de Segurança Alimentar, transparente e permanentemente aberto ao escrutínio democrático e discussão pública.

Sendo a área dos serviços aquela que previsivelmente será mais afectada pela escassez tripla de petróleo, dinheiro e alimentos, pois não tem grande coisa para dar em troca daquilo que materialmente é imprescindível à vida —comida, guarida e mobilidade física—, será fundamental desenvolver estratégias de regresso à produção! Sobretudo enquanto durar a actual aceleração dos processos de automação e robotização computacionais das prestações de serviços, num quadro já caracterizado pela impossibilidade de crescimento das dívidas soberanas e das cargas fiscais (cofres naturais da segurança social), tornar-se-à imprescindível religar os indivíduos e as comunidades à produção e transacção dos bens essenciais à vida.

A capacidade de produção alimentar em Portugal é limitada, mas ainda assim está longe de atingir o seu potencial. A propriedade rural encontra-se atomizada. Boa parte dos proprietários rurais vive e trabalha nas cidades, em grande medida por causa da revolução industrial e do desenvolvimento das cidades. Este período está, porém, a chegar ao fim. Em vez de se gastar inutilmente dinheiro público em Novas Oportunidades perdidas, talvez seja o momento de pensar onde melhor gastar os recursos financeiros que ainda vêm de Bruxelas. Por exemplo, lançando um programa nacional de agricultura biodinâmica e biológica, capaz de adaptar tecnologicamente os processos de cultivo e produção alimentar e florestal à escassez futura de adubos e pesticidas industriais (provenientes nomeadamente do gás natural e do petróleo), ao mesmo tempo que se especializa e confere competitividade cognitiva e social à agricultura, pecuária, piscicultura e silvicultura portuguesas. Estude-se, a este propósito o caso austríaco, para perceber até que ponto um país comunitário da Eurolândia pode abolir no seu espaço nacional todos os alimentos transgénicos e escolher uma via verde para a produção alimentar e conservação dos ecossistemas. Levar a segurança alimentar às cidades, e levar as cidades ao campo é todo um programa cujos impactos na mitigação dos constrangimentos que se seguirão ao fim do petróleo barato é demasiado grande para ser adiado. A inércia corporativa do regime tem que ser combatida e vencida, custe o que custar.

No início deste ano negro, o mais importante de tudo é evitar os jogos florais parlamentares e os teatros de sombras permanentemente instigados pelo governo, pelas oposições e pelos lóbis corporativos. Libertar a sociedade civil e salvar o país de uma morte súbita começa por aqui. O mais importante agora é discutir soluções.

NOTAS
  1. António Pinto Barbosa
    Fiscal das contas públicas certificou irregularidades no BPP
    05.01.2011 - 17:04 Por Cristina Ferreira. Público.
    O presidente do grupo de trabalho para criar a comissão encarregue de fiscalizar as contas públicas, António Pinto Barbosa, certificou durante cerca de dez anos as contas do Banco Privado Português, que foi intervencionado no final de 2008 pelo Banco de Portugal, para evitar a sua insolvência imediata.
    Mas haverá alguém que se salve deste naufrágio? — OAM
  2. Se em vez de se considerar o valor nocional OTC dos contratos de derivados, apenas se tiver em conta o respectivo valor bruto de mercado, ou seja a expectativa razoável de ganho, ainda assim está em jogo um volume de apostas especulativas sobre taxas de juros, desvalorizações cambiais, e outros activos virtuais, equivalente a 1/3 do PIB mundial, ou seja, mais ou menos 17 biliões de euros (17*10^12€).
  3. A "esquerda" monocórdica tem a mania de invocar a fuga aos impostos como argumento favorável ao aumento da carga fiscal. Está bom de ver que o argumento é idiota. Mas insistem, não querendo entender que se se combinar uma menor carga fiscal com uma vigilância e penalização forte aos infractores (começando pelos de cima) os resultados seriam bem melhores dos que os conseguidos com o terrorismo fiscal actualmente em curso. Um burro morto não paga impostos!
ÚLTIMA ACTUALIZAÇÃO: 6 de Janeiro de 2011 22:00

    quinta-feira, dezembro 30, 2010

    Europeus, coragem!

    Dólar e libra perdem guerra contra o euro
    Agora é preciso limpar os cacos, resistir ao assalto fiscal e à destruição de serviços públicos essenciais, bem como controlar os bancos e colocar as burocracias partidárias na ordem



    "We propose the creation of a harmonious economic community stretching from Lisbon to Vladivostok." — Vladimir Putin, ao Süddeutsche Zeitung (ler artigo no Spiegel Online de 25-11-2010)

    A resposta à ofensiva das moedas falidas do eixo anglo-saxónico (EUA-Inglaterra) contra o euro, na tentativa desesperada de impedir o abandono crescente do dólar como moeda de reserva mundial, parece estar em curso de forma rápida e eficaz, embora os radares da imprensa convencional captem com dificuldade e lamentável atraso esta realidade subtil mas de importância decisiva para os deslocamentos em curso das placas tectónicas do poder mundial.

    Por um lado, a SCO (Shanghai Cooperation Organization) tornou-se, de 2001 para cá (lembram-se de 2001?), numa poderosa aliança de estados euro-asiáticos. Por outro, a China começou a usar a sua moeda nas trocas internacionais com países como a Argentina, e acaba de acordar com a Rússia o abandono progressivo da divisa americana nas transacções entre estas duas potências económicas e nucleares mundiais. Esta tendência, cujo anúncio prematuro por Saddam Hussein lhe viria a custar a vida e a segunda grande invasão do Iraque pelos Estados Unidos e Inglaterra, foi retomada em Novembro passado por uma ofensiva diplomática sem precedentes de Vladimir Putin, tendo por alvo directo a Alemanha de Angela Merkel, mas visando obviamente um cenário muito mais amplo e particularmente atractivo para a União Europeia no momento em que esta enfrenta um ataque traiçoeiro e sem precedentes de Wall Street e Londres contra a estabilidade e integridade do euro. Mas mais: os emergentes BRIC, actualmente presididos pela China, acabam de incorporar formalmente no seu seio a África do Sul, transformando-se em BRICS: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (South Africa), na mesma semana em que sete países do Leste Europeu (1) anunciam a sua vontade de entrar na Eurolândia, apesar da crise (ou por causa dela...) Por fim, como que a provar a sabedoria de quem foge da nota verde, os dados mais recentes da economia dos USA, nomeadamente sobre a queda imparável dos preços do imobiliário, são de deixar os cabelos em pé (2).

    Mapa da área de influência da nova aliança estratégica promovida pela China

    As economias do Ocidente europeu e norte-americano estão sobre endividadas, quer no que se refere às respectivas dívidas externas, quer no que respeita às respectivas dívidas públicas. Mas o mesmo é ainda mais verdade para o Japão —onde a deflação continua a fazer vítimas, nomeadamente entre os pensionistas (3)—, não deixando de ser verdade também para muitos outros países: Austrália, Israel, Sudão, Líbano, etc. Ou seja, teremos que procurar a causa deste endividamento global em algo de mais fundamental do que as divergências —aliás praticamente inexistentes— entre sociais-democratas e neoliberais. Todos têm sido neo-keynesianos à sua maneira desde a crise petrolífera de 1973 —uns empolando mais as burocracias de Estado, partidárias e municipais, outros transformando as economias em gigantescos jogos de Monopólio, onde o dinheiro é grátis e não custa praticamente nada a fabricar (pois aflui aos mercados em formatos puramente virtuais por actos de magia electrónica e administrativa!) Em ambos os casos a receita é, por assim dizer, keynesiana: trata-se de inventar trabalho e consumo onde não existe!

    Há dois factos até agora não refutados que poderão fazer alguma luz sobre a magnitude e sincronia da actual crise sistémica do Capitalismo:
    • a produção de petróleo per capita tem vindo a decair consistentemente desde 1970, 
    • e a produção de cereais per capita começou igualmente a decair de forma aparentemente irreversível desde 1980.

    Outro ponto a ter em conta é o fim objectivo do colonialismo e do imperialismo ocidentais, que embora tenha começado a desaparecer lentamente no longínquo ano de 1823, por imposição da célebre Doutrina Monroe, que retirou progressivamente o "novo mundo" do domínio colonial europeu, acelerou extraordinariamente com os processos de descolonização na Ásia e em África depois da Segunda Guerra Mundial. A verdade é que este processo de implosão do imperialismo ultramarino iniciado pela Europa em 1415 (com a conquista de Ceuta por portugueses, galegos, biscainhos e ingleses), só agora está a chegar ao fim. Podemos ler estes sinais nas sucessivas derrotas da Europa e da América na Indochina, em África, e mais recentemente no Iraque e no Afeganistão. Podemos entender o alcance destes sinais desde 1960, quando os principais países produtores de petróleo formaram a OPEP, excluindo expressamente do seu seio grandes produtores com eram e ainda são os Estados Unidos e o Canadá. Podemos, enfim, ter a certeza de que algo de fundamental mudou, quando os países emergentes dos BRICS começaram a juntar os trapos, conscientes da sua importância global enquanto detentores de vastos territórios ricos em recursos naturais e humanos.

    De um lado, temos a velha Europa, a parte rica da América do Norte (EUA e Canadá), e o Japão, industrializados, urbanizados, e devoradores insaciáveis de recursos. Do outro, uma imensa maioria populacional pobre, pouco industrializada, pouco e mal urbanizada, e com acesso limitado às matérias-primas, fontes de energia e bens de consumo, vivendo paradoxalmente em territórios imensos, onde se encontra boa parte dos recursos vitais para a sobrevivência do modelo de desenvolvimento e crescimento criado e desenvolvido pelas antigas potências imperiais: energia, minérios, recursos alimentares e mão de obra barata.

    Era uma questão de tempo até que o mapa da divisão internacional do trabalho e do poder mudasse de geografia e de mãos. E é o que vem acontecendo de forma clara desde 1971, ano em que o presidente americano Richard Nixon descolou a divisa americana do ouro, pondo-a a flutuar num reino de arbitrariedade cambial, cujo fim negro se aproxima agora, perigosamente, do fim. O ataque indecente e traiçoeiro dos piratas de Wall Street e da City londrina contra o euro, mais não tem sido do que um último e lamentável episódio demonstrativo do que pode fazer um sistema fiduciário técnica e moralmente falido, entregue à ganância e ao crime, quando estrebucha.

    China, Rússia e boa parte dos países árabes estão fartos do dólar e dos americanos. Decidiram por isso apostar na moeda única europeia. É pois provável que não deixem cair o Euro, apesar de todas as pressões e do preço que tiverem que pagar por tal decisão estratégica. Os leilões de dívida soberana que ocorrerão na Europa ao longo de todo o ano de 2011 vão ser o verdadeiro teste de esforço à nova ordem económica e financeira mundial prestes nascer.

    Curiosamente, Putin, líder de facto de um imenso país despovoado e a caminho de uma perigosa depressão demográfica, já terá percebido que a China é um aliado de circunstância. Tornar pois possível a grande Europa de Lisboa a Vladivostoque é agora o grande desígnio "secreto" da Rússia (4), que os portugueses deverão acarinhar com o mesmo entusiasmo que deverão colocar na rápida entrada da Turquia numa Eurolândia que tem tudo a ganhar com a sua abertura a Leste. Uma nova Europa com mil milhões de habitantes e uma longa história cultural poderá fazer a diferença que falta na recomposição planetária dos equilíbrios entre as grandes regiões humanizadas. E no fim, Portugal até poderá deixar de estar na periferia —se souber transformar-se numa pequena mas importante potência diplomática mundial. Bom ano, Portugueses!

    REFERÊNCIAS
    • A V.O. de Mark Blyth on Austerity, encontra-se acessível na Videoteca deste blogue, ou no portal Vimeo.

    NOTAS
    1.  "Sept pays candidats pour rejoindre le club. Par Fabrice Nodé-Langlois". Le Figaro (27/12/2010)
    2. "Investors Attempting to Dump Bonds Push Bid Index Near Record: Muni Credit", By Brendan A. McGrail, Bloomberg, Dec 27, 2010.
      ROBERT SHILLER: "If House Prices Keep Falling This Fast, The Economy Is Screwed", Business Insider, Dec 29, 2010.
    3. Japan to cut pension benefits amid deflation. Japan Today, Tuesday 21st Dec, 08:18 AM JST
    4. Sobre isto mesmo escrevemos, a pretexto da cimeira Europa-Rússia celebrada durante a presidência portuguesa da UE em Lisboa, em Outubro de 2007, o seguinte:
      A cimeira Europa-Rússia que hoje tem lugar em Portugal, no âmbito da presidência portuguesa da União Europeia, na conjuntura explosiva que o mundo está a atravessar, tem uma importância crucial para o futuro imediato do próprio projecto europeu. Ou a Europa descola diplomaticamente da América e defende os seus interesses regionais de forma inteligente e clara, ou permanece atrelada às manobras inglesas (e agora também do garnisé francês), deixando os proto-fascistas da Casa Branca conduzirem o planeta para uma III Guerra Mundial. Mesmo que limitada, mesmo que não alastre imediatamente a todo o planeta, uma guerra de mini-nukes (contra o Irão, por exemplo) levará necessariamente a um novo Tratado de Tordesilhas, desta vez entre os EUA e a Rússia-China, por cima dos escombros materiais e ideológicos de uma Europa decapitada de qualquer protagonismo nos próximos duzentos anos. O contrário desta possibilidade passa pela existência de uma terceira posição estratégica independente, protagonizada pela Europa, em nome da racionalidade, da distensão e da cooperação mundial. Não é assim tão difícil. — in "Rússia, Vladimir Putin, um novo príncipe" (O António Maria, 25-10-2007.)

      Última actualização: 30-12-2010 12:02

    terça-feira, dezembro 28, 2010

    Finanças Pessoais

    2011-2020: poupar, proteger, diversificar
    principais aplicações para as auas poupanças
    1. Habitação própria — se contraiu um empréstimo para comprar a sua casa, o ideal é livrar-se tão cedo quanto possível da hipoteca. Livre-se de encargos prescindíveis e de hipotecas que possam afectar a posse do bem em consequência de uma subida empinada das taxas de juro e dos preços de bens essenciais como a energia e a água. A médio-longo prazo (10—20 anos) o Euro irá perder paulatinamente valor, os juros irão subir, e as pensões de reforma e outros subsídios verão diminuir significativamente o respectivo poder de compra. Faça um somatório de todos os encargos que tem com a sua casa (hipoteca, consumos de energia, água e telecomunicações, condomínio e manutenção geral) e simule os impactos que poderão ter nas suas receitas uma inflação real de preços e juros sobre empréstimos na ordem dos 10% ao ano. Não se esqueça que uma moeda como a Libra inglesa, por exemplo, tendo o ouro como padrão de referência, perdeu 400% do seu valor desde 1971 (Why I keep buying Silver and Gold, by Bengt Saelensminde, in MONEY WEEK).
    2. Trabalho — é um bem cada vez mais raro, e enquanto a tecnologia for alimentada por energia fóssil barata, não haverá regresso em massa ao trabalho, isto é, ao trabalho das nossas mãos, braços, pernas e cérebros. Esta realidade é ainda mais séria no Ocidente, cujas indústrias têm emigrado a ritmo acelerado para a China, a nova fábrica do mundo. No entanto, é preciso ter em conta que a energia fóssil barata está à beira do fim. Depois, só energia cara, muito cara mesmo. Preservar o pouco trabalho que há, ainda que auferindo menos dinheiro pela sua realização, vai tornar-se um questão cada vez mais crítica para as economias pessoais e familiares.
    3. Ouro e prata — o valor destes metais não pára de subir e é de crer que continuará a ser uma das melhores aplicações para a poupança que formos conseguindo. Habitue-se a fazer pequenas poupanças semanais, sobretudo nos consumos supérfluos, aplicando-as em pequenas moedas de ouro e prata. Para uma introdução ao investimento em metais preciosos, leia-se este actualizado A beginner's guide to investing in gold, publicado pelo MONEY WEEK. Não é sem motivo que a Índia comprou duzentas toneladas de ouro ao FMI em Novembro de 2009 (in The Prudent Investor).
    4. Terra — as necessidades alimentares que hoje são preenchidas com produtos variados e a preços razoáveis, sobretudo nos países ricos do Ocidente, poderão deparar-se em breve, no prazo de uma década, com falhas de abastecimento inimagináveis nos dias que correm, e uma inflação galopante. Quando esta escassez, motivada pela carestia do petróleo e do gás natural, ocorrer, ou antes, quando esta escassez inevitável se tornar visível no horizonte, a corrida às terra ricas em nutrientes, aptas a gerar alimentos, atingirá proporções nunca vistas —nem nas grandes corridas ao ouro. O momento para investir em terrenos com potencial agrícola, sobretudo nas zonas próximas dos grandes centros urbanos, é agora! 
    5. Amizade — as tensões sociais tendem a agravar-se à medida que a escassez energética aumenta, provocando a inflação e o endividamento geral dos indivíduos, famílias, nações e estados. A tentação dos governos, depois das democracias ocidentais terem degenerado em aparelhos burocráticos, populistas e minoritários, cada vez mais musculados (os estados de excepção, sob a forma de leis anti-terroristas, ou de estados de alarma, regressaram ao nosso quotidiano), é apropriarem-se, por via de leis arbitrárias (ainda que sufragada por parlamentos e dirigentes políticos cada vez mais corruptos), ou à força, da riqueza alheia. Fazem-no já sob a forma de um verdadeiro terrorismo fiscal, da desvalorização do dinheiro, do ataque directo ao Estado Social que os impostos já não conseguem suportar, e preparam-se mesmo para desencadear no futuro operações em massa de expropriação directa da propriedade privada, alegadamente em nome do interesse público. O anúncio pelo actual ministro da agricultura português, rapidamente abafado, da expropriação de terrenos florestais para posterior entrega a empresas privadas "especializadas", foi um balão atirado para o ar para estudar reacções. Mas a verdade é que o assunto estava, está e estará em cima da mesa das burocracias democráticas que, não tenho dúvidas, se preparam para a eventualidade de uma estatização forçada da riqueza, nomeadamente agrícola e florestal. É este tipo de desestruturação social, que em breve poderá tomar conta das economias a braços com a tragédia de um bem comum exausto (o petróleo e o gás natural baratos), que as sociedades civis de todos os países terão que enfrentar. Os povos que souberem criar rapidamente laços de amizade e cooperação, baseados na proximidade e na organização em rede, poderão talvez conseguir travar a barbárie, e reconduzir as nações a um novo ponto de equilíbrio. Daí a importância de promover, desde já, a acumulação dessa nova riqueza imprescindível ao futuro da humanidade: a amizade.

    sexta-feira, dezembro 03, 2010

    Bancarrota-8

    Pausa para respirar... e agir

    A guerra financeira entre o dólar (pegado à libra) e o euro prossegue, com golpes baixos e muitos sorrisos. Os analistas anglo-saxónicos pintam diariamente quadros negros sobre o continente europeu, e Trichet lá vai respondendo de forma imprevisível e por vezes surpreendente ("Europe needs budgetary federation" — EUobserver"). O BCE andou e anda a comprar dívida soberana no mercado secundário. Bastou esta notícia não confirmada directamente pelo BCE, mas que quem comprou divulgou anonimamente, para os especuladores abrandarem os seus ataques aos flancos mais frágeis da dívida soberana europeia: Grécia, Irlanda, Portugal... e Espanha.

    Jean-Claude Trichet disse hoje que o BCE continuará a comprar dívida pública dos países do euro e pediu sanções automáticas para os países que falhem compromissos orçamentais.

    (…) O presidente da instituição escusou-se, no entanto, a pronunciar-se directamente sobre as informações publicadas pela imprensa sobre a compra em grande quantidade de títulos de dívida portugueses e irlandeses na quinta-feira.

    (…) Na mesma conferência, o presidente do BCE pediu um sistema de sanções quase automáticas para os países que não cumpram os compromissos orçamentais, insistindo que os governos devem credibilizar os programas de ajustamento e reformas estruturais. — in "Trichet pede sanções automáticas e garante que BCE vai continuar a comprar dívida", 03 Dezembro 2010 | Jornal de Negócios com Lusa.

    Este recuo dos especuladores é, porém, meramente táctico, pois o problema de fundo subsiste: a dívida soberana europeia é uma bolha especulativa gigantesca (ver este gráfico de maio —Europe's Web of Debt—do NYT) e vai acabar por rebentar. Daí que seja da mais elementar prudência pagar todas as nossas dívidas quanto antes, não contrair mais empréstimos, aplicar as poupanças em bens duradouros com uma grande valorização potencial (ouro, terra fértil, casas em segunda mão bem localizadas e a bom preço, e pouco mais), evitar investimentos especulativos em produtos financeiros e seguros mal explicados e de duvidosa proveniência (1).

    A perspectiva sombria de um estouro da moeda única europeia não está —muito longe disso— afastada do horizonte mais próximo. Como não estão também afastadas as probabilidade reais de uma quarentena fora do euro para alguns dos leitões da Europa (PIGS), que nada devem à fama que os suínos sempre tiveram em matéria financeira — criar um porco foi, durante milénios, uma boa forma de investimento e de poupança.

    Uma coisa é certa: espera-nos uma década de contínuo empobrecimento, pois os juros anuais da nossa dívida pública (6,5 mil milhões de euros em 2010, ou seja, qualquer coisa como 6,5 pontes Vasco da Gama) já ultrapassam tudo o que gastamos com a nossa alimentação! Se não pararmos imediatamente todas as Parcerias Público Privadas no sector da saúde e dos transportes, se não adiarmos a Alta Velocidade (à excepção da ligação para passageiros e mercadorias entre o Pinhal Novo e Caia) e não afastarmos para as calendas gregas o monstro aeroportuário da Ota em Alcochete, seremos inexoravelmente expulsos da Eurolândia. É uma aposta que faço com os meus leitores.

    Há, porém, sinais de esperança. A venda do diário "i" pelo Grupo Lena é um sintoma claro de que as obras públicas já pararam, por falta de objectivos sensatos, por falta de financiamento e porque os projectos anunciados revelarem todos uma rentabilidade nula fora do regaço protector do agora obviamente falido cliente Estado. Se até Junho de 2011 (2), o défice e a dívida pública não recuarem para os valores exigidos pelo BCE e pela Alemanha, as penalizações serão a matar. Ou seja, a janela de oportunidade para se fazer o que é preciso fazer é de apenas um semestre. Será este o definitivo prazo de validade de José Sócrates?

    Como se a situação portuguesa não fosse suficiente para nos afligir, temos aqui ao lado uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. Chama-se Espanha (3) e a ela devemos qualquer coisa como 86 mil milhões de euros!

    Vivi em Espanha alguns anos e tenho vários amigos do coração por lá. Num painel sobre as televisões autonómicas para o qual fui convidado, creio que no ano 2002 ou 2003, interroguei-me sobre a origem de tanto dinheiro, e sobre a viabilidade futura das autonomias, não pelo lado da sua legitimidade, mas tão simplesmente pelo lado da despesa. Quem pagava então, e quem pagaria no futuro semelhante gasto fiscal? Outro aspecto da sociedade espanhola que me causou sempre igual apreensão foi a dimensão e ineficiência de boa parte dos seus serviços públicos, bem como a presença ostensiva dos grandes oligopólios no quotidiano dos espanhóis. Lá como cá a democracia era e é um bem recente, degustado como uma iguaria deliciosa cujo preço ninguém perguntava, nem pergunta (ou só agora começa a perguntar...) Os resultados que eu temia estão à vista e, claro está, nada pude fazer para os evitar, apesar de ter falado e escrito sobre o tema vezes sem conta.

    A situação em Espanha é tanto mais dramática quanto boa parte da população continua anestesiada pelos poderes político-partidários e mediáticos. Lá como cá, os comportamentos chegam a ser de uma irracionalidade impensável. Em Portugal, por exemplo, com o anúncio antecipado da subida do IVA em 2011 (certamente para estimular o crescimento do PIB ainda este ano...), a venda de automóveis aumentou mais de 50% relativamente a 2009. Em Espanha, felizmente para todos, as medidas governamentais têm sido mais sensatas. Mas chegarão? A imprensa anglo-saxónica tem as maiores dúvidas!

    — As necessidade financeiras do Estado espanhol para 2011 ascendem a 21% do respectivo PIB, ou seja a 226 mil milhões de euros! Mas os bancos, por sua vez, também precisam de refinanciar as respectivas dívidas num montante de 220 mil milhões de euros!!

    (…) Should the EU really impose a 6.7pc interest charge on Ireland’s bail-out loans, it should not be surprised if the new Irish government in January walks away from the whole stinking arrangement, and pulls the plug on Europe’s banking system.

    (…) Has Mr Zapatero read the IMF’s devastating Article IV report on his own country? It states that the government’s “gross financing needs” for 2011 will be €226bn, or 21pc of GDP. “Spain’s financing requirements are large and, retaining market confidence will be critical. Spain has exhausted its fiscal space. Targets should be made more credible.”

    Madrid must attract €226bn of good money from Spanish savers, German pension funds, French banks, Japanese life insurers, and China’s central bank, so that an incompetent government (this one happens to be socialist, but the Greek conservatives were worse) can continue to run budget deficits of 7pc to 8pc of GDP in 2011. Why should they lend a single pfennig, having already been told by EU leaders that they will face scalping if Spain ever needs a rescue?

    (…) Furthermore, Spanish banks will need to roll over €220bn in 2011 and 2012, according to Enrique Goñi, head of Banca Cívica. “We’re in the antechamber of a new liquidity crisis. We’re living through a financial pre-collapse,” he said. — in "Germany faces its awful choice as Spain wobbles", by Ambrose Evans-Pritchard, The Telegraph (29 Nov 2010).

    — A Eurolândia (e sobretudo a Alemanha) está metida numa camisa de sete varas. Não pode suportar indefinidamente todas as dívidas soberanas dos membros da união monetária, sob pena de rebentar com a poupança de quem a tem, e colocar a Europa à beira da ruína. E não pode inundar as economias de liquidez, sob pena de desvalorizar perigosamente o euro, criar uma inflação potencialmente incontrolável, e acabar por destruir a moeda única.

    (…) Investors’ no-confidence vote in the aid package for Ireland may force European policy makers to expand their arsenal to fight the debt crisis threatening to tear the euro apart.

    Options outlined by economists at Societe Generale SA and Barclays Capital include: Boosting the 750 billion-euro ($975 billion) temporary rescue fund or turning it into an asset- buying program; cutting interest rates on bailout loans; issuing joint bonds for the 16 euro nations or flooding the economy with cash from the European Central Bank.

    (…) “As the crisis deepens and threatens core countries, the future of monetary union continues to be called into question,” said Chandler. “As the situation becomes more desperate, the unthinkable has to be thought. Quantitative easing by the ECB may be one of the few ways out.”  — in "Contagion May Force EU to Expand Arsenal to Fight Debt Crisis", By Simon Kennedy and James G. Neuger, Bloomberg - Dec 1, 2010.

    NOTAS
    1.  Outra opção que começa a ser interessante, e que poderá ser objecto de grande concorrência em breve, são os depósitos a prazo. Consultar esta tabela comparativa de depósitos a prazo, publicada hoje pelo Money GPS.
    2. A portinhola do BCE onde se financiam a 1% os bancos comerciais, para logo comprarem dívida soberana com rendimentos acima dos 5% (6%, 7%, e 9%), ou realizar operações de empréstimos a particulares e empresas com TAEGs acima dos 20%, deveria fechar-se no próximo dia 31 de Janeiro. Mas a necessidade de um contra-ataque do BCE contra o cerco montado pelos estrategas financeiros de Wall Street e da City londrina contra o euro, manterá a dita portinhola do easy money aberta até Junho. É por isso que os próximos seis meses vão der decisivos. E é por isso que a cidadania deverá exercer toda a sua vigilância e pressão sobre a corja político-partidária — do governo, às oposições, passando pelo senhor Cavaco. Os candidatos presidenciais que se opõem ao actual presidente da república são irrelevantes. Por patriotismo, deveriam fazer uma coisa: desistir da farsa eleitoral que aí vem, colocando assim o regime perante as suas responsabilidades. [3-12-2010; 22:40]
    3. Li, já depois de publicado este post, o artigo de Paul Krugman, O Prisioneiro Espanhol, publicado no i [4-12-2010, 1:19]

    domingo, novembro 28, 2010

    Bancarrota-5

    Dívidas soberanas, quem paga?

    Photograph: Matt Dunham/AP
    The sorrow of Portugal

    Yesterday, I had a rather sad conversation with a friend in Portugal. The country has just had to force through another austerity budget; and fears are mounting that it will be next in line for an EU bail-out. “We should never have entered the euro”, my friend lamented. “Everything went downhill from there. For us and for everyone.” — in Finantial Times, Nov. 26, 2010.

    Those too young to vote, yet with their futures at stake, have organically come together to be heard.

    'The word spread through Twitter and Facebook; rumours passed around classrooms and meeting halls: get to Westminster, show them your anger.'

    Outside Downing Street, in front of a line of riot police, I am sitting beside a makeshift campfire. It's cold, and the schoolchildren who have skipped classes gather around as a student with a three-string guitar strikes up the chords to Tracy Chapman's Talkin Bout a Revolution. The kids start to sing, sweet and off-key, an apocalyptic choir knotted around a small bright circle of warmth and energy. "Finally the tables are starting to turn," they sing, the sound of their voices drowning out the drone of helicopters and the screams from the edge of the kettle. "Finally the tables are starting to turn."

    Then a cop smashes into the circle. The police shove us out of the way and the camp evaporates in a hiss of smoke, forcing us forward. Not all of us know how we got here, but we're being crammed in with brutal efficiency: the press of bodies is vice-tight and still the cops are screaming at us to move forward. Beside me, a schoolgirl is crying. She is just 14. — in Guardian.co.uk, 24 Nov, 2010.

    A União Europeia pode quebrar pelo elo mais forte: a Alemanha. Porquê? Porque das duas uma: ou os estados falidos da Europa assumem rapidamente dietas violentas nos seus orçamentos Pantagruélicos, e por esta via põem em causa os privilégios das corporações, nomenclaturas, burocracias e bases eleitorais de que dependem para se manterem no poder, ou então, persistem nas actuais manobras de retórica populista e de dissimulação orçamental com as graves implicações que uma tal opção terá para o euro enquanto moeda de reserva alternativa ao papel higiénico norte-americano. Adiar por mais um ano, ou até por mais seis meses, a inevitável austeridade orçamental que permitirá estancar a gangrena financeira dos países sobre-endividados, levará o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF) a ter que duplicar a sua actual capacidade de resgate das dívidas soberanas (750 mil milhões de euros), para acudir ao dominó das bancarrotas europeias actualmente em curso.

    A simples probabilidade de o Banco Central Europeu entrar pela mesma via da Reserva Federal, o chamado Quantitative Easing (QE), pondo os computadores a criar dinheiro electrónico sem qualquer base de riqueza efectivamente criada, levou já o Brasil, a China, a Rússia e o Irão —a que se somará em breve um número crescente de países produtores de matérias primas, energia e trabalho barato— a estabelecer uma estratégia monetária de recurso que poderá passar pelo abandono das moedas de reserva americana e europeia. A actual corrida ao ouro e à prata, e a retenção destes metais preciosos pelos grandes produtores, são um sintoma claro de que o sistema monetário nascido dos acordos de Bretton Woods está mais do que moribundo. Morreu e vai ser em breve enterrado.

    Os verdadeiros credores da nossa dívida colectiva, pública e privada, isto é, aqueles que produzem a maioria dos bens transaccionáveis que preenchem as nossas vidas mais ou menos confortáveis e neuróticas, não estão dispostos a financiar por muito mais tempo o nosso consumo e o nosso lazer sem um contra-valor real. A China, o Brasil, a Rússia, o Irão, e os estados petrolíferos do Médio Oriente, estão atulhados de liquidez virtual e fartos de inflação. Querem agora uma parte crescente dos nossos activos em troca de mais petróleo, em troca de mais soja, e em troca de mais telemóveis e computadores.

    A Revolução Industrial fez-se em cima de uma escabrosa pilha de cadáveres e escravos. Durou 200 anos e não sobreviverá a 2030. Os escravos coloniais, sobretudo depois do renascimento da China, e da grande rebelião muçulmana em curso, deixaram de obedecer ao império judaico-cristão e rejeitam também categoricamente a supremacia branca, anglo-saxónica e protestante. Um novo mundo, inimaginável por enquanto, está em gestação. A geratriz desta revolução está no Oriente. Aos antigos cruzados resta-lhe acordar.

    Os desafios são arrepiantes. Não, não são nenhuma farsa, como as minocracias burocráticas europeias querem fazer crer. A Alemanha está muito consciente destas ameaças, e por isso não irá tolerar por muito mais tempo a irresponsabilidade populista dos pequenos burocratas e regimes corruptos do Sul da Europa. Em breve colocará a União perante um dilema sem precedentes: ou se colocam os PIGS em quarentena, fora do euro, durante 1, 2, 4... 10 anos, ou a Alemanha bate com a porta e regressa ao marco. Se o falido Reino Unido continua com a sua libra esterlina, se a Suécia continua com a sua coroa, porque não libertar a economia alemã do fardo de alimentar porcos a pérolas e burros a pão de Ló? Na realidade, parece-me mais verosímil uma saída da Alemanha do Sistema Monetário Europeu, do que a expulsão das paquidérmicas minocracias burocráticas do Sul da Europa, e da sacrificada Irlanda, do ilusório bem-estar em que têm vivido desde o aparecimento da moeda única.

    Premier Wen Jiabao shakes hands with his Russian counterpart Vladimir Putin
    on a visit to St. Petersburg on Tuesday. ALEXEY DRUZHININ / AFP

    China, Russia quit dollar in trade settlement

    China and Russia have decided to renounce the US dollar and resort to using their own currencies for bilateral trade, Premier Wen Jiabao and his Russian counterpart Vladimir Putin announced late on Tuesday. — in People's Daily Online, November 24, 2010.

    Yuan begins trading against the rouble

    SHANGHAI - China started allowing the yuan to trade against the Russian rouble in the interbank market from Monday as policymakers promote the currency's use in global trade and finance.

    The move will help "facilitate bilateral trade between China and Russia and help develop yuan trade settlements," according to a statement published on the website of the China Foreign Exchange Trade System (CFETS), a subsidiary of the People's Bank of China. — in China Daily, Nov. 23, 2010.

    Crisis of Fiat Currencies: US Dollar Surpluses Converted into Gold
    China, Russia, Iran are Dumping the Dollar

    China and Russia are both large gold producers and for a number of years have been buying up domestic gold and silver production, so that it never reaches the market and does not affect prices. If anything the absence of sales tends to push the markets higher. As a matter of fact Russia and India are visible buyers. Even Iran with its oil surplus recently announced that they had purchased 340 tons of gold. Their recent gold purchases are very significant as affiliate members, which have access to the present and ultimate direction of the group. You might say buying gold has been a protective effort to shield members and close observers from the problems generated by dollar policies. They are accumulating gold, as many have been worldwide, for the past ten years, but particularly over the past few years. — in Global Research, November 22, 2010.

    China to rebuild Argentine rail
    BEIJING - CHINA and Argentina have agreed to invest about US$10 billion (S$13.8 billion) over several years to renovate the Latin American country's dilapidated railway system and build a subway for its second-largest city.

    (…) Argentina's once-extensive rail network was largely dismantled during the privatisations of the 1990s. But as agricultural output soars, farmers and grain elevators - who send more than 80 per cent of grains by costly road transport - have been calling for investment to revive the railways. —  in Strait Times, Jul 13, 2010.

    China, Argentina to settle trade in yuan: Xinhua

    HONG KONG (MarketWatch) -- China and Argentina have agreed to set up a 70 billion yuan ($10.24 billion) currency swap system that will enable trade between the two nations to be settled in the Chinese currency, the state-run Xinhua News Agency reported Monday. — in Market Watch, March 30, 2009.

    Os dados estão lançados. Não vejo como possamos, a menos que optemos por uma sinistra deriva suicida, deixar de olhar os problemas de frente. A globalização, tal como foi engendrada, exportou a economia para o Oriente (1) e levou o Ocidente à bancarrota. Para controlar os estragos e retomar um certo equilíbrio na divisão internacional do trabalho teremos que voltar a levantar barreiras à circulação libertina dos capitais, das mercadorias e das pessoas, em nome da integridade produtiva das nações e em nome da sustentabilidade dos ecossistemas de que a vida humana é parte integrante e indissociável.

    As democracias ocidentais deixaram há muito de ser democracias (basta ler as estatísticas eleitorais.) Na realidade, o que temos são sociedades burocráticas sem trabalho, que nada ou pouco produzem, e que consomem o que de facto não podem pagar, a não ser contraindo mais daquilo que rapidamente aprendemos todos a contrair nas últimas quatro décadas: dívidas!

    Os países europeus terão que passar rapidamente por um processo de profunda revolução ideológica e política. Vai ser preciso libertar da esfera burocrática estatal toda a comunicação, toda a administração e toda a ciência. Mas vai ser, por outro lado, absolutamente necessário reincorporar na esfera social, de uma forma distinta dos actuais sectores públicos, e público-privados, o bem comum: o ar que respiramos, a água que bebemos e alimenta o resto da Natureza, as vias da mobilidade humana, as fontes de energia, a agricultura e a indústria. Não é a propriedade privada em si que está em causa, mas a sua concentração, monopolização e transfiguração financeira. A tarefa é avassaladora e complexa. Mas nem por isso menos inadiável.


    NOTAS
    1. List of countries by steel production

    domingo, novembro 14, 2010

    Bancarrota-4

    Expulsar Portugal da Eurolândia?

    Masaccio, "Expulsão de Adão e Eva do Paraíso"

    O charlatão que elegemos para primeiro ministro anunciou, em perfeito jet lag (1), mais uma boa notícia sobre a nossa excelente economia: estamos a crescer mais do que o previsto e mais do que a generalidade dos nossos parceiros europeus. Esqueceu-se "o engenheiro" de dizer que a boa performance das exportações se deve ao crescimento alemão, que houve compras antecipadas e por atacado de automóveis e outros bens e serviços na previsão de uma subida generalizada dos impostos, e que pese embora as quebras acentuadas das receitas turísticas, sobretudo hoteleiras, o fenómeno chamado Low Cost deu origem a uma verdadeira ponte aérea entre Porto, Lisboa, Faro e Funchal, de um lado, e dezenas de cidades europeias, originando uma nova e surpreendente classe de passageiros frequentes composta por emigrantes portugueses. Ouve-se falar inglês, italiano e francês no Porto e Matosinhos, como nunca se ouviu. Mas o que realmente tem feito a diferença, suspeito bem, é a frequência com que os nossos emigrantes se deslocam a Portugal, para ver familiares, tratar dos seus negócios e comer pataniscas, desde que a Ryanair, a easyJet, a Vueling e a Air Berlim, entre outras companhias aéreas de baixo custo, começaram a fazer o que a TAP (2) há muito deveria ter começado a fazer, mas não fez — subordinada que esteve nas últimas décadas aos negócios privados dos piratas do Bloco Central e da Tríade de Macau.

    Das exportações atraídas pelo crescimento alemão e asiático, e dos fluxos de poupança que as mais recentes vagas de emigração aportam ao país, ninguém se pode queixar e todos temos que agradecer. São factores de resiliência que ajudam a compreender porque não nos estatelamos ainda ao comprido, mas que nenhum político pode exibir como mérito próprio. A corja partidária, sobretudo aquela corja que há três décadas coloniza a nossa democracia como se de uma coutada ou grande tacho se tratasse, continua a comportar-se, no meio da maior crise de endividamento de que há memória neste país, como uma insaciável ninhada de ratos mimados. O descalabro começou na fase terminal da dita era Cavaco. Daí a aliança descarada entre o incapaz e recandidato presidente, e o mitómano que dá pelo nome de Sócrates!

    Mas se é verdade que as exportações têm vindo a crescer a bom ritmo, e que centenas de milhar de portugueses emigrados continuam a investir no seu país, não é menos verdade que o nosso endividamento colectivo, a dívida externa portuguesa, e sobretudo o escandaloso descalabro das finanças públicas geridas pelo Terreiro do Paço, ameaçam atirar Portugal para fora do Sistema Monetário Europeu, isto é, para fora do euro! Se em 2011 Portugal, como é cada vez mais provável, suspender o pagamento de dívidas ao exterior e declarar a bancarrota do Estado, a que se seguirá um processo formal de reestruturação da sua dívida soberana, não será o fim do mundo, mas será certamente o princípio do fim desta República.

    É à luz da óbvia gravidade da situação em que nos encontramos que as palavras de Luís Amado ao Expresso e a agitação crescente nas hostes do PS devem ser compreendidas. O Partido Socialista, se não conseguir acantonar a horda de piratas que tomou de assalto o PS e o Estado, entrará num imparável e humilhante processo de suicídio político e desagregação. Para evitar esta possível morte prematura, só tem uma coisa a fazer: apear o vilão Sócrates do poleiro!

    Como aqui se escreveu várias vezes, o actual ministro dos negócios estrangeiros seria uma boa alternativa ao imprestável Sócrates, na perspectiva da formação duma grande coligação governativa (PS, PSD, CDS). Esta coligação, apesar de problemática, é há muito a única geometria político-partidária, no actual quadro constitucional, capaz e reunir a autoridade democrática e traçar a bissectriz programática imprescindíveis ao estabelecimento dum acordo de regime para uma década, do qual venha a constar como prioridade única fundamental o emagrecimento do paquiderme estatal criado pela simbiose oportunista entre a nomenclatura partidária, a burguesia corporativa, a clientela económico-financeira e a burocracia (3). Um estado menos obeso será necessariamente mais transparente, mais ágil, e mais solidário.



    As alternativas reduziram-se drasticamente nos últimos meses. Se nada se fizer no PS —i.e. se ninguém com a coragem suficiente exigir um congresso socialista antes mesmo das próximas presidenciais (marcando em larga medida o desfecho destas) para apear Sócrates e a canalha que o rodeia, e preparar o PS para forçar o inanimado Cavaco e o novel Passos de Coelho a sentarem-se à mesa de uma grande coligação, então seremos inexoravelmente expulsos do euro (4).

    NOTAS
    1.  Sócrates estava em Macau quando se congratulou com o crescimento inesperado do PIB, numa viagem desesperada para convencer o primeiro ministro chinês (Wen Jiabao) a convencer o presidente chinês (Hu Jintao) de que os piratas lusitanos que levaram Portugal à bancarrota precisam desesperadamente que a China compre um, dois, ou três mil milhões de euros da nossa dívida soberana, e que entrem também no capital dos sobre endividados BCP e EDP. Só que até agora, para além das palavras protocolares, népias! É provável que a China ajude Portugal, mas para que tal aconteça, creio que Hu Jinato e Wen Jiabao esperarão pela saída do imprestável Sócrates. É esta a conclusão que retiro das movimentações desesperadas da Tríade de Macau.
    2. Há muito que Bruxelas decidiu liberalizar os céus da Europa e privatizar o transporte aéreo, proibindo os estados nacionais de injectar dinheiro nas suas obesas e ineficientes companhias de bandeira. Países como Portugal, Espanha e outros inventaram no entanto mil e um subterfúgios para continuarem a alimentar o endividamento imparável destas companhias à custa dos contribuintes adormecidos — mantendo assim porcas orçamentais invisíveis com que têm vindo a amamentar as respectivas nomenclaturas, cada vez menos democráticas: partidos e deputados (recordemos o caso extraordinário da deputada Inês Medeiros, mas também os milhões em descontos destinados aos passageiros frequentes da nossa classe partidária), legiões de administradores fictícios e comissários políticos, e as empresas clientelares do regime (recorde-se o caso da falida PGA impingida politicamente pelo BES à falida TAP). A companhia administrada pelo gaúcho Fernando Pinto conta apenas com três activos de monta: a posição dominante nos voos entre o Brasil, Angola e Europa; os seus pilotos e o pessoal de manutenção de aeronaves. Tudo o resto é prejuízo ou leasings por pagar. Ou muito me engano, ou o governo português vai ser obrigado, por quem lhe empresta o dinheiro para pagar aos funcionários públicos, reformados e pensionistas, a privatizar a TAP em 2011. O governo "socialista" quererá fazê-lo, mas colocando o ónus do despedimento de alguns milhares de trabalhadores (336 da Groundforce já marcharam) aos ombros do comprador. Acontece, porém, que Sócrates e os capachos Vieira da Silva e Teixeira dos Santos, já perderam toda a margem de negociação. Resta-lhes tão só obedecer ao BCE e a Bruxelas. Ou então, um golpe de génio: vender a TAP, o BCP e uma fatia estratégica da EDP (10%) aos chineses! Sempre evitávamos a entrada de Madrid no Terreiro do Paço, e colocávamos Portugal num novo plano de diplomacia estratégica.
    3. Para além do emagrecimento do Estado e de boa parte das instituições democráticas (alteração da lei eleitoral e diminuição do número de deputados, câmaras municipais e freguesias urbanas), devemos exigir de quem nos levou à falência mais estas prioridades estratégicas:
      • revisão imediata de todas as Parcerias Público-Privadas, incluindo rescisão de boa parte das mesmas e incriminação eventual dos seus autores;
      • revisão imediata da política de gestão dos recursos hídricos nacionais, abolindo de imediato o sórdido processo de privatização das águas públicas;
      • revisão imediata da política energética nacional, trocando a actual estratégia de exaustão e assalto oligopólico aos recursos energéticos efectivos e potenciais do país, por uma estratégia pública rigorosa e drástica de eficiência energética;
      • actualização instantânea dos valores mínimos exigíveis das rendas urbanas, indexando os valores por metro quadrado a uma regra de cálculo transparente e justa, indexada ao efectivo poder de compra de cada cidade e aglomerado urbano, calculado pelos municípios e freguesias;
      • criação de um Plano Nacional de Mobilidade Sustentável, com gestão descentralizada até ao nível das freguesias, onde o transporte colectivo, público, empresarial e comunitário deverá contar com claros incentivos e benefícios, relativamente ao transporte individual motorizado;
      • simplificação da administração da justiça e efectivo controlo democrático sobre o poder judicial;
      • criação de legislação clara sobre a defesa legítima de interesses, conflitos de interesses, incompatibilidades e tráfico de influências;
      • liberalização do contrato de trabalho individual, tendo em vista a sua competitividade relativamente à legislação europeia predominante, regras de transparência e justiça relativa para ambas as partes contratantes.
    4. A saída de Portugal do Sistema Monetário Europeu seria sempre uma medida extrema que a Comissão Europeia procurará evitar a todo o custo. Até porque colocaria imediatamente na mesa os problemas da Irlanda e da Grécia — já para não falar de Espanha, a quarta economia da União. Prevejo, pois, que Bruxelas e o BCE prefiram manobrar no sentido da remoção do entulho socratino da nossa governança, e da formação de uma coligação governamental de grande maioria, com um primeiro ministro do PS e um vice-primeiro ministro do PSD, capaz de simultaneamente levar a legislatura até ao fim, e de introduzir as correcção drásticas de que Portugal precisa para reganhar a confiança dos mercados financeiros, destroçada pelas sistemáticas mentiras e manobras evasivas dos piratas que tomaram de assalto o PS e o País.

    Última actualização: 14 novembro 2010; 10:49

    domingo, outubro 24, 2010

    O dilema

    Cortar nos vencimentos da Administração Pública, ou aumentar impostos?

    Que é preferível: baixar os vencimentos da Administração Pública, do sector empresarial do Estado, e das entidades e associações subsidiadas pelo Estado, em 30%, fazendo um ajustamento instantâneo da despesa ao estilo de vida que podemos suportar, ou aumentar os impostos, aumentando, por exemplo, o IVA, para 23%, 24% ou mesmo 25%?

    Em ambos os casos trata-se de substituir a desvalorização impossível da nossa moeda (o euro) pela diminuição instantânea do nosso poder de compra, e por conseguinte das importações, o que vem a dar em algo parecido.

    A diferença entre uma solução e outra é basicamente esta:
    1. como o sector privado ajusta continuamente os salários à procura de emprego (quanto mais esta cresce, mais os salários diminuem...), estes têm vindo a baixar paulatinamente de há uns anos a esta arte, e continuarão a descer, sendo já hoje claramente inferiores, em média, aos vencimentos pagos directa ou indirectamente pelo Estado, isto é, pelos impostos, taxas e outras cobranças por serviços públicos prestados...
    2. se nivelarmos os vencimentos da Administração Pública e entidades, organismos e associações dependentes do Orçamento de Estado, para valores próximos dos salários reais do sector privado, haverá uma mais justa distribuição da riqueza disponível, e dos sacrifícios, sendo que os funcionários públicos continuarão a gozar de vantagens comparativas face ao sector privado, nomeadamente no que toca a esse bem precioso e cada vez mais escasso, chamado estabilidade e durabilidade da relação de emprego;
    3. porém, se aumentarmos o IVA e outros impostos e taxas, seguindo uma espiral de pilhagem fiscal dos contribuintes, afectar-se-à de forma desigual os rendimentos individuais e familiares, além de tornar instantaneamente a economia portuguesa menos competitiva. Exportaremos menos, dezenas de milhar de empresas irão à falência (com o consequente aumento do desemprego duradouro), e a nossa dívida externa, em suma, continuará a crescer.
    Qualquer das soluções será dolorosa para os assalariados deste país, com particular incidência nas classes médias urbanas, cujo empobrecimento relativo se acentuará rapidamente. Continuar como estamos é, porém, impossível, pois os credores fecharam a torneira dos empréstimos. A possibilidade de uma suspensão de pagamentos por parte do Estado português é cada vez mais verosímil. Em que ficamos? Qual é a sua preferência?

    sexta-feira, outubro 01, 2010

    O que nos espera - 4

    O luto de Outubro

    No dia 5 de Outubro de 2010 comemora-se a terceira bancarrota de Portugal gerada por sistemas parlamentares populistas que em nada mudaram ao longo dos últimos 100 anos. Assassinaram a Monarquia, colocaram a Primeira República ao colo da uma Ditadura, e preparam-se agora para mergulhar Portugal numa espiral de empobrecimento e descalabro social sem precedentes. A corja não mudou nada desde Eça Queiroz!

    Há, porém, um pormenor que deve ser destacado desta vez:
    • quem levou Portugal à bancarrota? Foi o Partido Socialista;
    • quem começou a demolir de forma imparável o Estado Social? Foi o Partido Socialista;
    • quem permitiu a captura do Estado Português por organizações mafiosas de todas as cores e feitios? Foi o Partido Socialista;
    • quem transformou a Justiça Portuguesa numa anedota trágica? Foi o Partido Socialista.
    • quem instituiu a prática sistemática da falsificação de estatísticas e manipulação da imprensa? Foi o Partido Socialista.
    Tudo isto aconteceu nos últimos quinze anos, sendo desprezível o impacto que Durão Barroso e Santana Lopes tiveram na acelerada e irremediável degradação do regime. É, de facto, o Partido Socialista, pela mão de quem o desfigurou e dele abusou sem pudor, à boa maneira de uma autêntica Cosa Nostra, o principal responsável do colapso ontem finalmente reconhecido pelo boneco que lá colocaram na pose de primeiro-ministro, depois do ultimato mais do que óbvio lançado ao governo pela Comissão Europeia.

    As medidas anunciadas (1) foram vagas e deixaram de fora dois temas essenciais:
    • a diminuição do Estado paquidérmico, indolente, corporativo e corrupto que temos —há 13.740 entidades sem rosto que recebem silenciosamente centenas de milhões de euros dos nossos impostos todos os anos! (2);
    • e os grandes investimentos públicos associados ao Bloco Central do Betão e da Corrupção, com especial destaque para as criminosas Parcerias Público Privadas encavalitadas em verdadeiros desastres programados pelos piratas que há décadas saqueiam o país — tais como: a falência e posterior nacionalização fraudulentas do BPN, a tentativa de fazer um aeroporto desnecessário em Alcochete, a igualmente desnecessária e monstruosa Ponte Chelas-Barreiro, e as novas autoestradas, cujos contratos implicam uma sangria fiscal na ordem dos 2 mil milhões de euros anuais a partir de 2014 (ou seja, o mesmo que pagar anualmente aos concessionários o equivalente a duas Pontes Vasco da Gama!)
    Presume-se que o desalmado Teixeira dos Santos tenha ido a Bruxelas, na manhã seguinte à da conferência realizada no dia 29 de Setembro, trocar por miúdos as vacuidades, desta vez tristes, anunciadas pela criatura sem emenda que os portugueses por duas vezes elegeram primeiro-ministro (não se queixem!)

    Os floreados retóricos que decorreram hoje na Assembleia da República, no meio da mais grave crise de sempre das nossas finanças públicas, mostraram à saciedade que não temos parlamento, mas uma câmara corporativa e sindical dominada por professores (i.e. funcionários públicos) e advogados da corrupção. Na realidade, o parlamento português revelou-se não só um instrumento completamente inútil no regime democrático devolvido aos portugueses por um golpe de Estado militar, mas também um dos principais factores de irresponsabilidade política, compadrio por detrás das divergências televisivas, e egoísmo partidário. Se temos hoje uma democracia degenerada —e temos!—a causa desta triste realidade reside em boa parte no imprestável parlamento que temos vindo a eleger sem nos darmos conta de que criámos um monstro muito caro e patético.

    Temer por uma crise política nestas alturas do campeonato é como ter medo da chuva depois de uma carga-de-água tropical. O papão da crise política, alimentado pelas tríades e máfias instaladas, e papagueado pelos bonecos que se agitam sob o seu comando, não passa de mais uma maquinação mediática para impedir que se faça o que tem que ser feito: demitir o actual governo, e convocar eleições legislativas antecipadas, assim que o novo presidente da república tenha sido eleito.

    Como é também evidente, o maior aliado de José Sócrates, Aníbal Cavaco Silva —que ainda não explicou ao país porque meteu o senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado—, é parte inteira do problema político, e não da sua solução. Aliás, só poderá agravá-lo, se se recandidatar e for reeleito!

    Daí que Passos de Coelho, o actual líder do PSD, se quiser sobreviver politicamente, tenha que usar a "bomba atómica" que tem na mão. Isto é, anunciar duas coisas:
    1. que votará contra a proposta de orçamento do actual governo, na medida em que será mais um cheque sem provimento endossado aos portugueses, desta vez com demolição do Estado Social incluída, por um partido que é de facto o principal responsável pela bancarrota de Portugal;
    2. e que não apoiará a recandidatura de Cavaco Silva. Na realidade, bastará anunciar a primeira decisão para que o actual presidente, manifestamente incapaz de lidar com problemas pesados, desista de se candidatar a um segundo mandato.
    O PS, como bem se disse já, que aprove o orçamento de Estado com os partidos que vão juntar-se no apoio eleitoral a Manuel Alegre. Basta de hipocrisias!

    Por menos do que isto, teremos uma gangrena muito perigosa do regime.


    NOTAS
    1. O Governo apresentou as 19 medidas que pretende implementar para reduzir o défice deste ano e de 2011. Entre as 19 medidas apresentadas, 15 são do lado da despesa e as restantes quatro do lado da receita.

      Despesa

      1 – Reduzir os salários dos órgãos de soberania e da Administração Pública, incluindo institutos públicos, entidades reguladoras e empresas públicas. Esta redução é progressiva e abrangerá apenas as remunerações totais acima de 1500 euros/mês. Incidirá sobre o total de salários e todas as remunerações acessórias dos trabalhadores, independentemente da natureza do seu vínculo. Com a aplicação de um sistema progressivo de taxas de redução a partir daquele limiar, obter-se-á uma redução global de 5% nas remunerações;
      2 - Congelar as pensões;
      3 - Congelar as promoções e progressões na função pública;
      4 -Congelar as admissões e reduzir o número de contratados;
      5 - Reduzir as ajudas de custo, horas extraordinárias e acumulação de funções, eliminando a acumulação de vencimentos públicos com pensões do sistema público de aposentação;
      6 - Reduzir as despesas no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente com medicamentos e meios complementares de diagnóstico;
      7 - Reduzir os encargos da ADSE;
      8 - Reduzir em 20% as despesas com o Rendimento Social de Inserção;
      9 - Eliminar o aumento extraordinário de 25% do abono de família nos 1º e 2º escalões e eliminar os 4º e 5º escalões desta prestação;
      10 - Reduzir as transferências do Estado para o Ensino e sub-sectores da Administração: Autarquias e Regiões Autónomas, Serviços e Fundos Autónomos;
      11 - Reduzir as despesas no âmbito do Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC);
      12 - Reduzir as despesas com indemnizações compensatórias e subsídios às empresas;
      13 - Reduzir em 20% as despesas com a frota automóvel do Estado;
      14 - Extinguir/fundir organismos da Administração Pública directa e indirecta;
      15 - Reorganizar e racionalizar o Sector Empresarial do Estado reduzindo o número de entidades e o número de cargos dirigentes.

      Receita

      1 - Redução da despesa fiscal
      ·                     Revisão das deduções à colecta do IRS (já previsto no PEC);
      ·                     Revisão dos benefícios fiscais para pessoas colectivas;
      ·                     Convergência da tributação dos rendimentos da categoria H com regime de tributação da categoria A (já previsto no PEC);

      2 - Aumento da receita fiscal
      ·                     Aumento da taxa normal do IVA em 2pp.;
      ·                     Revisão das tabelas anexas ao Código do IVA;
      ·                     Imposição de uma contribuição ao sistema financeiro em linha com a iniciativa em curso no seio da União Europeia;

      3 - Aumento da receita contributiva
      ·                     Aumento em 1 pp da contribuição dos trabalhadores para a CGA, alinhando com a taxa de contribuição para a Segurança Social.
      ·                     Código contributivo (já previsto no PEC).
      4 - Aumento de outra receita não fiscal
      ·                     Revisão geral do sistema de taxas, multas e penalidades no sentido da actualização dos seus valores e do reforço da sua fundamentação jurídico-económica.
      ·                     Outras receitas não fiscais previsíveis resultantes de concessões várias: jogos, explorações hídricas e telecomunicações.
    2.  O estado português dá emprego efectivo a cerca de 700 mil funcionários públicos (i, 18-05-2010) e contrata a recibos verdes quase 5 mil prestadores de serviços (Económico, 24-08-2010). No entanto, a diminuição dos agentes efectivos e provisórios do Estado não se traduziu na eliminação de serviços inúteis ou redundantes, mas antes na sua contínua proliferação, embora disfarçada pela criação de empresas municipais e regionais de capitais 100% públicos, e pela contratação de prestações de serviços permanentes a empresas privadas, boa parte delas na órbita empresarial dos partidos!

    segunda-feira, setembro 27, 2010

    O que nos espera - 2

    A OCDE e o FMI não vêm aí... Os principais responsáveis pela bancarrota de Portugal é que berram p'ra que venham dizer alto e bom som o que a actual canalha partidária é incapaz de assumir: a verdade!



    De qualquer modo, o mexicano Angel Gurría, secretário-geral da OCDE, cozinhou o relatório com o actual governo, o que não pode deixar de ser simultaneamente uma vergonha e uma fonte de suspeita forte sobre a qualidade dos conselhos dados, ao sabor das conveniências dos situacionistas do regime. Espero bem que o Passos de Coelho resista às pressões e evite o seu prematuro suicídio político. É isso aliás que a rainha de Boliqueime e o Pinóquio das Beiras precisamente querem, mais as turmas, tríades, polvos e máfias que os rodeiam e levaram o país ao estado comatoso em que se encontra. Aliviar o país da carga chamada Aníbal Cavaco Silva e José Sócrates Pinto de Sousa, mais o poeta surdo-mudo que pretende ser presidente da república, é uma purga absolutamente imprescindível à regeneração do regime. Com a continuação deste bloco central do cinismo e da corrupção, no poder, Portugal afundar-se-à cada vez mais. E não vejo nenhum Salazar por aí!

    Um país sem orçamento e a duodécimos é como uma purga de emagrecimento de efeitos automáticos. Por outro lado, não é a crise política que afasta os mercados de Portugal. É o nosso escandaloso endividamento, a bandalheira político-partidária instalada, e a corrupção endémica que une como UHU empresários indolentes, cabotinos e corruptos a políticos igualmente preguiçosos, cabotinos e corruptos. Ora desfazer este nó górdio exige que alguém diga, de uma vez por todas, não à destruição do nosso país. Se não for o jota candidato a primeiro ministro, outro lhe sucederá certamente.

    Post scriptum — As medidas propostas pela OCDE nem seriam muito diferentes das que ontem mesmo aqui sugeri como inevitáveis, se fossem equilibradas, e por conseguinte previssem também cortes substanciais na despesa pública de investimento perdulário e corrupto, e a imposição de responsabilidades fiscais efectivas a quem, entre os mais ricos, nada ou pouco paga — como a banca falida que temos, ou os monopólios clientelares que dominam o país. Mas não, o senhor Gurría veio fazer um frete ao governo de Sócrates e à imensa tropa de piratas que o rodeia, colocando o fardo do pagamento das dívidas ao lombo dos mais pobre e dos mais fracos. É caso para lhe perguntar qual foi a comissão que recebeu para realizar tamanha sujeira?

    domingo, setembro 26, 2010

    O que nos espera

    Banca revela finalmente que está a caminho da falência, como o Estado e o resto do país.

    Fernando Ulrich, 13 de Setembro 2010 — "No curto prazo, e se os mercados de capitais continuarem fechados para os bancos portugueses, estes só têm duas vias para seguir a orientação do Banco de Portugal [diminuir a dependência do BCE]: vender activos (imóveis, acções, participações financeiras, obrigações); e reduzir a carteira de créditos [ou seja, a disponibilidade para emprestar dinheiro.]"

    Com os bancos portugueses falidos, os especuladores a fugir da dívida soberana portuguesa, e a portinhola do BCE prometendo fechar já no início de 2011, não nos restam muitas alternativas. Ou melhor, só resta um pacote de medidas drásticas, que aliás será imposto pelo BCE e por Bruxelas (e não pelo igualmente falido FMI): aumentar o IVA para 23% (em 2011) e para 25% (em 2012), aumentar o IRS nos escalões médios e elevados; criar um imposto visível sobre as fortunas e os bens de luxo; criar um imposto adicional sobre o CO2 produzido pelos automóveis; e, ao mesmo tempo, reduzir os vencimentos da Função Pública; eliminar umas centenas de organismos e departamentos públicos duplicados, inúteis e que apenas foram criados para satisfazer as clientelas partidárias; privatizar 30-40% do ensino superior; privatizar 20-30% da saúde; privatizar a TAP, a ANA e a CP; reduzir no prazo de um ano 50% o orçamento da RTP; diminuir para o limite inferior o número de deputados à Assembleia da República, e parte significativa dos seus privilégios indecorosos e injustificados (almoços, viagens e telecomunicações praticamente à borla); reformar o mapa autárquico, com a diminuição drástica do número de câmaras municipais e diminuição do número de freguesias nas cidades com mais de 10 mil habitantes (mantendo embora o número de freguesias rurais); e, por fim, aumentar a idade da reforma para os 68 anos. Isto ou muito parecido será o preço a pagar por todos nós se quisermos evitar uma expropriação do país pelos nossos credores.

    Quanto a Passos de Coelho, só pode fazer uma coisa se quiser sobreviver na corrida à próxima presidência do conselho de ministros: votar contra o orçamento do PS sem a menor hesitação, anunciando sem tibieza e desde já uma tal decisão. O PS, o Alegre, o Louçã e Jerónimo de Sousa que o aprovem! Pois não faz sentido fazerem o contrário, já que todos irão votar no poeta sonambulista.

    Prioridades de Portugal

    Os imbecis do Bloco Central, e os imbecis do Bloco de Esquerda, do PCP e do CDS, ainda não perceberam que temos apenas três prioridades estratégicas:
    • preservar e potenciar os nossos ecossistemas (máxima prioridade e poder absoluto ao Ministério do Ambiente);
    • ter uma estratégia de produção (agrícola, industrial e pós-industrial) simples, clara e inflexível, para o que será imprescindível forçar a reforma democrática das actuais corporações sindicais, profissionais e patronais (1);
    • e mudar radicalmente o paradigma de transportes e mobilidade (pondo os serviços em regime generalizado de tele-presença e tele-trabalho, as indústrias materiais em nichos de especialização manual —artística— e intelectual, e as mercadorias pesadas sobre carris e navios. Não precisamos de TGVs a andar a 300Km/h para coisa nenhuma! Não precisamos da Alta Velocidade ferroviária para transportar pessoas, salvo no eixo Lisboa-Madrid-Barcelona-Valência-Sevilha-etc. (2). Precisamos, sim, de refazer toda a nossa rede ferroviária para o transporte misto de pessoas e mercadorias (ou seja, para velocidades máximas de 250 Km/h), tendo em vista o grande projecto de interoperabilidade ferroviária e multi-modalidade que os burocratas bem pagos de Bruxelas já adquiriram como prioridade estratégica fundamental da União Europeia, tendo nomeadamente presente os impactos tremendos do pico petrolífero. O Novo Aeroporto da Ota em Alcochete não faz qualquer sentido quando é sabido que o transporte aéreo de massas está condenado. As empresas aéreas de Low Cost são o derradeiro paradigma de um sistema de transporte que em breve voltará a estar reservado aos endinheirados (Tires não pára de crescer!), pelo que é de prever que sejam estas mesmas empresas a gerir no futuro a grande rede europeia de transporte ferroviário (entre países, nos países, entre cidades, e dentro das cidades). Só a dependência corrupta dos nossos políticos, que se financiam nas empresas de construção e nos monopólios clientelares, pode explicar a sensibilidade interessada dos estados-maiores dos partidos aos argumentos da Mota-Engil e quejandos.
    O sinal de partida de uma reorientação estratégica desta envergadura terá que ser, naturalmente, um ataque sem precedentes ao estado burocrático e paquidérmico que a corrupta nomenclatura partidária criou para sua própria segurança, e uma verdadeira operação mãos limpas contra as tríades, máfias e polvos da corrupção endémica que ameaça endividar Portugal por todo o século 21!

    NOTAS
    1. Bastariam duas medidas para esta reforma democrática: limitar os mandatos de todos os cargos electivos a um máximo de 8 anos; e publicitação anual obrigatória, na Internet, dos relatórios e contas destas associações.
    2. A ligação Lisboa-Madrid (resto de Espanha) terá que ser uma linha mista para passageiros e mercadorias em bitola europeia e com sistemas de alimentação eléctrica e sinalização idênticos aos da Espanha, que por sua vez terão que ser idênticos aos franceses, alemães, austríacos, checos, polacos, e por aí adiante. A vigarice, imposta ao actual governo pela Mota-Engil, e protagonizada pelo moço de fretes António Mendoza, de construir uma nova linha exclusiva —recorrendo à moribunda bitola ibérica— entre Sines e Badajoz, ou mais exactamente, entre Évora e Caia (criando desta forma mais um pequeno monopólio despesista e improdutivo para o senhor Mota e o senhor Coelho), tem que ser travada imediatamente e denunciada como mais um verdadeiro acto de corrupção do Estado (ver a denúncia do PSD na AR). A linha Lisboa-Madrid tem, isso sim, que ser uma linha mista, para passageiros e mercadorias, por uma óbvia razão de racionalidade económica e estratégica. Por outro lado, esta linha não precisa, para já, de cruzar o rio Tejo sobre uma nova ponte desnecessária. Esta é aliás outra grande obra planeada com os pés, única e exclusivamente destinada a alimentar as empresas clientelares e corruptas do regime. A prova está no facto de a anulação do concurso da TTT, ganho por um consórcio liderado por espanhóis, ter sido uma exigência da Mota-Engil e do senhor Coelho. O mentiroso ministro das obras públicas deveria ser levado ao banco dos réus por toda esta embrulhada de tráfico de influências. Finalmente, se o futuro aeroporto de Lisboa poderá um dia, se for justificado, ir para Rio frio ou Alcochete, porque carga de água o Pinhal Novo é menos digno para acolher a ligação Lisboa-Madrid de Alta Velocidade?! Chegado à moderna e entretanto ampliada estação ferroviária do Pinhal Novo, o AVE, ou LAVE (enfim, o Transiberiano), enquanto despeja umas dezenas largas de passageiros, adapta os seus rodados para a linha mais larga que corre sobre a Ponte 25 de Abril, e lá arranca, depois de uma paragem de 15mn (ou até menos), até à nova Estação Central de Lisboa, nos antigos terrenos da Feira Popular. Nada mais simples, directo, tecnologicamente evidente, e economicamente racional.

    quinta-feira, julho 29, 2010

    Stress tests: uma prova falsificada

    The Triumph of the Financial World's Lobbyists

    By Hans-Jürgen Schlamp in Brussels

    [...] As things currently stand, Greece, Ireland, Portugal and several other countries are so deeply indebted that it is difficult to even imagine how they could ever emerge from their debt spiral. The more public revenues they are forced to divert to paying off the interest on their loans, the less they have to pay for schools, streets, soldiers and social services - which in turn forces them to take on more debt. It is no longer unthinkable that an EU member state might go bankrupt. — Spiegel Online.

    A prova de esforço do euro foi uma monumental mistificação.

    Desde logo porque os bancos cobram juros usurários nos poucos empréstimos que "concedem", nomeadamente aos governos, com dinheiro público que lhes é emprestado pelo BCE!

    Pagam por este dinheitro público, largamente virtual, e por conseguinte inflacionista, 1,75%, tendo estado a inflação de Junho a 1,40%. Ou seja, recebem dinheiro praticamente gratuito dos bolsos dos contribuintes para posteriormente o emprestarem aos governos e aos mesmos contribuintes com juros usurários. Ou seja, estamos na presença de um dos maiores esbulhos de riqueza privada e pública de que há memória — em nome da salvação do nosso querido sistema financeiro.

    Quando alguém se atrasa no pagamento de um empréstimo, por exemplo sobre uma conta-ordenado, os juros de mora chegam a ultrapassar os 26%! É esta a explicação mais verosímil para os famosos lucros bancários em tempo de crise.

    Acontece, porém, que a espiral do endividamento soberano em boa parte dos países ocidentais vai dar como resultado, provavelmente já em 2011 ou 2012, a novo e mais catastrófico colapso financeiro, seguido de um agravamento da crise actual, a qual terá apenas algumas melhoras ligeiras nesta fase de alívio artificial.

    As minhas recomendações continuam pois a ser as mesmas desde 2007: fujam das dívidas a todo o custo, invistam em propriedades agrícolas com solos em bom estado, comprem ouro, deixem as periferias desprovidas de transportes públicos,  aproximem-se dos centros urbanos e, finalmente, participem activamente em redes profissionais e grupos de interesses específicos cujos assuntos dominem ou queiram conhecer melhor: energia, alimentação, transportes, voluntariado e solidariedade.

    sexta-feira, abril 30, 2010

    Portugal 186

    I love this girl!

    Actualmente, 74% da dívida pública portuguesa é detida por não-residentes; mas, nem sempre foi assim. Pergunta-se: se os portugueses (que podem) não compram dívida pública portuguesa, porque hão-de comprá-la os estrangeiros? — Cristina Casalinho, Jornal de Negócios Online.

    Cristina Casalinho escreveu com a precisão e elegância que a caracteriza o que aqui temos escrito e rescrito há uns meses a esta parte. Parabéns!

    Aqui vão os pontos de vista coincidentes:
    1. A dívida pública portuguesa deixou de ser controlada por nós, e quem detêm 75% ou mais da dita, não vai deixar de exigir o seu pagamento a tempo e horas, e com juros e prémios de risco ajustados a uma nova e mais minuciosa percepção do estado calamitoso da nossa economia e das nossas finanças públicas; a bolha das dívidas soberanas rebentou, reparar os imensos estragos vai ser tarefa árdua, para toda uma década, e os elos mais fracos da cadeia especulativa mundial serão os primeiros a partir;
    2. Finalmente começou a falar-se de Dívida Externa Bruta, em vez da ficção do Banco de Portugal
. A dita "posição externa líquida", ou "dívida externa", como costumam chamar-lhe erradamente os nossos sempre aluados economistas mediáticos, é uma falácia, pois se os angolanos não pagarem às nossas empresas, a nossa dívida aos alemães não desaparece por milagre! Alertámos vezes sem conta, nos últimos três anos, para o facto de as referências mediáticas que insistiam invariavelmente no défice público, esquecendo sempre o problema da Dívida Externa, ser o erro mais crasso da avaliação "profissional" e "política" da nossa real situação económico-financeira;
    3. A subida do IVA é inevitável e já deveria ter ocorrido. Os suecos pagam 25% —pagam mesmo—, e não se queixam; antes pelo contrário, gozam de uma excelente rede de segurança social, que precisamente revela todo o seu potencial positivo em crises agudas como a actual;
    4.  O nosso Estado engordou devido ao eleitoralismo, incompetência, endogamia e corrupção da nomenclatura partidária que há 35 anos despedaça a poupança portuguesa conseguida à paulada pela ditadura. E agora? Será que os idiotas da actual democracia ainda acreditam que esta pode sobreviver sem poupança interna? Ainda defenderão a aberração teórica (a la Keynes) do crescimento do PIB pela via prioritária e sem portagem do consumo? Acham os distintos professores de economia (que infelizmente não estudam História) que os portugueses podem continuar a encomendar Mercedes, BMWs e Audis, brincar nas praias de Cancun, e encher os Shoppings do Belmiro, à custa da poupança alheia, nomeadamente chinesa e alemã? Pois não — não podem!

      A solução aqui proposta há mais de dois meses, e agora elegantemente sugerida por Cristina Casalinho —transformar os subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos (ou pelo menos, parte destes subsídios) em certificados de aforro, durante alguns anos (até 2014, ou mesmo 2015)— seria uma medida justa e proporcionada, atendendo nomeadamente ao facto de que têm sido até agora os trabalhadores do sector privado que têm suportado o grosso da crise — seja porque perderam e perdem todos os dias os seus empregos (e casas!), seja porque vêm renegociadas as suas condições de trabalho de forma prepotente e humilhante (chegando a perder mais de metade dos honorários, ou em opção, permitindo que o seu posto vá parar a alguém mais jovem ou financeiramente desesperado, como sucedeu recentemente no Museu de Serralves — um exemplo que me foi relatado há algumas semanas atrás.)
    Faltou a Cristina Casalinho acrescentar a importância de controlar também os prémios dos altos executivos das grandes empresas, e uma mais agressiva taxação dos dividendos e dos lucros. Os primeiros devem ser sujeitos a um plafond imposto pelo Estado, e a segunda deve ser imposta onde não exista, e aumentada onde já exista. Só assim haverá equidade na Política. Mas devo aceitar que seria exigir demais de uma jovem e distinta economista ao serviço do BPI.


    POST SCRIPTUM — Não percebo porque nem o PCP, nem o Bloco, querem discutir a sério como vão os funcionários públicos portugueses partilhar parte do custo da actual crise financeira.

    Transformar, por exemplo, 50% dos subsídios de férias e de Natal de 2010, 2011, 2012 e 2013 em certificados de aforro, com maturidades de 3 anos, seria ou não mais inteligente, mais solidário e menos gravoso, do que recusar toda e qualquer medida viável, em nome da mais sórdida demagogia eleitoralista, tendo como consequência inevitável a continuação do ataque actualmente em curso e irreversível aos benefícios sociais adquiridos?

    O ataque sem precedentes que neste momento o governo de piratas do Bloco Central desencadeou contra os trabalhadores desempregados (que raramente são funcionários públicos) e contra os reformados é também da responsabilidade conivente do PCP e do dito Bloco de Esquerda. Não tentem, pois, fingir que não contribuem para este problema. Sois igualmente responsáveis!

    Tal como os partidos do Bloco Central, também o PCP e o BE olham apenas para o peso eleitoral do funcionalismo público, do onde aliás, em boa medida, provêem!


    OAM 693—30 Abril 2010 19:13