quinta-feira, abril 12, 2012

Em 2015...

De 1999 para cá foi sempre a descer!

Portugal GDP, 1989-2012 (source: Eurostat)
Portugal GDP, 1989-2012 (source: Eurostat)

por ANTÓNIO CERVEIRA PINTO
Originalmente publicado no blogue do Novo Partido Democrata.

As causas da crise financeira mundial em curso desde 2006-2008 vão desde a ganância especulativa, ao declinar do modelo energético baseado no petróleo, passando pelo estabelecimento da nova divisão internacional do trabalho resultante dos processos de descolonização e pelo impacto crescente das tecnologias de substituição do capital humano, ou ainda pela escassez relativa de recursos naturais. Mas Portugal sofre, para além dos efeitos desta profunda crise global, uma crise própria que se agravou com o colapso de uma ditadura de quase quatro décadas e a correspondente perda do que ainda lhe restava de um vasto e centenário império colonial.

Dos três mais recentes programas de resgate financeiro da nossa economia (1977, 1983 e 2011), o primeiro (1997) deu lugar a uma recuperação efémera da taxa de crescimento do PIB (1977-79), seguindo-se um declínio até ao resgate de 1983, do qual sairia novo período de recuperação, desta vez mais mais longo e mais acentuado (1985-90). Este período de convergência com a União Europeia voltaria a decair até 1993. Entre 1994 e 1998 dá-se nova melhoria das taxas de crescimento, mas a partir de 1999 e até hoje nem com a entrada de Portugal na zona euro (2002) se evitou a trajectória descendente do nosso PIB (PORDATA).

Portugal cresceu em média 6,9% entre 1960 e 1973. No entanto, depois de 1974, se não fossem os sucessivos resgates patrocinados por entidades externas o nosso país já teria sido forçado a declarar bancarrota. A última vez que tal aconteceu foi em 1891, sessenta e seis anos depois da independência do Brasil, e sessenta anos depois de uma guerra civil. Muito claramente, a sustentabilidade económica, social e financeira do Portugal pós-colonial não foi ainda, nem discutida, nem conseguida. E enquanto não discutirmos as causas, sem romantismo rural, nem pedantismo literário pequeno-burguês, enquanto, por outro lado, não mudarmos as bases inertes da nossa sociedade conservadora, invejosa, sempre à rasca, aldrabando o dia-à-dia, e irresponsável, continuaremos ciclicamente à beira do precipício — jogando obsessivamente em todas as lotarias, pessimistas, deprimidos, ou mesmo atraídos pelo suicídio.

Entre 1415 e 2015, ou seja, durante seiscentos anos, Portugal esteve, por assim dizer, encerrado numa bolha de sustentabilidade económica, social e financeira que entretanto se foi esvaziando. Assim como na última guerra civil (1828-1834) se importaram modelos doutrinários largamente estranhos à matéria histórica da cisão interna do país, deles resultando catadupas de equívocos e destruições em pura perda, também desde a queda da ditadura de Salazar, em 1974, que não fazemos outra coisa que não seja decalcar em formato caricatural as antinomias ideológicas das revoluções industriais que por cá não passaram se não no plano das literaturas libertárias —socialistas utópicas e marxistas. Uma análise atenta dos debates parlamentares e das formas de comunicação mediática dos políticos e governantes revela de modo quase deprimente a distância que permanece entre os problemas intrínsecos da nossa adiada metamorfose e a eloquência do vazio e das falsas metáforas; uma distância que tem vindo a aumentar como nunca, entre o povo contribuinte, incluindo as classes médias ameaçadas, e a nomenclatura deste regime insolvente, com os seus proverbiais e desvairados cortesãos e cortesãs.

O declínio está bem à vista, quer no gráfico do Eurostat sobre a evolução do PIB português entre 1989 e 2012, quer nos gráficos mais detalhados da PORDATA. Inverter o sentido desta decadência a caminho do nada vai seguramente exigir uma revolução. Não basta a indignação, precisamos mesmo de refundar a nossa identidade numa nova ordem cultural e política. Com ou sem partidos, mas aprofundando o legado democrático, por mais desfeito que agora esteja.

Falta saber quando e como se poderá realizar a inadiável metamorfose do regime demo-populista que nos conduziu a uma ruína sem fim à vista, e sobretudo sem qualquer quadro de esperança sábia e realisticamente desenhado. Seria um milagre se a solução nascesse nos antros que trouxeram Portugal até à bancarrota iminente. Nos casos igualmente gravíssimos que antecederam a presente crise de endividamento estrutural, Portugal viu cair de forma sangrenta uma monarquia com centenas de anos, e depois viu substituir um regime republicano caceteiro e corrupto até à medula por uma ditadura militar seguida de uma ditadura de burocratas e corporações. Que nos espera desta vez?


Portugal - impact of Different Growth Assumptions on Debt-to-GDP (source: Citi Investment Research and Analysis)
Portugal - impact of Different Growth Assumptions on Debt-to-GDP
(source: Citi Investment Research and Analysis)

Portugal: Oro on the Douro
By Walter Molano (EconoMonitor)

“One of the main reasons for the country’s capacity to adjust quickly is its degree of openness. Portugal’s trade (exports + imports) represent 50% of the country’s total output. This is in contrast to Spain, where trade represents only 35%. Ireland’s trade is 78% of GDP, and Germany’s is 64%. Greece is a dismal 25% of GDP. The problem is that the state plays a larger role in closed economies, which aggravates the vicious cycle produced by fiscal adjustments. At the same time, the state plays a reduced roll in smaller open economies, which allows the private sector to adjust more quickly to changes in macroeconomic conditions. This has certainly been the case in Ireland, and it is proving to be true in Portugal.”

Sem crescimento sustentado, isto é, vertebrado por um estado, uma sociedade, uma economia, um sistema financeiro e uma cultura renovados de uma ponta à outra, dando precedência ao conhecimento, à responsabilidade, à juventude e à transparência, não conseguiremos sair da órbita de empobrecimento fatal em que nos encontramos.

O gráfico recentemente publicado por Jürgen Michels num estudo que realizou para o Citi Research and Analyis, citado por Edward Hugh no seu já famoso artigo Portugal Gradually Shuffles Its Way Towards the Front of the Debt Queue, revela um dado crítico da maior importância: sem um crescimento real e constante durante os próximos oito anos, o nosso já impagável endividamento público e privado continuará a inchar! Na realidade, só crescendo de modo sustentado a taxas variáveis acima dos 2%, e de preferência acima dos 3%, poderemos esperar sair do buraco em que estamos.

Repare-se que desde 1974 todos os períodos de crescimento e da chamada convergência com a média dos rendimentos per capita da União Europeia se ficou a dever, de uma maneira ou doutra, a gigantescas entradas de investimento subsidiado, ou especulativo, no nosso país, ou no pior dos casos, como durante o desgraçado consulado do socialista caviar José Sócrates, a um endividamento criminoso.

Sem crescimento, isto é, só com austeridade, não é possível atacar consistentemente o problema do sobre endividamento. Mas por outro lado, crescer com base apenas no endividamento público e privado deixou de ser opção. Um dilema difícil de atacar!

A aposta nas exportações tem as suas próprias limitações, mas é uma das saídas para este dilema, que não dispensa uma racional e rápida redefinição das responsabilidades e atribuições do Estado. Será até uma boa escapatória se conseguirmos por esta via diversificar rapidamente os destinatários dos nossos bens e serviços (cuja qualidade precisa de aumentar de modo intensivo e programado), dando preferência aos países que, para além da Europa, melhor conhecemos e com quem temos mais afinidades linguísticas, culturais e históricas: Brasil, Angola, Moçambique, Guiné e Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique, Timor, China, Índia, Japão, Estados Unidos, Marrocos, Líbia, Iraque, Emiratos, etc.

Mas para potenciar de modo estratégico as nossas exportações será necessário preparar o país para semelhante esforço, desde logo transformando-o, de norte a sul, numa verdadeira plataforma logística e de mobilidade facilitada e rápida para pessoas e mercadorias. As bases deste desiderato já existem e são boas. Mas falta dar-lhes maior liberdade operacional, interligações inteligentes, flexibilidade empresarial e capacidade de internacionalização. Tudo isto deve começar pela desburocratização e despartidarização das suas cadeias de valor!

Em breve saberemos se os independentes da coligação governamental no poder conseguiram ou não conter dentro de limites razoáveis o abuso de confiança típico dos rendeiros do regime. Em breve saberemos até que ponto o PS e o PSD estão ou não preparados para sofrerem as necessárias metamorfoses, sem as quais permanecerão como entraves ao necessário renascimento da nossa democracia.

A crise vai agravar-se durante o que resta deste ano...

Se em vez de respostas positivas apenas continuarmos a ser confrontados com mais fugas em frente e improvisos, então estarão criadas as condições para lançarmos um grande debate nacional sobre o futuro da democracia portuguesa — com uma certeza: sem classes médias não há democracia. Só os ricos e os pobres conseguem viver sob ditadura — os primeiros, com mais conforto ainda do que aquele que a democracia lhes permite generosamente, os segundos, vendo piorar o que apesar de tudo foram conseguindo conquistar a partir das plataformas reivindicativas inerentes às democracias, por piores que sejam.

A democracia portuguesa está muito doente, mas só tem uma cura possível pela frente: mais democracia e mais liberdade!

sexta-feira, março 30, 2012

Iberia Express ou TAP'EX?

Foto do Dakota DC-4 CS-TDF da TAP, comandado pelo Comandante Manuel Maria Rocha e co-piloto Roger d'Avelar, na sua partida de Lisboa a 24 de Março de 1946 pelas 14 horas. O trajecto definido foi : Lisboa-Casablanca-Bolama-Lagos-Liberville-Luanda-Lusaka-Lourenço Marques. A bordo seguiram , além de outros, um telegrafista, mecânico de bordo, o navegador e o meteorologista. Após 11.405 Kms e 45 horas e 20 minutos de vôo com 6 escalas, chegou ao aeroporto de Mavalane em Lourenço Marques no dia 1 de Abril de 1946, pelas 13 horas e 50 minutos. Ou seja, uma semana. THE DELAGOA BAY BLOG

Iberia Express, já está! E agora TAP?

Há muito que a blogosfera informada sobre transporte aéreo recomenda um spin off da TAP antes da privatização, sob pena de esta vir a ser um não evento e uma monumental barraca político-partidária — pois nem os governos PS e PSD-CDS/PP, nem nenhum partido parlamentar, até hoje, encarou o problema TAP de frente :(

A TAP tem gente a mais quando olhamos para evolução recente deste serviço, e sobretudo deste negócio.

A TAP alberga no grupo negócios ruinosos (ex: TAP Maintenance & Engineering, ex-VEM) que não fazem parte do core business da empresa e que têm vindo a chupar literalmente os lucros das operações intercontinentais e em geral do chamado hub aeroportuário português (basicamente um mini hub sediado na Portela e no aeroporto Sá Carneiro, que gere um importante fluxo de passageiros entre o Brasil e a Europa).

A TAP há muito que também perde dinheiro nas ligações europeias ponto-a-ponto, tendo a administração de Fernando Pinto/Michael Connolly (administrador financeiro) apostado estupidamente na ocupação em pura perda de dezenas de slots com o único objetivo de atrasar o inevitável: a chegada em força das companhias de baixo custo a Portugal!

A TAP martela as suas contas sistematicamente. Fê-lo outra vez este ano ao apresentar lucros de um único segmento da TAP como se fosse todo o grupo, onde obviamente se registaram prejuízos! Como pode uma companhia dar lucro e ser interessante para eventuais privados (de momento só existem duas empresas públicas interessadas em comprar o filet mignon da TAP: Iberia-British Airways) quando tem uma dívida acumulada de mais de 2,4 mil milhões de euros — o suficiente para mandar construir duas pontes Vasco da Gama?!

Como a blogosfera tem proposto, primeiro é necessário encarregar uma consultora internacional credível para desenhar um spin off inteligente da TAP, e só depois iniciar um processo de privatização a sério, e não mais uma entrega ao desbarato de uma empresa estratégica a outro país (no caso, a dois: Inglaterra e Espanha!)

A blogosfera adiantou há mais de dois anos a ideia de libertar a TAP das suas gorduras desnecessárias e de, ao mesmo tempo, criar dentro do grupo duas (chegou a propor-se três) companhias: uma TAP LOW COST e uma TAP INTERCONTINENTAL, assegurando deste modo a permanência do seu mini hub atlântico em Portugal, e entrando no jogo altamente competitivo das companhias de baixo custo.

O aparecimento da Iberia Express mostra o que poderá acontecer à TAP se for o contabilista-mor do reino (Vítor Gaspar) a decidir: 4000 despedimentos e a entrega dos aviões da TAP (em leasing), e sobretudo os slots, à Iberia Express !!!

Para a IAG (Iberia + British Airways) a TAP só poderá interessar por um motivo, aliás importante: alargar a presença que já tem no Atlântico norte para o Atlântico sul.

O hub da TAP até poderia continuar em Lisboa, só que já não seria da TAP, mas da IAG. E quanto ao resto é simples: despedir, vender e enfiar o que sobrar na Iberia Express!

Mas também pode acontecer o pior: tudo para Madrid e Barcelona! Portela e Sá Carneiro passariam à categoria de aeroportos regionais de baixo custo — e nada mais :(

quarta-feira, março 28, 2012

Mais impostos, não!

Manif. "Geração à Rasca", 12 março 2011
Foto: ©OAM

Impostos menos pesados, mais transparentes e melhor aplicados, e menos burocracia, são vias mais decisivas para gerar novos empregos, do que despejar dinheiro sobre os problemas —por exemplo, disfarçando o desemprego com formações fictícias, ou atirando os jovens contra o emprego sénior.

por ANTÓNIO CERVEIRA PINTO

Precisamos de diminuir drasticamente a complexidade e os custos de contexto da atividade económica, começando por uma diminuição dos encargos, e pela simplificação de processos inerentes aos inícios de atividade profissional e empresarial dos jovens.

Num artigo recente de Tyler Durden (ZeroHedge) é colocada uma hipótese extraordinária sobre a provável causa de tanto desemprego, falta de emprego e perda de rendimentos médios entre os jovens americanos. Resumindo, a causa deste bloqueio seria o bem-estar acumulado e excessivamente protegido dos baby boomers, uma geração nascida sensivelmente entre 1946 e 1954-56, que protagonizou algumas das batalhas mais entusiásticas do século 20, contra a guerra, contra o colonialismo e o racismo, pelos direitos das minorias, e por uma redistribuição fiscal da riqueza por forma a promover e garantir a existência de uma sociedade de bem-estar mais justa e mais livre do que todas as que a antecederam.

O resultado de todo este entusiasmo e generosidade ideológica, que os filmes Easy Ryder, American Graffiti e The Big Chill tão bem retratam, foram sociedades de consumo cada vez mais egocêntricas e endividadas, de onde a juventude (sobre-explorada) tem vindo a ser paradoxalmente excluída.
Em 1984, na América, o rendimento líquido médio anual dos  jovens com trinta e cinco anos ou menos era de aproximadamente de 11.500 dólares. Já as pessoas com sessenta cinco anos ou mais recebiam anualmente e em média algo mais do que 120 mil dólares. Em 2009, porém, a situação encontrava-se completamente deteriorada: os jovens até trinta e cinco anos ganhavam anualmente e em média 3.662 dólares, enquanto as gerações com mais de sessenta e cinco anos recebiam anualmente e em média  mais de 170 mil dólares. Desconheço a situação na Europa e em Portugal, mas desconfio que não andará muito longe desta calamidade — atendendo à evolução no mesmo sentido do desemprego jovem.

Dollar figures adjusted for inflation, into 2010 dollars; Source: PEW RESEARCH CENTER

Keynesians may say that this reflects a government’s failure to create jobs for young people. They claim that the problem is that there is not enough money circulating in the economy, and that government can “raise demand” by pumping out more cash. But there is plenty of money in the economy; so much money that Apple have built up a $90 billion cash pile. So much that China has built up a $3 trillion cash pile. So much that banks are holding $1.6 trillion in excess reserves below fractional lending requirements.

More likely is the reality that overregulation and barriers to entry preventing the unemployed from picking up the slack in the jobs market. As John Stossel reveals in a recent documentary film,  in New York City it costs $1 million to get a licence to drive a taxi. Anyone who wishes to operate a food cart, or run a lemonade stand has to traverse reams of bureaucracy, acquire health and safety certificates, and often pay huge fees  to receive the “necessary” accreditation. While some barriers to entry are necessary (e.g. in medicine), in other fields it is just an unnecessary restraint on useful economic activity. In many American cities it is now illegal even to feed the homeless without government certification and approval. Citizens who defy these regulations face fines, arrest, and even imprisonment.
The Chart of The Decade, by Tyler Durden.

Não é deitando mais dinheiro virtual sobre a economia estagnada, nem aumentando as dívidas dos governos, das empresas e das pessoas, nem é sobretudo elegendo bodes expiatórios (neste caso, os baby boomers), que evitaremos o agravamento em curso da situação. Terá que haver outra maneira e outras soluções!

Ao longo dos últimos duzentos anos as populações fugiram dos campos para as fábricas e cidades. Depois procuraram ver-se livres das cadeias industriais, exportando-as para os países mais pobres e menos democráticos, dedicando-se a trabalhos mais leves e aumentando progressivamente o tempo disponível para o prazer e, do ponto de vista da economia, para a criação de serviços e o consumo.
O esquema começou a romper-se à medida que a divisão internacional do trabalho deu lugar a uma deterioração crescente das balanças comerciais das antigas potências coloniais, seja porque começaram a importar cada vez mais energia e bens transaccionáveis, seja porque foram exportando indústrias e cadeias de valor inteiras para outras partes do mundo, com as quais estabeleceram acordos de livre circulação de mercadorias e de investimentos. Esta situação acabaria por revelar-se insustentável, não tanto pelo lado dos investidores e especuladores, que continuaram a poder acumular legalmente mais-valias de todo o género, e ainda lucros excessivos, mas sobretudo pelo lado das pessoas e dos seus governos — que foram sendo paulatinamente expropriados!
A situação a que o mundo chegou não poderá continuar como está por muito mais tempo. Se nada for feito, de radical e criativo, o colapso das economias e das sociedades, com o consequente retrocesso civilizacional e cultural dos povos, será tão certo quanto trágico. Quanto tempo mais poderemos esperar antes de agirmos contra este desastre anunciado?

Atacar o gravíssimo problema do desemprego e da falta de emprego entre os jovens com menos de trinta e cinco anos é uma prioridade absoluta, que tem que ser levada a sério por todas as forças políticas e sociais, com o apoio da inteligência criativa das universidades, dos gabinetes técnicos governamentais e de novas instâncias de poder democrático deliberativo — que não existem e que devem ser criadas desde já. Para este lado da democracia deveria caminhar a reforma autárquica do país, o que não tem sido o caso, prisioneira que está da inércia burocrática e dos privilégios de quem domina institucionalmente boa parte do país.

É preciso criar um período e carência fiscal para todos os jovens que se iniciam nas suas profissões, ou que começam uma empresa. Estarão os partidos que temos, dispostos a discutir esta proposta?


NOTA: este texto foi originalmente publicado no blogue do Novo Partido Democrata (NPD)

quinta-feira, março 22, 2012

A corja do aeroporto

Enquanto os cachorros da SIC, de São Bento e de Belém ladram, a caravana passa...

O que a corja que já meteu este governo no bolso quer é trocar o combóio (coisa popular horrenda!) pelo embuste da Ota em Alcochete. Assim teriam mais betão pela frente, na Alta de Lisboa/Portela e em Alcochete. Imagino que terão o apoio do PCP!

Bruselas quiere que todas las infraestructuras incluidas en la red básica, incluidos el Corredor Mediterráneo y el Atlántico, estén completadas en 2030. Para ello, ha propuesto movilizar 32.000 millones de euros del presupuesto comunitario durante el periodo 2014-2020. Con estos fondos se costeará entre el 20% y el 40% de los proyectos, especialmente los tramos transfronterizos — in RTVE.es.

A Espanha é o maior credor de Portugal. Depois vêm a Alemanha e a França (ver gráfico do New York Times). Qualquer destes três grandes países aposta numa Rede Europeia de Transportes, com "TGV"!

Percebe-se, pois, que França e Espanha tenham respondido imediatamente ao caricato governo português, explicando-lhe diplomaticamente que uma rede ferroviária europeia não depende apenas dos apetites e humores de um qualquer mordomo lusitano, chame-se ele Passos de Coelho, Gaspacho ou Cavaco!

O governo português, se seguisse literalmente as palavras tontas do atual primeiro ministro, teria que indemnizar, não apenas o consórcio Elos, mas também todo o investimento espanhol já realizado na ligação AV Madrid-Lisboa!

Além do mais, Portugal perderia não só os fundos comunitários já atribuídos à ligação Poceirão-Caia, como perderia sobretudo toda e qualquer credibilidade em futuras candidaturas a programas de apoio comunitário. A rede Barroso é como se sabe temporária, e os povos têm memória!

Basta reparar como todos os cães de fila do embuste da Ota em Alcochete regurgitam esta noite baboseiras triunfais sobre o suposto nado-morto, para notarmos mais uma vez como este país continua no bolso dos ladrões e criminosos que o levaram à bancarrota!

Em conferência de imprensa no final de uma reunião dos ministros dos Transportes da União Europeia, dedicada precisamente à rede transeuropeia de transportes, a ministra espanhola Ana Pastor afirmou, ainda assim, estar "tranquilizada" com a garantia que recebeu hoje do ministro da Economia português, Álvaro Santos Pereira, de que Portugal vai adoptar a bitola europeia nas ligações ferroviárias alternativas ao projecto de alta velocidade, que decidiu na quarta-feira abandonar definitivamente.

No entanto, apontou, o governo espanhol, bem como as autoridades francesas, querem saber precisamente quais as intenções de Portugal, já que têm implicações no "corredor sul" da rede transeuropeia de transportes — in Jornal de Negócios/Lusa, 22 Março 2012 | 16:15

O Tribunal de Contas é um tribunal faz de conta, ou seja um embuste político-partidário execrável. Como tal deveria ser extinto. É mais uma das muitas excrescências burocráticas deste regime demo-populista e corrupto até à medula. Querem poupanças? Comecem por aqui!


POST SCRIPTUM

Deixo à consideração do leitor um comentário OTR, de uma toupeira amiga.... cuja qualidade das informações respeito.
“O contrato do Poceirão-Caia era ruinoso - com uma TIR sem risco de 12% - e foi bom o TC tê-lo chumbado. Para além disso, como sabes, estava atrelado a um projecto estúpido (sem ligação a Sines e com aquela terceira linha parva).

Sei, por experiência, que a "renegociação" / alteração do projecto e das cláusulas financeiras do contrato não podia dar bom resultado. Para além disso, era uma operação ilegal e violadora do direito de concorrência.

Lê, com atenção, o acórdão do TC: pagar 300 M à Elos é, apenas, fruto da ignorância dos jornalistas.

E lê, com atenção, o comunicado do ME: está lá a linha que sempre defendemos.

O paleio do comunicado contra a "alta velocidade" é política. O PPC, sem saber, atirou-se ao TGV e agora tem de lhe chamar outra coisa. Por mim, que se lixe.

Eu não faço futurologia, nem passo cheques em branco. Mas este passo era crítico e imprescindível.

Falta agora influenciar o novo projecto e cuidar que ele não se perca. Mas chorar por aquele contrato não me parece boa ideia.”
 Os argumentos aqui expostos são sólidos e merecem reflexão. Ficam, porém, duas perplexidades no ar:
  • A quem se deve o sincronismo da divulgação do relatório do TC com a ida do ASP a Bruxelas, precisamente para participar numa reunião decisiva sobre as redes ferroviárias de Alta Velocidade no âmbito do PET?
  • Havendo novo concurso para um novo caderno de encargos, expurgado das incongruências e despesismo tolo do anterior projeto cor-de-rosa (dupla estação em Évora —certamente desenhada por um Pritsker Prize!—, terceira via, etc.) compromete ou não o uso das verbas comunitárias já atribuídas?
Uma coisa é certa: o fim definitivo do "TGV" é o fim definitivo de uma enteléquia, ou seja, de algo que nunca existiu, nem está escrito em nenhum documento oficial: o "TGV"!


ÚLTIMA HORA!
Portugal da la patada definitiva a Florentino Pérez por el AVE a Lisboa

...lo peor para el país, quizás, será la pérdida de imagen de cara a la inversión extranjera. Será difícil justificar internacionalmente que la adjudicación del concurso del AVE a Elos sea declarada "ilegal" dos años después de la firma del contrato, cuando el consorcio llevaba ya invertidos casi 300 millones de euros.  CapitalMadrid.

Que as ratazanas da cloaca lusitana não descansem enquanto não puserem o país mais de rastos do que já está, em nome exclusivo das suas rendas e ganâncias, rasgando contratos e compromissos de estado reiteradamente subscritos com outros países e com a UE, percebe-se, dada a natureza das alimárias. O que não entendo é a sonolência bovina dos eleitores do meu país. Acordem!

"O Governo espanhol vai continuar a construir a sua linha de alta velocidade entre Madrid e a fronteira portuguesa com um traçado para velocidades de 350 km/hora, tal como estava programado e acordado com Portugal desde que foram assinados os primeiros acordos para este projecto em 2003." Público (edição impressa)

Só quem não conhece os organismos de planeamento do estado espanhol (Ministerio de Fomento, etc.), que felizmente não foram capturados pelas ratazanas locais, como aqui fez o Bloco Central, destruindo praticamente toda a competência técnica do estado português, é que poderia imaginar que o governo espanhol (independentemente de ser "socialista" ou "popular"), alterasse um milímetro do que foi planeado há mais de uma década — ainda que recebendo de Portugal, ao longo de todo este tempo, os sinais caricatos de uma nomenclatura corrupta que apenas se dedica aos assaltos de curto prazo à riqueza disponível.

Ou seja, hora para investir em Elvas e na futura eurocidade Elvas-Badajoz! Eu vou começar a procurar um apartamento na velha cidade-fortaleza ;)

Fundos comunitários do TGV vão ser reprogramados para outros projectos em Portugal

A Comissão Europeia (CE) e Portugal estão em convergência sobre o destino dos fundos disponibilizados para o projecto de alta velocidade TGV, abandonado na quarta-feira pelo Governo, disse hoje em Lisboa José Manuel Durão Barroso.

O presidente da CE afirmou ainda que Portugal vai permanecer em todos os programas de financiamento acordados originalmente e integrar as redes transeuropeias.

"Existe uma convergência entre a Comissão e as autoridades portuguesas nesse aspecto. Tanto quanto sei, Portugal ficou em todas as redes, mas, do ponto de vista português, houve a vontade de uma reprogramação, nomeadamente dos níveis da velocidade", referiu. Jornal de Negócios online.

O Passos de Coelho está a transformar-se num verdadeiro primeiro ministro à distância. Se não tem cuidado sucede-lhe o mesmo que ao Santana Lopes. O Portas é o mesmo!

Última atualização: 24 mar 2012 12:55

Novo Partido Democrata — 2


Sandro Botticelli — O Nascimento de Vénus (pormenor)

Sem classe média não há democracia!
 
Se isto é verdade, não pode deixar de ser uma grande preocupação assistirmos ao processo recentemente acelerado de destruição da classe média portuguesa, que a bancarrota do país e os grupos parasitários ameaçam transformar num processo dificilmente reversível no curto e médio prazo, sobretudo se a própria classe média não reparar na gravidade da situação e se deixar lentamente engolir pelo cano de esgoto da fiscalidade brutal e insaciável que tomou conta do nosso presente e ameaça destruir o nosso futuro.

Os ricos sempre souberem viver e os pobres sempre conseguiram sobreviver em regimes absolutistas e ditatoriais, mas os democratas e liberais, não. Se deixarmos o bloco central que há mais de trinta anos atrai as maiorias eleitorais render-se de vez aos processos de captura e manipulação da sociedade por parte dos ricos rendeiros do regime, com a consequente desintegração ideológica da democracia, haverá um momento, mais próximo do que poderemos imaginar, em que a diversidade democrática portuguesa será brutal e repentinamente reduzida à lógica maniqueísta e populista típica dos regimes pré-democráticos, dando assim lugar a uma espécie de pós-democracia miserável, tecnológica, burocrática, autoritária e policial.

O perigo de caminharmos rapidamente para uma ditadura cibernética de aparência democrática, com simulações eleitorais cada vez menos concorridas e mais manipuladas, não é uma fantasia, nem uma hipótese teórica de uma qualquer teoria da conspiração. A expropriação fiscal da classe média, que arrasta atrás de um indecente cortejo burocrático e policial o roubo ilegítimo mas aparentemente legal das poupanças e outros ativos desta classe criativa —como a família, o amor e as amizades—, está em curso e ameaça aniquilá-la em menos de uma geração. Para impedi-lo será preciso mudar o curso suicida das democracias europeias e americanas num novo tempo histórico, em que a abundância de recursos acabou e o predomínio colonial do Ocidente deixou felizmente de prevalecer na ordem mundial.

As democracias ocidentais estão no início de uma metamorfose cultural desordenada, largamente manipulada por minorias que já capturaram estados e governos por esse mundo fora, e se preparam agora para anestesiar e depois liquidar a base social das democracias modernas. Queremos que assim seja?

Suponho que não!

No primeiro texto que escrevi, em Janeiro deste ano, sobre a urgência de criar um Novo Partido Democrata, o NPD, pode ler-se:
Quando será que este governo cairá na lama? No fim da legislatura? Antes mesmo? Tudo irá depender do tempo que Álvaro Santos Pereira aguentar. A sua saída ditará simbolicamente o fim da própria presunção de inocência do senhor Passos de Coelho e do cada vez mais irritante Gasparinho. Depois deste cabo dobrado, a corrida eleitoral recomeçará! Porque pensam que anda Sócrates e a corja que deixou plantada no parlamento tão agitados?

O cada vez mais débil António José Seguro precisará em breve de recorrer a uma Unidade de Cuidados Intensivos (estratégica e táctica). Esperemos que saiba encontrar o conselheiro certo. Mas, como venho insistindo, já não chega. Aquela roseira velha não recupera sem uma grande poda!

E nós, ou seja, os que hesitam entre deixar de votar de vez, e a ténue esperança de uma renovação do jogo democrático, precisamos doutro partido para mudar este estafado rotativismo em que estamos metidos há mais de três décadas e cujo triste balanço é a bancarrota. Já não acontecia há 120 anos!
(Ler texto completo aqui)

Portugal caminha rapidamente para um segundo resgate. As palavras desencontradas do governo escondem o óbvio: o país está profundamente falido e insolvente, depende dos credores internacionais para comer e para pagar os seus funcionários públicos, as reformas e assistência médica e social ainda prestada, e para manter a aparência institucional dos cadáveres adiados da banca, que mais não fazem do que executar o pouco sangue que ainda respira na economia.

Desde a assinatura do memorando com a Troika de credores, Portugal é um protectorado, alías um protectorado formalmente independente, isto é, onde o poder político resultante de processos eleitorais cada vez mais inexpressivos pode, apesar de tudo, continuar a destruir o país, em nome do salve-se quem puder, em nome dos grandes rendeiros, em nome da continuidade patética da retórica partidária e parlamentar, em nome dos privilégios das corporações profissionais, sindicais e partidárias. Quanto maior for o buraco cavado pelas elites assassinas do país, mais doloroso e prolongado será o nosso cativeiro e mais arrasadora será a destruição da classe média.

O maior problema que temos pela frente é pois o de saber se quando acordarmos ainda iremos a tempo de nos levantarmos!

Aos que dizem que Portugal não precisa de mais partidos, repito: com os que temos não iremos a parte nenhuma. Do CDS ao dito Bloco de Esquerda, as soluções estão esgotadas, e sobretudo as dependências de cada um destes partidos do orçamento público é de tal ordem que já nada mais farão mais do que reproduzir até à exaustão as suas cada vez mais impotentes e caricatas ladainhas.

Precisamos, sim, de novos partidos e sobretudo de uma democracia menos partidária!

Parece um paradoxo, mas não é. Portugal precisa de um Estado eficiente, isto é, mais leve, mais transparente, mais profissional, mais responsável, menos partidário, mais digno, em suma. E precisa de uma ligação mais verificável e orgânica entre eleitores e eleitos. Precisa também de estender o tecido democrático para lá das paredes do parlamento e da governação central e municipal, ou seja, precisa de uma sociedade mais democrática, transparente, responsável e pragmática em todos os seus níveis de organização, cuja reflexão e apostas cheguem facilmente e influenciem os níveis superiores de decisão e governo. Precisamos, ao mesmo tempo, de libertar a sociedade, a economia, a política e a cultura das carraças, dos piolhos, das pulgas e da sarna que a atormenta e vem consumindo de forma deplorável.

Eu estou disposto a colaborar no renascimento da democracia portuguesa. E você, está?

quarta-feira, março 21, 2012

A sombra de Lutero

Alemanha preparada para abandonar o euro

Lucas Cranach, o Velho — retrato de Martinho Lutero e esposa (1529)

Uma pilha de papel em branco aguarda eventual regresso da Alemanha ao marco se entretanto a insolvência dos PIIGS se revelar irreversível e insuportável para os cofres do Bundesbank.

Quanto à viagem de António Mexia a Pequim imagino que o cabotino foi chamado a despacho pelo governo chinês, com o objectivo expresso de o mandarem calar e ser portador de um presente qualquer para Passos de Coelho. Já no que se refere à misteriosa viagem do nosso contabilista-mor a Washington, estranho sobretudo a falta de especulação da nossa imprensa. Então não acham extraordinário que o ministro das finanças de uma província minúscula do império se desloque assim de repente à América para falar com Geithner e Bernanke? Eu só vejo uma ou duas explicações para tão inusitado episódio da crise financeira em curso:

  • Os americanos querem, e têm argumentos suficientes para, moderar a aproximação sino-lusitana;
  • Portugal está em pânico com a possibilidade de Berlim exigir a devolução do que resta do ouro nazi que Portugal obteve em troca do volfrâmio exportado para o III Reich durante a Segunda Guerra Mundial, e que foram em larga medida alienadas durante os mais de trinta e sete anos de democracia populista que se sucederam à ditadura. Estas reservas de ouro, depositadas em Fort Knox (suponho), serviriam agora para cobrir parcialmente os colossais empréstimos em curso, contra os quais Portugal já não pode oferecer garantias sólidas, pois os Bilhetes do Tesouro vendidos pelo Estado português aos bancos, que por sua vez os depositam no BCE (como colateral) em troca de empréstimos a 1%, são demasiado fungíveis. Quando estes papeis tiverem que ser trocados por novos títulos de dívida, por ocasião do inevitável incumprimento e subsequente reestruturação da gigantesca dívida portuguesa, a economia portuguesa estará então provavelmente em pior estado do que está hoje — seja porque os políticos não fizeram as reformas prometidas à Troika e ao eleitorado que correu com Sócrates, seja porque a austeridade excessiva, continuada e mal distribuída acabará por destruir ao mesmo tempo a receita fiscal e a capacidade produtiva do país!

O bom humor de Vítor Gaspar contrasta escandalosamente com as últimas informações sobre a execução orçamental de 2012. Ou será que a saída da Alemanha do euro já está nos planos da Comissão Europeia, da América, do Reino Unido, da China e... de Portugal?!

Vivemos tempos de grande volatilidade, como bem demonstram os últimos despachos de John Ward/The Slog sobre o nervosismo, mas também sobre as precauções da Alemanha. Chamo, a propósito deste post montado pelas toupeiras do Slog, uma especial atenção para a crucial entrevista dada por Markus Kerber a James Turk em Setembro de 2011, e que Ward expressamente menciona.


Markus Kerber talks to James Turk

REVEALED: HOW BERLIN HAS BEEN PLANNING A EURO-EXIT SINCE 2009, The Slog.

… Berlin is sitting on a huge stock of unprinted banknote quality paper….and has reduced the amount of its existing euros in circulation. That second fact is particularly surprising given that, since the euro’s launch, Germany has led the circulation growth every year: it has one of the lowest credit/bank card usage rates in the EU, and easily the highest consumption of cash for transactions.

[…] One thing the euronote production market as a whole reveals is how little real control the ECB has on a day-to-day basis. It prints just under 8% of all the banknotes  in circulation: over four notes in five are produced by the EU member State’s own suppliers – and in most cases, they are nationalised. What ties all the ‘peripherals’ together is that none of them produce euros for anyone else – and each country’s output has a different serial prefix to identify it. So it is relatively easy for the ECB to spot when unauthorised printing is taking place. Ergo, Mario Draghi must know that the Bank of Greece has been printing without permission. But he has chosen to do nothing about it.

[…] As an EU citizen (thankfully uninvolved in the eurozone) I find all the things emerging from this very brief initial delve into euro production most disturbing. Last November the Max Keiser site focused on ECB reform as the thing most likely to evoke a German departure from the ezone. Since then, ECB boss Mario Draghi has manoeuvred Board membership at the bank skilfully to reduce German influence still further.

[…] In the same month, Chancellor  Merkel’s Christian Democratic Union party voted to allow euro states to quit the currency area, endorsing the prospect of a move not permitted under euro rules. That was a statement of intent, not the passing of a law – but it does show pretty clearly that the option is there should Berlin feel the need.

Now we learn that Berlin has a banknote paper stockpile, full control over a printer based in Berlin, is running down its euro supplies, and is ken to make euro-exit easier. As The Slog’s Bankfurt Maulwurf has always maintained, Germany has every angle covered. Yet again, digging into the facts behind the spin proves him right.
[…] Earlier in the week, The Slog led with the revelation that Germany’s banking community had told Angela Merkel, “Either Greece must be amputated, or we must leave the eurozone”. I am rapidly coming to the conclusion that both possibilities are still in play….and as always, the Fuhrerine in Berlin is waiting for events to present a clearer picture. As I noted in the earlier post this week, opinion is moving away from the German exit solution: but a post-election repudiation of the Brussels Accord in Greece, and a collapse in Spain and Portugal, would make it the hot favourite.

terça-feira, março 20, 2012

Depois do banquete

O tempo trágico por vir, chegou...

Marco Ferreri — La Grande Bouffe (1973) Na imagem: Michel Piccoli e ?

Em 1972 Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers publicaram The Limits to Growth. Um ano antes, a produção petrolífera americana atingira o seu pico e Nixon anunciara unilateralmente o fim do Acordo de Bretton Woods. Um ano depois dar-se-ia a primeira grande crise petrolífera e a Guerra de Yom Kippur. Neste mesmo ano a alegoria escatológica de Marco Ferreri, La Grande Bouffe, ganhou o prémio da crítica do Festival de Cinema de Cannes. Quase quarenta anos depois, a sociedade do consumo começa francamente a desfazer-se, sem descortinarmos que outra lhe poderá suceder.

A humanidade, tal com previra Donella Meadows, pode já ter passado para lá do limite de segurança da sua própria sustentabilidade, restando-lhe agora esperar pelas consequências de um desastre inevitável. Os limites de crescimento potencial do modelo económico e demográfico baseado no uso intensivo de formas de energia barata foi atingido. E nem mesmo a China parece em condições de resistir ao que aí vem, pois já deixou de poder exportar para as economias falidas do Ocidente o suficiente para continuar a recuperar a ritmo galopante o seu atraso económico, tecnológico, social e cultural face à Europa, Japão, Estados Unidos e Canadá. Uma coisa é vermos o PIB da China aproximar-se rapidamente do PIB americano, ou do da União Europeia, outra bem diferente é compararmos o PIB per capita chinês com os correspondentes níveis de produção per capita no Ocidente industrializado. A China não consegue, nem creio que conseguirá alguma vez, gerar internamente a escala e a qualidade de consumos que permitam seguir o conselho algo cínico dado por Christine Lagarde aos políticos e homens de negócios chineses: deixem de depender tão criticamente das exportações e do investimento!

O sonho americano e o sonho europeu, assentes na ilusão de uma sociedade de consumo, prazer e bem-estar social sem limites, alimentada por energias baratas, pela exploração colonial e finalmente pelo endividamento compulsivo, acabou em pesadelo. O pesadelo da destruição sistémica do emprego, o pesadelo da insolvência e da austeridade sem fim, e o pesadelo do colapso irreversível do estado social, inicialmente criado por Bismarck, no século 19, para travar a emigração germânica para a América, onde se pagavam, e pagaram até ao fim do século 20, melhores salários do que no resto do planeta. O reajustamento acabará por se dar, só não sabemos quanto vai custar e quantas vítimas irá causar.




Em Portugal os analistas despertaram tardiamente para a gravidade destes problemas. A busca desesperada de bodes expiatórios arrancou em força depois de se perceber duas coisas simples: que uma parte da sociedade tem sido sangrada e sugada paulatinamente desde os tempos de Manuela Ferreira Leite, e de forma brutal desde que assinámos o Memorando com a Troika, mas que uma outra, composta por uma difusa e algo tenebrosa elite e excepções indecorosas, tenta descaradamente escapar às suas responsabilidades. Os casos da TAP, da RTP, da Caixa Geral de Depósitos, ou do Banco de Portugal, já para não falar das mordomias parlamentares e partidárias, são um insulto intolerável à inteligência e ao que resta da democracia!

O governo já aumentou impostos e vai continuar a aumentá-los, já reduziu benefícios fiscais e despesa pública e vai ter que continuar a reduzi-los, continua, em suma, a leiloar Bilhetes do Tesouro. Só não imprimiu moeda, porque não pode!

Parte da liquidez que nos chega da Troika regressa à origem sob a forma de juros. Pelo caminho vão-se saldando parte das dívidas e impede-se o incumprimento (bancarrota), permitindo ao mesmo preparar devedores e credores para uma reestruturação mais ou menos próxima da dívida.

Os bancos não emprestam, e então o dinheiro foge dos bancos!

São as duas faces de uma mesma moeda: a moeda da deflação monetária. Mais cedo ou mais tarde terá que haver alguma reflação, sob pena de as economias europeias entrarem num ciclo depressivo semelhante ao do Japão: juros negativos, estagnação económica, regresso ao endividamento público para acudir à emergência social e para manter o sistema financeiro numa qualquer unidade de cuidados intensivos, desemprego endémico, crise política permanente...

A tosquia grega, ao contrário do que boa parte das Cassandras inglesas e de Wall Street previram aos quatro ventos, não fez ruir o dominó do euro. Temos, pois, um caso de estudo pela frente!

…as anticipated by LEAP/E2020, the handling of the “Greek crisis” (9) has quickly caused the disappearance of the so-called “Euro crisis” from the media headlines and market participants’ concerns. The mass hysteria maintained by the Anglo-Saxon media and the Eurosceptics during the second half of 2011 on this subject hasn’t lasted long: Euroland is increasingly asserting itself as a sustainable structure (10); once again the Euro is in vogue in the markets and for emerging countries’ central banks (11), the Eurogroup/ECB functioned effectively and private investors will have to accept a haircut of up to 70% on their Greek assets, thus confirming LEAP/E2020’s 2010 anticipation which then spoke of a 50% haircut when almost no-one imagined such a possibility without a “catastrophe” signalling the end of the Euro (12). Ultimately, markets always yield to the law of the strongest… and the fear of losing more, whatever the students of ultra-liberalism may say. GEAB Nº63.

Na realidade, nem todos os analistas anglo-saxónicos estão a soldo da propaganda de Wall Street e Washington. Continua a haver cabeças pensantes e que pensam bem e com honestidade sobre os problemas. Dois exemplos: a análise recente da Bridgewater sobre alguns casos históricos de reestruturação de economias excessivamente endividadas, e sobretudo o muito estudado relatório publicado em 2011 pelo The Boston Consulting Group:

Collateral Damage
Back to Mesopotamia?
The Looming Threat of Debt Restructuring

David Rhodes and Daniel Stelter
September 2011 (PDF)

Primeiro, vamos ao resumo do ZeroHedge sobre a investigação da Bridgewater, da autoria de Ray Dalio —An In-Depth Look At Deleveragings (PDF):

Last month, the world's biggest hedge fund, Bridgewater, issued a fascinating analysis of deleveraging case studies through the history of the world, grouped by final outcome (good, bad and ugly). As Dalio's analysts note: "the differences between deleveragings depend on the amounts and paces of 1) debt reduction, 2) austerity, 3) transferring wealth from the haves to the have-nots, and 4) debt  monetization. Each one of these four paths reduces debt/income ratios, but they have different effects on inflation and growth. Debt reduction (i.e., defaults and restructurings) and austerity are both deflationary and depressing while debt monetization is inflationary and stimulative. Ugly deleveragings get these out of balance while beautiful ones properly balance them. In other words, the key is in getting the mix right." Of these the most interesting one always has been that of the Weimar republic, as it certainly got the mix wrong.

[…]  as BCG showed last year [2011], the global debt overhang (on a net blended basis) to reduce global Debt to GDP to a "sustainable" 180%, would require the elimination of $21 trillion in debt, one way or another, with the excess debt concentrated primarily in the US ($8.2 trillion) and the Eurozone ($6.1 trillion).

in ZeroHedge, Presenting Bridgewater's Weimar Hyperinflationary Case Study (LINK)
E agora vamos ao resumo do ZeroHedge sobre o já famoso Back to Mesopotamia:
Boston Consulting Group confirms, the "muddle through" is dead. And now it is time to face the facts. What facts? The facts which state that between household, corporate and government debt, the developed world has $20 trillion in debt over and above the  sustainable threshold by the definition of "stable" debt to GDP of 180%. The facts according to which all attempts to eliminate the excess debt have failed, and for now even the Fed's relentless pursuit of inflating our way out this insurmountable debt load have been for nothing. The facts which state that the only way to resolve the massive debt load is through a global coordinated debt restructuring (which would, among other things, push all global banks into bankruptcy) which, when all is said and done, will have to be funded by the world's financial asset holders: the middle-and upper-class, which, if BCS is right, have a ~30% one-time tax on all their assets to look forward to as the great mean reversion finally arrives and the world is set back on a viable path.

in ZeroHedge, The "Muddle Through" Has Failed: BCG Says "There May Be Only Painful Ways Out Of The Crisis" (LINK)

Clicar para ampliar o gráfico

Se repararmos no caso portugês, ficamos a conhecer algumas cifras aterradoras:
  • Em 2009 a nossa dívida total (pública, empresarial e doméstica) já rondava os 312% do PIB
  • Ou seja, para regressar aos limites de sustentabilidade teórica (180% do PIB) seria preciso, considerando os números de 2009, uma redução do nosso endividamento na ordem dos 221 mil milhões de dólares!
Em 2009 o endividamento das empresas não financeiras (139%) estava bem acima das dívidas pública (76%) e doméstica (97%). A avaliação confere, aliás, com o que vamos sabendo das escandalosas dívidas acumuladas pelas empresas do setor empresarial do Estado que se colocaram artificialmente fora do perímetro orçamental público, das PPPs e do setor imobiliário.

Sabe-se, entretanto, que medidas de austeridade que impliquem cortes orçamentais anuais acima dos 3% do PIB redundam rapidamente em agitação social. Ou seja, e no caso português, o limite da austeridade poderá andar pelos cinco mil milhões de euros anuais, ou seja, para regressar aos 180% de endividamento global teríamos que aguentar mais de quatro décadas de empobrecimento contínuo!

Como está bem de ver, é impossível, e portanto o discurso otimista de Vitor Gaspar aposta numa má notícia externa (a da própria insustentabilidade do sobre endividamento europeu e americano) para desdizer o que vem afirmando à boca cheia neste últimos dias. Portugal não poderá evitar a reestruturação, isto é o repúdio de uma parte da sua colossal dívida. Tal como na Grécia, quem tiver Bilhetes do Tesouro de Portugal será forçado, mais cedo ou mais tarde, a trocá-los por outros, valendo substancialmente menos.

Hu Jieming, Raft of the Medusa, 2002, Photo

Em 2002 o artista chinês Hu Jieming, de Xangai, que eu convidara a expor em Portugal, no já longínquo ano de 1999, realizou uma foto-montagem digital quase tão profética quanto o filme de Marco Ferreri. Parodiando a famosa pintura histórica de Théodore Géricault, Le Radeau de la Méduse, Jieming anuncia o impossível sonho da sociedade de consumo chinesa. Xangai crescia então exponencialmente. Desde 2008, porém, que a China tem alimentado uma bolha imobiliária gigantesca, na expectativa de conter o alastramento dramático do seu contingente de mais de quarenta milhões de desempregados. Quando rebentar, e já começou a rebentar, o sonho americano da China esfumar-se-à, deixando atrás de si cidades abandonadas e muitos náufragos :(