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sexta-feira, março 30, 2012

Iberia Express ou TAP'EX?

Foto do Dakota DC-4 CS-TDF da TAP, comandado pelo Comandante Manuel Maria Rocha e co-piloto Roger d'Avelar, na sua partida de Lisboa a 24 de Março de 1946 pelas 14 horas. O trajecto definido foi : Lisboa-Casablanca-Bolama-Lagos-Liberville-Luanda-Lusaka-Lourenço Marques. A bordo seguiram , além de outros, um telegrafista, mecânico de bordo, o navegador e o meteorologista. Após 11.405 Kms e 45 horas e 20 minutos de vôo com 6 escalas, chegou ao aeroporto de Mavalane em Lourenço Marques no dia 1 de Abril de 1946, pelas 13 horas e 50 minutos. Ou seja, uma semana. THE DELAGOA BAY BLOG

Iberia Express, já está! E agora TAP?

Há muito que a blogosfera informada sobre transporte aéreo recomenda um spin off da TAP antes da privatização, sob pena de esta vir a ser um não evento e uma monumental barraca político-partidária — pois nem os governos PS e PSD-CDS/PP, nem nenhum partido parlamentar, até hoje, encarou o problema TAP de frente :(

A TAP tem gente a mais quando olhamos para evolução recente deste serviço, e sobretudo deste negócio.

A TAP alberga no grupo negócios ruinosos (ex: TAP Maintenance & Engineering, ex-VEM) que não fazem parte do core business da empresa e que têm vindo a chupar literalmente os lucros das operações intercontinentais e em geral do chamado hub aeroportuário português (basicamente um mini hub sediado na Portela e no aeroporto Sá Carneiro, que gere um importante fluxo de passageiros entre o Brasil e a Europa).

A TAP há muito que também perde dinheiro nas ligações europeias ponto-a-ponto, tendo a administração de Fernando Pinto/Michael Connolly (administrador financeiro) apostado estupidamente na ocupação em pura perda de dezenas de slots com o único objetivo de atrasar o inevitável: a chegada em força das companhias de baixo custo a Portugal!

A TAP martela as suas contas sistematicamente. Fê-lo outra vez este ano ao apresentar lucros de um único segmento da TAP como se fosse todo o grupo, onde obviamente se registaram prejuízos! Como pode uma companhia dar lucro e ser interessante para eventuais privados (de momento só existem duas empresas públicas interessadas em comprar o filet mignon da TAP: Iberia-British Airways) quando tem uma dívida acumulada de mais de 2,4 mil milhões de euros — o suficiente para mandar construir duas pontes Vasco da Gama?!

Como a blogosfera tem proposto, primeiro é necessário encarregar uma consultora internacional credível para desenhar um spin off inteligente da TAP, e só depois iniciar um processo de privatização a sério, e não mais uma entrega ao desbarato de uma empresa estratégica a outro país (no caso, a dois: Inglaterra e Espanha!)

A blogosfera adiantou há mais de dois anos a ideia de libertar a TAP das suas gorduras desnecessárias e de, ao mesmo tempo, criar dentro do grupo duas (chegou a propor-se três) companhias: uma TAP LOW COST e uma TAP INTERCONTINENTAL, assegurando deste modo a permanência do seu mini hub atlântico em Portugal, e entrando no jogo altamente competitivo das companhias de baixo custo.

O aparecimento da Iberia Express mostra o que poderá acontecer à TAP se for o contabilista-mor do reino (Vítor Gaspar) a decidir: 4000 despedimentos e a entrega dos aviões da TAP (em leasing), e sobretudo os slots, à Iberia Express !!!

Para a IAG (Iberia + British Airways) a TAP só poderá interessar por um motivo, aliás importante: alargar a presença que já tem no Atlântico norte para o Atlântico sul.

O hub da TAP até poderia continuar em Lisboa, só que já não seria da TAP, mas da IAG. E quanto ao resto é simples: despedir, vender e enfiar o que sobrar na Iberia Express!

Mas também pode acontecer o pior: tudo para Madrid e Barcelona! Portela e Sá Carneiro passariam à categoria de aeroportos regionais de baixo custo — e nada mais :(

terça-feira, novembro 22, 2011

TAP: abençoada lingerie!

QaTArP Airways
Estivemos 150 anos no Abu Dhabi. Porque não deixar agora regressar as moiras a Portugal?

Freddrick's of Hollywood abriu a sua nova "flagship" no Abu Dhabi
TAP pede licenças para operar rotas entre aeroportos portugueses e Abu-Dhabi
“Torna-se público que a TAP - Transportes Aéreos Portugueses requereu uma licença para a exploração de serviços de transporte aéreo regular na rota Lisboa/Abu-Dhabi/Lisboa”, o mesmo acontecendo para as ligações Funchal/Abu-Dhabi/Funchal, Porto/Abu-Dhabi/Porto e Faro/Abu-Dhabi/Faro, refere o INAC. — in Jornal de Negócios online.

UAE: Lingerie Revealing Symbol Of Abu Dhabi's Retail Pull

ABU DHABI, United Arab Emirates (AP) -- It could have picked London or Hong Kong. Instead, the lingerie retailer that styles itself "the original sex symbol" chose the buttoned-down sheikdom of Abu Dhabi for the launch of its first international store.

Frederick's of Hollywood, famed for its curve-cinching corsets and provocative push-up bras, opened up to little fanfare in the Emirati capital last weekend. Another outpost offering the chain's racy lingerie is set to open soon up the road in more freewheeling Dubai. — in Huffingtonpost.

Enquanto os comandantes e pilotos da TAP são assediados pelas companhias aéreas chinesas, sul-coreanas, turcas e árabes, com contratos que, face à degradação galopante do estado financeiro da nossa companhia aérea de bandeira, se tornarão em breve muito apetecíveis, Fernando Pinto prepara-se para aumentar o radar do hub aeroportuário nacional, tornando-o, por assim dizer, bifocal: um olho no Brasil, outro no Abu Dhabi. É caso para dizer que a necessidade aguça o engenho!

A situação da TAP continua a sofrer de indefinições, hesitações e imprevisibilidades que convém analisar:
  1. Desconhecemos o caderno de encargos da privatização apresentado aos interessados — o que em matéria da transparência deixa muito a desejar;
  2. Continuamos sem saber se a privatização da TAP será total ou parcial; e se faz parte, ou não, de um bundle, com a ANA — o que em matéria da transparência deixa muito a desejar;
  3. Continuamos sem saber quais são as empresas efectivamente interessadas na privatização total ou parcial da TAP, ou seja, quais foram as que realmente levantaram a documentação respectiva — o que em matéria da transparência deixa muito a desejar;
  4. Não sabemos se, sim ou não, o governo português tenciona proceder a um spin-off prévio da companhia, com vista a uma reestruturação preventiva do grupo, liquidação parcial das dívidas, etc.
  5. Sabemos apenas que a data limite para o fecho das negociações foi adiada até Dezembro de 2012 — o que não deixa de revelar à evidência as dificuldades de encontrar um parceiro, ou comprador credível que não seja a Ibéria-British Airways (IAG), a única opção à partida inaceitável, por motivos óbvios: a Ibéria liquidaria o hub de Lisboa em três tempos (replicando a arrogância demonstrada, aliás, noutras paragens — o caso da Argentina foi escandaloso!)
Sabe-se, entretanto, que os pilotos e os comandantes da TAP, já para não mencionar o pessoal de manutenção das aeronaves e o pessoal de bordo e de Terra, estão cada vez mais nervosos com a situação.

Companhias chinesas, sul-coreanas e árabes têm vindo a oferecer aos pilotos mais experientes contratos aliciantes para duas zonas do globo onde a compra de aviões novos e o crescimento do tráfego aéreo, de negócios e turístico, dispararam na proporção inversa da falta de pessoal qualificado para manobrar e manter aeronaves e sistemas tecnológicos altamente sofisticados. Não se improvisam pilotos, e muito menos comandantes de aeronaves, nem engenheiros-chefe de manutenção, como quem escolhe cagarros para um parlamento. São precisas muitas horas de voo documentadas, históricos profissionais e de carácter sem nódoas, classificações de desempenho credíveis e de alto nível, em suma, competência e fiabilidade.

À medida que o amadorismo negocial e a falta de estratégia política prevalecem entre as conspirações que há muito caracterizam a corja político-partidária e os lóbis corruptos que temos, maior será a pressão para aceitar os ventos que sopram de Oriente. Seis comandantes já voaram. Trinta ou quarenta mais entregaram CVs e avaliam dia-a-dia os prós e os contras de uma emigração forçada pelas elites desmioladas que conduzem o país.

Há por enquanto consenso, entre os pilotos da TAP, sobre três temas:
  1. o aeroporto de Lisboa deverá passar a contar com o Montijo — solução que supera em todos os termos de comparação, Alverca, Sintra, Beja e Monte Real (1);
  2. a entrada da Ibéria na TAP significaria a prazo muito curto o fim do hub de Lisboa e transformação dos aeroportos portugueses em aeródromos de província;
  3. os pilotos da TAP, nomeadamente através do seu sindicato, querem fazer parte do futuro da empresa, exigindo para tal que lhe seja dada a participação no respectivo capital, a que têm direito em virtude dos resultados das negociações que em 1999 encetaram com a tutela, então dirigida por João Cravinho.
Insisto: o governo deve falar com quem melhor conhece a companhia, e deve recorrer a uma entidade internacional independente para realizar um spin-off do grupo tendo em vista a sua privatização, mas também a salvaguarda de um bem estratégico.

Este é um Mercedes Benz de um bilionário do petróleo em Abu Dhabi.
Motor V10 com 4 turbos 1600 HP, Torque de 2800Nm, vai de 0 a 100 km/h em menos de 2 seg. Utiliza bio combustível. Não é de aço inoxidável, é de OURO BRANCO!
Certamente poderemos dormir melhor sabendo que o que pagamos pela gasolina é por um motivo nobre.


NOTAS
  1. As objecções à falta de ILS na pista que melhor servirá a operacionalização do Montijo não têm base técnica, pois a solução já existe e chama-se GNSS (Global Navigation Satelite System) — bastando para tal que o Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC) faça rapidamente o seu trabalho em matéria de certificações. Por outro lado, as dificuldades criadas ao uso da pista de recurso 17/35, da Portela, resultantes do número de aeronaves que pastam como bovinos em cima das estendidas e aumentadas placas de estacionamento, resolver-se-à precisamente com o desvio de parte do tráfego para o Montijo, e sobretudo, com a desactivação da quimera burocrático-militar a que chamam "Aeroporto de Figo Maduro"! Esperemos que o ministro da defesa e os militares desorçamentados percebam rapidamente as vantagens financeiras que poderão obter com a entrega da placa de cimento de Figo Maduro à Portela, e da cedência do Aeroporto do Montijo ao Novo Aeroporto de Lisboa, composto por três terminais: Terminal 1 (Portela), Terminal 2 (Portela) e Terminal 3 (Montijo)

sexta-feira, agosto 05, 2011

Spin off TAP, damn it!

Mais de 80% do movimento de passageiros nos aeroportos portugueses dirige-se ou provém da Europa. Menos de 20%, portanto, vai para ou vem do resto do mundo.

As companhias de baixo custo a operar em Portugal continuam a aproximar-se da TAP, que, no segundo trimestre deste ano, apenas conseguiu uma fatia de 37% dos passageiros nos principais aeroportos portugueses, contra os 44% dos primeiros três meses do ano, segundo cálculos do i tendo por base os dados estatísticos do Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC), agora divulgados no site deste regulador. (i online)

Proposta de Rui Rodrigues. A Portela tem condições para viver até 2030, se houver coragem para explicar às chefias militares que têm que se deixar de corporativismos injustificáveis, e desamparar a loja.

Falar, pois, de um hub na Portela, não passa de uma fantasia retórica do gaúcho que a dirige e dos empenhados lobistas do novo embuste aeroportuário da Ota em Alcochete. Apenas os passageiros brasileiros fazem hub na Portela, mais ninguém! Ora, como a UE já tem processos contra a TAP por abuso de posição dominante nas ligações Europa-Brasil, o resultado está à vista: o célebre hub brasuca que o gaúcho montou na Portela vai deixar, muito em breve, de o ser!

A TAP, como a Blogosfera tem vindo a defender (desinteressadamente), só tem uma solução não humilhante para a privatização: contratar uma consultora internacional especializada para fazer um spin off da companhia, preservando o seu core business e vendendo o resto da tralha depressa e quanto melhor possível. Só um spin off bem feito poderá manter a TAP em mãos portuguesas. O Estado pode e deve ter uma participação na companhia, na ordem dos 20%, por intermédio da Parpública, ou da Caixa Geral de Depósitos, etc., mas sem Golden Showers, claro! E pode atrair parceiros nacionais fortes, como sejam o sindicato dos pilotos da própria TAP, bancos portugueses e seguradoras que não estejam completamente falidos, etc.

A nova TAP deveria dividir-se em três companhias comerciais distintas (na frota, no tipo de preços, no serviço e no estilo):
  • TAP Europa (uma variante de companhia Low Cost)
  • TAP Atlântica (focada no Brasil, Venezuela, EUA, Canadá)
  • TAP Oriente (voando para o Médio Oriente, Moscovo, Mar Cáspio, Bombaim, Dehli, Bangalore, Singapura, Pequim, Hong Kong, Xangai,...)
Entre os parceiros internacionais estratégicos, uma vez que a Lufthansa já se mostrou desinteressada deste negócio, devem privilegiar-se o Brasil, Angola, China e um país árabe amigo...

NÃO PERCAM TEMPO COM SOLUÇÕES DE MERCEARIA DOMÉSTICA!
ESQUEÇAM A BRISA E OS FIGURÕES DA SLN/ BPN QUE COMPRARAM TERRENOS EM ALCOCHETE!
ABAIXO A CORRUPÇÃO !!!

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COMENTÁRIO

Pela extensão e oportunidade, resolvemos incorporar este comentário no corpo deste post.

Um BIC à TAP!

Há dias os tipos da TAP compraram espaço no DE por forma a passarem a mensagem de que Julho tinha sido um mês fabuloso para a TAP. Na oportunidade comentou-se que, apesar dos números serem um bom indicador, o que interessava era a rentabilidade (por lugar).

No mesmo dia lia-se no Jornal de Negócios que a Air France e a British Airways se queixavam exactamente das quebras de rentabilidade, pois os preços tendem a baixar por efeito de vários factores (meu ponto de vista):

— utilização de aviões de maior capacidade (por exemplo, os A380, por parte dos principais operadores europeus, do médio-oriente e asiáticos;
— gestão mais eficaz da capacidade das aeronaves;
— reajuste dos grupos aeronauticos (sinergias), como são os casos da BE e IB.

Pelo meio ainda estão os programas de fidelização (em desuso), a venda de lugares com a devida e inteligente antecedência (estudo das lowcost) e práticas de gestão atentas aos factores de mercado / concorrenciais (hedging e leasing de peças e consumíveis).

Nesta área de gestão, onde o Gaúcho sempre defendeu os seus créditos, é precisamente onde a TAP tem perdido mais terreno, com a patente erosão dos mercados que se sabe. Já não basta pertencer à StarAliance, aliás, nunca bastou. Se os operadores não fizerem pela vidinha, actuando antecipadamente na defesa das suas quotas de mercado, nada feito. A Lufthansa, por exemplo, está a canibalizar a olhos vistos o mercado da TAP. Basta ver o Fligthradar24 dos voos saídos depois das 22:00 de Frankfurt para África...

Ora o INAC (Instituto Nacional de Aviação Civil), pela notícia do i, está a passar a mensagem à tutela sobre aquilo que já se sabe, ou seja, que a gestão da TAP vale o que vale, e nesta questão dos números, a análise da sua perda de influência face às Low Cost (em Faro, no Porto, no Funchal e em Lisboa) é uma autêntica bomba ao retardador. O gaúcho vai até onde o deixarem, mais ou menos como o Sócrates

Do acima escrito, e do que vem publicado n’ O António Maria e no blog Low Cost Portugal, produziram-se algumas reflexões as quais vieram demostrar que a TAP está sempre que pode disposta a utilizar "truques contabilisticos" por forma a mesclar o verdadeiro cenário: TAP SA (apenas para os LUCROS) e TAP SGPS (para os prejuízos).

Na verdade, se a TAP tem transportado mais passageiros deve-o às LowCost, pois estas obrigaram a companhia de bandeira portuguesa a baixar os preços, para poder voar com os aviões "compostos". Mesmo assim, do meu ponto de vista, a rota da Madeira está por um fio, e se a Rya entra na Portela (é mais do que certo) o cenário ficará desesperado para a TAP.

Será que depois de entregue o BCP (por compensação da bronca do BANIF), é desta que a filha do Edu fica com a esTAPê? Acredito que sim, pois interessam à TAAG as rotas para a Europa. E colocar ao mesmo tempo o "centro de gestão" de uma futura TAP angolana em Portugal, é bom para os negóciso e para a diplomacia, como se atesta no caso do BIC Português! Que a TAP vai ser uma empresa satélite da TAAG também me parece cada dia mais plausivel,..., "UM BIC À TAP" — RMV

quarta-feira, junho 01, 2011

A miopia dos economistas

A avaliação leviana do declínio inexorável do petróleo barato é a principal causa dos erros grosseiros de governação portuguesa desde 1996



Para lá dos maniqueísmos de ocasião, convém ter presente que o colapso das economias ocidentais assenta em três factores corrosivos de ordem estrutural que, se nada for feito, conduzirão as economias afluentes de hoje, mais rapidamente do que previram M. King Hubbert (1956) e Donella Meadows (1972), ou mais recentemente, C. J. Campbell (1997), à rampa descendente da curva de Hubbert — a saber:

  • PRIMEIRO FACTOR: declínio inexorável da principal fonte energética das últimas revoluções industriais, da urbanização em massa e do bem-estar social, i.e. o petróleo (+ gás natural); 
  • SEGUNDO FACTOR: envelhecimento populacional e subsequente declínio demográfico das sociedades alimentadas a petróleo; 
  • TERCEIRO FACTOR: desaparecimento do trabalho, causado por duas consequências inevitáveis das economias liberais: tropismo dos centros produtivos em função do custo do trabalho humano e da proximidade das matérias primas; e substituição progressiva do trabalho humano, incluindo o altamente especializado, por máquinas cada vez mais inteligentes.

Vale a pena ler o último artigo de investigação de Rui Rodrigues (Público) sobre os impactos tremendos que a cegueira dos estrategas pode provocar numa economia, no caso a nossa.
Previsões sobre petróleo levaram a política de transportes errada

Nas próximas eleições, os partidos deveriam discutir e debater seriamente as 120 Parcerias Público Privadas num valor superior a 60 mil milhões de Euros, em que 41% deste valor será destinado à construção de novas auto-estradas e vias rápidas.

Neste artigo vamos recordar as conclusões de um documento governamental, publicado em Março de 1996, cujo título era “Energia 1995-2015. Estratégia para o Sector Energético” da Secretaria de Estado da Energia do Ministério da Indústria e assinado pelo então Secretário de Estado Luís Filipe Pereira. Este estudo pretendia, como se pode ler na página inicial, “apontar os grandes objectivos estratégicos, as políticas fundamentais e as medidas a desenvolver no período considerado”. No final da página V da Síntese é dito: “relativamente aos preços do petróleo, há razões plausíveis para admitir uma certa estabilização dos preços do petróleo no curto prazo e o seu aumento moderado num horizonte mais longínquo”. O que veio a verificar-se foi que, em 1995, o preço do crude era de 17 dólares. No ano de 1998 baixou para os 12 dólares e as previsões, no documento governamental publicado em 1996, eram, para o ano 2000, 23 dólares e de 2005 até 2015 o preço ficaria estabilizado nos 28 dólares!

O buraco de 20 mil milhões de euros das PPPs rodoviárias teve origem (descontando a pirataria) numa hipótese energética completamente irrealista: em 1996, o governo português estabeleceu um cenário de desenvolvimento baseado numa estimativa do preço do petróleo, entre 2005 e 2015, de 23 dólares o barril (PDF). O preço do petróleo bruto à hora que escrevo este texto oscila entre os 100,28USD (WTI) e os 114,61USD (Brent). O resultado é simples: com o actual preço do gasóleo, mais os 8 cêntimos/Km impostos pelas portagens das famosas autoestradas “Sem Custos para o Utilizador” (SCUT), a mobilidade automóvel custa 400% mais nos dias de hoje do que há 10 anos atrás, sem que os salários (salvo o dos administradores do regime) tenham subido ao mesmo ritmo — obviamente!

Em geral, os nossos políticos e burocratas, incluindo a maioria dos deputados e governantes, são uma espécie de novos-ricos para quem andar de comboio, metro ou eléctrico, é um desprestígio. Só os carros de alta cilindrada e o avião lhes dão aquele status que os faz sentir bem. Parece pueril, mas é o principal factor psicológico e cultural que concorre para a irresponsabilidade energética do nosso país.

A ideologia do automóvel e do avião esteve, por outro lado, intimamente associada às pressões dos fabricantes de automóveis e aviões, e às empresas de engenharia e betão armado, dentro e fora de portas. Só o colapso da bolha do endividamento, disfarçada durante duas décadas pelo biombo dos bancos de investimento e as falsas estatísticas, veio desnudar toda a irracionalidade que hoje aperta, como um garrote, a nossa economia, o sistema financeiro de uma ponta à outra, e a sustentabilidade do estado social.

A Mota-Engil e a Brisa, entre outras empresas, parecem ter acordado para o fim de ciclo do betão, e voltam-se finalmente para outras áreas: a ferrovia e os portos. Menos mal! Têm, no entanto, que compreender uma coisa simples: Portugal, para se ligar a Espanha e ao resto da Europa, terá que estabelecer rapidamente três corredores ferroviários —para transporte rápido de pessoas e mercadorias— em bitola europeia (UIC):
  1. Pinhal Novo-Poceirão-Caia; 
  2. Aveiro-Salamanca
  3. Porto-Vigo
Outro sector estratégico da mobilidade a médio e longo prazo abrange os transportes colectivos urbanos, suburbanos e interurbanos, sobre carris, para pessoas e mercadorias, igualmente em bitola europeia. O automóvel eléctrico é uma miragem, e a população portuguesa está a envelhecer rapidamente!

POST SCRIPTUM — O artigo de Rui Rodrigues acima citado deu origem a um debate vivo na Net. Reproduzo, pelo interesse objectivo que tem, a mais recente resposta do autor às críticas que lhe foram dirigidas.

A referência ao documento governamental, publicado em Março de 1996, cujo título era “Energia 1995-2015. Estratégia para o Sector Energético” teve como objectivo chamar a atenção [de] Portugal [para a necessidade de] mudar de política de transportes e [de] investir numa nova rede ferroviária de bitola europeia mista para mercadorias e passageiros, [para deste modo] resolver o grave problema de interoperabilidade ferroviária que o País apresenta.

Limitei-me a apresentar os factos, e pelos dados apresentados temos a certeza absoluta que o preço do Petróleo vai continuar a subir de preço. Mais uma razão para alterar a actual política de transportes e deixar de continuar a gastar dezenas de milhares de milhões de euros em novas auto-estradas.

Temos assistido frequentemente aos comentários de muitos economistas que são contra o troço Poceirão-Caia mas quase nada dizem sobre as novas auto-estradas, muito mais caras, e construídas em regiões onde nem sequer existe tráfego que as justifique. Ninguém consegue entender esta atitude, ainda por cima, quando invocam que o nosso País não tem dinheiro para investir numa nova rede ferroviária. As novas auto-estradas representam 41% dos 60 mil milhões de euros das 120 PPP.

As pessoas que são contra a nova rede ferroviária mista UIC (bitola europeia) nem sequer apresentam alternativas para reduzir os custos de transporte dos contentores de e para a UE. Chamo a atenção para o facto de 50% das nossas exportações serem efectuadas por camião TIR.
Lembro que, quando a Opel de Azambuja anunciou a sua saída de Portugal, para Saragoça, onde tinham outra fábrica, o Presidente da Opel afirmou que a saída daquela empresa tinha, como principal fundamento, os custos de logística. A empresa transferiu-se para Saragoça, onde paga salários duas vezes superiores aos de Azambuja.

A Opel de Azambuja representava, por ano, 0,6% do PIB.

A Auto-Europa também se queixa dos elevados custos de logística devidos ao transporte que tem que ser efectuado em camiões TIR desde a Alemanha até Portugal.

Portugal é um País periférico e para ter acesso aos maiores centros de consumo da Europa, a menores custos, terá que construir uma nova rede ferroviária com 3 linhas, 2 transversais e uma Norte-Sul:

Aveiro-Salamanca, que ligará os portos da Região Norte e o Porto à UE.

Pinhal-Novo-Badajoz, que ligará os portos de Setúbal e Sines e a Região de Lisboa à UE

Vigo-Porto-Lisboa-Sines-Algarve-Huelva, que permitirá conectar todos os nossos portos e principais plataformas logísticas e a nossa fachada Atlântica à rede UIC europeia.

Esta rede vai ter que ser construída de forma faseada, começando pelas vias internacionais que nos ligam à UE.

Vai ser necessário construir uma nova linha Lisboa-Porto, porque é fisicamente impossível mudar a bitola na Linha do Norte, onde circulam centenas de comboios por dia.

Esta nova rede ferroviária vai ser cara? É claro que vai, mas muito pior seria se nada fosse feito. Nesse caso, a nossa economia ficaria menos competitiva e os nossos portos iriam atrofiar. A Espanha seria a grande beneficiada porque iria ganhar receitas de logística à nossa custa.

Cumprimentos Rui Rodrigues 

ÚLTIMA ACTUALIZAÇÂO: 03.06.2011 10:20

segunda-feira, abril 27, 2009

TAP 4

Jamé e Gaúcho, um par de serviçais
easyJet e Ryanair empurram TAP para a falência, por criminosa inépcia do governo! E ninguém vai preso?



TAP
Dívida acumulada: 2 467 milhões de euros (activos: 2 261 M€);
Défice em 2008: 320 milhões de euros;
Custo da inviável PGA (Grupo BES), impingida politicamente à TAP: 140 milhões de euros;
Número de trabalhadores por avião: 156,3 (Alitalia: 122,9; média da Ryanair, easyJet e Air Berlin: 37,5);
Load factor: 2005 = 72,3%; 2008 = 63,8% (easyJet = 85%)
Origem do tráfego aéreo nacional: Europa: 80% (Península Ibérica: 30%); Brasil, Venezuela, Angola e Cabo Verde: 14,5%
Futuro da TAP: falência e possível incorporação, com menos 3 a 5 mil trabalhadores, na Lufthansa ou na Air France. As hipóteses angolana e chinesa estão cada vez mais longínquas (apesar dos correios que não páram de viajar entre cá e lá...)

A easyJet é hoje a primeira companhia em número de voos e transporte de passageiros no aeroporto de Faro, a segunda na Portela, a terceira no aeroporto Sá Carneiro, e a quarta... no Funchal, onde ao fim de seis meses de operações arrancou 100 mil passageiros à TAP usando o mesmo género de combustível que esta (o jet fuel) — imagine-se!

Prevendo-se que possa voar proximamente entre o Porto e o Funchal, a easyJet irá certamente aplicar à insustentável transportadora aérea lusitana a mesma tenaz fatal que em tempos usou para esvaziar a TAP nas ligações entre as duas maiores cidades portuguesas e Genebra.

No espaço de um ano a TAP poderá perder 30-40% da sua quota madeirense, começando-se pois por perguntar se continua a fazer sentido o Estado português subsidiar os residentes do arquipélago com receitas do Orçamento de Estado, quando existe oferta capaz de competir com esses mesmos preços subsidiados. Antes da liberalização, uma viagem Funchal-Lisboa-Funchal para residentes custava 222,63 euros e para não-residentes, Lisboa-Funchal-Lisboa, custava 431,63 euros. Simulando esta noite no sítio da easyJet preços para uma viagem Lisboa-Funchal-Lisboa, entre 14 e 18 de Maio próximo, o bilhete custaria 120,98 euros (taxas incluídas.)

Ou seja, a TAP, cujas receitas anuais provenientes do arquipélago da Madeira (e do Orçamento de Estado) andarão à volta dos 163.565.000 euros (correspondentes a um movimento médio anual de 500 mil passageiros), já perdeu nos últimos seis meses qualquer coisa como 32.713.000 euros. E a situação irá certamente agravar-se nos próximos doze meses. Quando tiver perdido para a easyJet 30% do mercado, o prejuízo será, pelo menos, de 49.069.500 euros; e quando a perda concorrencial subir para os 40%, o prejuízo subirá aos 65.426.000 euros.

A implementação da política europeia de "céu aberto" é uma mole que irá estrangulando paulatinamente as grandes companhias de bandeira que não souberam reconverter-se a tempo, nomeadamente estabelecendo estratégias de fusão inteligentes e competitivas.

A lógica do transporte aéreo baseada nos hubs está a dar rapidamente lugar à lógica das ligações ponto-a-ponto. As pessoas estão fartas de perder tempo e de gastar dinheiro em aeroportos (1). As companhias Low Cost deram-lhes razão, criando uma dimensão inteiramente nova do transporte aéreo. Numa primeira fase, aplicaram o conceito de viagem económica ligando directamente o ponto de partida inicial ao ponto de chegada final nos grandes espaços regionais (Estados Unidos e Europa), usando aviões com capacidades compreendidas entre os 120 e os 215 passageiros. Assim que esta fase esteja ganha, as Low Cost irão atacar o mercado dos voos intercontinentais, socorrendo-se nomeadamente dos Boeing 787, desenhados para transportar entre 217 e 250 passageiros, e por conseguinte ideais para as futuras ligações ponto-a-ponto de longo curso: Luanda-Lisboa, Lisboa-Nova Iorque, Lisboa-São Paulo, Xangai-Lisboa, etc.

As perspectivas do transporte aéreo, passada a depressão que entretanto atirará para a falência dezenas de companhias aéreas nos próximos dois a cinco anos, é pois evidente: haverá algumas dezenas de grandes hubs intercontinentais, mas a maioria dos futuros aeroportos serão plataformas de baixo custo, situadas em boas interfaces multimodais, destinadas às redes crescentes das ligações ponto-a-ponto. Em Portugal, tais ligações far-se-ão basicamente a partir de cinco aeroportos: Portela-Montijo, Sá Carneiro, Faro, Funchal e Ponta Delgada. É ainda expectável que mais de 30% dos passageiros da rota aérea entre as capitais ibéricas passem a viajar de AVE-LAV assim que a bitola europeia permita viajar a 250-350 Km/h entre Lisboa e Madrid.

Ou seja: o aeroporto da Ota em Alcochete é um nado-morto. Tão nado-morto quanto o aeromoscas de Beja, que antes mesmo de começar a parir, enterrando 32 milhões de euros do escasso erário público, sob a condução do genial criador de elefantes brancos, Augusto Mateus, aqui mesmo condenámos ao estado de zombie. O inenarrável Mário Lino, surdo aos meus avisos, acaba de borrar a sua enésima gravata com molho de marisco, entoando hinos neorealistas ao futuro da TAP, da ANA, da TTT do seu nostálgico Barreiro e de Alcochete.

A minha pergunta é uma só: quando é que prendemos estes fere-pátrias da latino-americana orquestra socratina? É que em nome do emprego e do desenvolvimento que José Sócrates recita como uma ladainha de telenovela, esta turma de neoliberais esfomeados não tem feito outra coisa que não seja servir o senhor Ricardo Salgado e a descerebrada indústria imobiliária que arrasou boa parte das cinturas verdes das principais cidades do país. E agora, que comemos?!

Receita barata para o aperto, há muito recomendada pela blogosfera:
  1. Mantenham a Portela onde está e façam obras decentes naquele local, expropriando algumas margens se for necessário;
  2. Transfiram a Alta de Lisboa para Chelas;
  3. Ponham a Base Aérea do Montijo em stand-by;
  4. Reservem Alcochete para dias melhores;
  5. Construam a ferrovia mista de bitola europeia, entre Pinhal Novo e Badajoz, para o LAV Lisboa-Madrid, garantindo que o mesmo servirá para transportar passageiros e mercadorias (de contrário, será um desastre económico);
  6. Mandem parar a nova linha férrea de bitola ibérica que os aluados do MOP querem construir entre Évora e Badajoz;
  7. Aumentem o número de comboios na Ponte 25 de Abril;
  8. Vão apurando os estudos para as ferrovias de bitola europeia, para comboios de Velocidade Elevada, entre Porto e Vigo e Porto-Aveiro-Vilar Formoso-Salamanca, sincronizando a coisa com Espanha, claro está;
  9. Recupere-se o controlo público de algumas monopólios, duopólios e oligopólios de onde o Estado não pode continuar arredado, sob pena de acabar com o país!
  10. Em suma, ponhamos termo à perigosa fuga em frente da pandilha que ameaça implodir Portugal.

POST SCRIPTUM
  1. A correcção da desastrosa política de obras públicas e transportes do governo socratino exige que se faça a história desta entorse técnico-orçamental. Veremos então que há pelo menos dois genes patogénicos. O primeiro, chama-se Joaquim Ferreira do Amaral —responsável, com Cavaco Silva, pela destruição da rede ferroviária nacional e pela germinação do Bloco Central do Betão. O segundo, chama-se João Cravinho —responsável, com António Guterres, pela desastrosa estratégia aeroportuária então definida, cujo único objectivo oculto (porventura dos mesmos Cravinho e Guterres) fora preparar o cenário de rendas perpétuas a dever à burguesia burocrática nacional (BES, BCP, Mota-Engil, Teixeira Duarte e quejandos) e que, na óptica de quem estimulou a estratégia, deveria suceder ao fim do ciclo da rodovia de luxo. No meio ficou a balbúrdia da coisa mais necessária e que ninguém cuidou: a imperiosa necessidade de recuperar e adaptar a rede ferroviária nacional ao novo quadro comunitário do transporte eléctrico sobre carris — em nome da eficiência energética, da tecnologia e do equilíbrio social. O facto de este dossier estar nas mãos de um perfeito apparatchic, chamado Carlos Fernandes (MOPCT/RAVE), é a prova provada de que o governo socratino se está nas tintas para os combóios.

  2. Chegou-me aos ouvidos esta manhã que o par de serviçais do BES, devidamente assessorado pelo motorista do mesmo banco em comissão de serviço governamental, vão projectar lucros de 8 milhões de euros para a TAP em 2009!

    Em vez de falarem verdade e prepararem os trabalhadores da empresa para a dura realidade que aí vem, estes irresponsáveis resolveram fazer um número de magia barata. Se for como ouvi, espero que os partidos da Esquerda tenham a coragem de desmontar mais este embuste.

    Por causa da Ota, enterraram a TAP, e por causa da TAP querem agora enterrar os trabalhadores — mas de mansinho, alimentando ilusões piedosas, até que o próximo governo fique com a batata quente.

NOTAS
  1. Além de que um hub é a melhor plataforma para distribuir um qualquer vírus, como a pandemia de gripe suína que desde ontem inunda os canais informativos parece provar


OAM 579 28-04-2009 01:52

sábado, abril 25, 2009

Portugal 100

O nó górdio das grandes obras


O Boeing Dreamliner 787 — a alternativa imbatível ao Airbus A380?—
pode aterrar no Sá Carneiro e na Portela, ao contrário do A380.


O homem estava deitado em cima da cama no seu apartamento de Osaka, completamente vestido. Parecia em paz, e a dormir. A sua pele era de um cinzento escuro. Estava ali há quase um mês, mas ninguém parecia ter sentido a sua falta. Os médicos que realizaram a autópsia ficaram espantados ao descobrir um estômago quase vazio. Tinha morrido de fome. (1)

Há semanas um amigo contou-me o que se passa na empresa onde é director —uma grande multinacional de consultoria na área de engenharia:
Olha, António Maria, a situação na empresa é esta: em 2008 fazíamos uma proposta por dia, este ano fazemos uma proposta por mês, e só para o cliente Estado (linhas de caminho ferro, auto-estradas e parque escolar), com a excepção das barragens para os privados EDP & Iberdrola!

Esta multinacional emprega 300 engenheiros, muitos deles jovens licenciados ganhando menos de 600 euros limpos mensais. Se pensarmos que o endividamento acumulado das quatro principais empresas de construção e obras públicas do país, ascende a mais de 8 mil milhões de euros (2), isto é, trinta e oito vezes o orçamento do ministério da Cultura, o quadro começa a ficar efectivamente negro.

Que aconteceria se o governo dissesse a verdade? Isto é, que não sabe onde ir buscar o pesado investimento necessário ao cumprimento do seu tão ambicioso quanto tecnicamente cretino programa de grandes obras públicas? O impacto no desemprego seria terrível, sobretudo pelo grau de contaminação potencial de uma tal ocorrência. Mas os efeitos no sector financeiro não seriam menos catastróficos. É preciso não esquecermos a simbiose oportunista existente entre o Bloco Central do Betão, o Bloco Central propriamente dito e a Banca (3).

O desemprego efectivo actual já vai na casa dos dois dígitos (apesar das estatísticas marteladas continuarem a insistir em oito e tal por cento), podendo chegar aos 15 e mesmo 20 por cento em 2010 se entretanto nada conseguir estancar a hemorragia da economia mundial (4), sugada como nunca foi pela grande sanguessuga dos mercados de derivados — o maior embuste piramidal conhecido em toda a história económica da humanidade (5).

O simples anúncio do adiamento das grandes obras —TGV, NAL, TTT, novas autoestradas e barragens— teria pois um impacto mais do que previsível: a falência imediata das principais empresas de construção e obras públicas do país —Mota-Engil, Teixeira Duarte (TD), Soares da Costa e Somague, entre outras—, arrastando consigo parte do sector financeiro que, sem novas dívidas garantidas (e de momento só o Estado é um credor suficientemente seguro), caminharia ainda mais rapidamente para os braços de espanhóis e angolanos.

O dilema não podia ser mais dilacerante: as grandes obras públicas do Estado são a única competência que a indolente e corrupta burguesia burocrática lusitana foi capaz de desenvolver em 35 anos de democracia, e sem as ditas obras o complexo financeiro do betão morre; mas por outro lado, avançar por aqui à custa de mais endividamento externo, mais endividamento público, mais impostos e uma razia sem paralelo no sector das PMEs, corre o risco de estrangular toda a credibilidade económica de um país por largas dezenas de anos, podendo até levá-lo a uma catastrófica crise de insolvência —pois ninguém sabe ao certo quanto e onde pára o ouro acumulado por Salazar! O trotsquista clandestino Francisco Louçã deveria meditar sobre estes problemas, em vez de perder tempo a hostilizar estupidamente a povoação de Santa Comba Dão, como se apenas ele e os académicos maoístas de trazer por casa da Universidade Nova estivessem autorizados a estudar o ditador!

A menos que haja um interesse estratégico muito forte e imediato da China pelas costas portuguesas (6), não vejo como financiar, sem fazer colapsar financeiramente o país, o plano de obras públicas do governo PS. Pelo mérito presumido dos vários projectos na mesa não chegaremos a parte alguma, pois à excepção da ligação ferroviária de Alta Velocidade entre Badajoz e o Pinhal Novo, todos os demais projectos estão feridos de morte técnica e demagogia por todos os lados. A respectiva concretização representaria multiplicar por 100 a calinada do aeromoscas de Beja, por cujo rombo orçamental, incompetência técnica e corrupção política, alguém terá que ser responsabilizado.
  • O plano de barragens da EDP é um embuste derivado apenas da ansiedade bolsista dos piratas que a dirigem, depois de terem endividado a empresa para lá dos 13 mil milhões de euros, ou seja, uma cratera de dívidas ainda maior que o buraco negro das quatro mega-construtoras nacionais!
  • O traçado da ligação ferroviária em bitola europeia entre o Porto e Lisboa não passa de uma aberração técnica sem qualquer espécie de rentabilidade económica (7).
  • A Terceira Travessia do Tejo, antes de esgotar as potencialidades da ponte 25 de Abril em matéria de transporte ferroviário, e sobretudo antes de reavaliar a oportunidade de construção a curto prazo do NAL de Alcochete, é uma bestialidade tecnológica de engenheiros sem espinha, além de ser mais uma demonstração da pressa subserviente do papagaio Sócrates, um atentado gritante à ecologia e capacidade portuária do grande estuário do Tejo, e uma grosseria estética sem nome (que o PCP, pela voz ignara do seu secretário-geral, é incapaz de denunciar, por mero calculismo autárquico oportunista).
  • A conspiração do Bloco Central do Betão não desiste de pressionar José Sócrates para avançar com o Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) seja onde for, partindo de pressupostos cada vez mais fantasistas. Levaram a TAP à ruína (8) para justificar a saturação do aeroporto da Portela, e agora que a TAP não vale um caracol e se arrisca a uma agonia mais dolorosa ainda que a da Alitalia, ouvimos a voz saturnina do grande banqueiro lusitano, Ricardo Salgado (BES), dizer poemas sobre o extraordinário tráfego intercontinental entre Lisboa e o Brasil, como a decisiva justificação para enterrar o país em Alcochete, quando já todos os portugueses deveriam saber que 80% dos passageiros que passam por Lisboa vêm da Europa ou vão para a Europa, sendo que destes 30% são ibéricos! O Brasil, a Venezuela, Angola e Cabo Verde juntos representam apenas 14,5% do tráfego (9). Como se isto não bastasse para arrumar de vez com os argumentos megalómanos e mitómanos da orquestra governamental, acresce que a própria Boeing, num elucidativo estudo publicado em Novembro de 2006 (PDF), mostra como mudou radicalmente o paradigma do transporte aéreo mundial: o conceito de Hub tem vindo a ceder consistentemente às ligações ponto-a-ponto, seja no médio curso (onde as Low Cost comem todos os dias mais terreno —i.e. Slots— às insustentáveis companhias de bandeira), seja no próprio longo curso, para onde se prevê a próxima expansão das Low Cost.


NOTAS
  1. "Suicides on the Rise as Japan's Economy Falters", by Wieland Wagner, 17-04-2009 (Spiegel Online).

  2. O passivo acumulado das quatro maiores construtoras portuguesas era mais do que suficiente para concretizar a totalidade da rede da Alta Velocidade em Portugal. No final de 2008, Mota-Engil, Teixeira Duarte (TD), Soares da Costa e Somague somavam 8,1 mil milhões de euros de passivo, mais de 20% acima do que registaram, em conjunto, no ano anterior. — in Jornal de Negócios (13 Abril 2009).

  3. O BE [Bloco de Esquerda] exige uma política de sistema bancário. Há, porém, uma razão estrutural para que ela não exista. Portugal é, depois do Luxemburgo, que é um caso muito especial, o país da Europa onde o produto bancário tem maior peso no PIB e isso revela não só a fraqueza dos outros sectores de actividade como evidencia o domínio do capital financeiro. Não há, de facto, uma política para o sector bancário; o que há é uma política do sistema bancário para a utilização do Estado, para a elaboração do orçamento, para a configuração leviana do sistema fiscal, para a domesticação do Banco de Portugal.

    ... É muito mais seguro, através do domínio do aparelho de Estado, controlar a produção de electricidade, as telecomunicações, o cimento, a distribuição alimentar do que concorrer com redes produtivas globais, com economias de escala, ágeis redes logísticas e tecnologias de ponta, na produção de bens transaccionáveis. E, por isso, o perfil do crédito concedido pelos bancos em 2006 às empresas era, em 55,5% destinado à construção ou ao imobiliário e, no que se refere ao crédito aos particulares, ele era dominado pela habitação (79,7% do total) sendo o restante, essencialmente crédito ao consumo. — in "Nacionalização da banca. Piada ou mistificação?" [1] [2], Esquerda Desalinhada.

    Ainda sobre as responsabilidades e poder do sector bancário na emergência e desenrolar da actual crise, vale a pena ler uma das últimas postagens de Ann Pettifor.

    "America - the Bank-owned State" By Ann Pettifor. Huffington Post. 20 April, 2009 (Debtonation.)

    The Obama administration said no to downsizing and re-structuring the banks. They balked at firing incompetent CEOs. Under attack from Republicans and Wall Street they held back on controlling financial institutions that, post bail-out, are in reality ‘State-Owned Banks’.

    As a result, the US administration has itself been hijacked, and America is now, effectively, a Bank-Owned State. Democracy has been usurped by what Abraham Lincoln called ‘the Money Power’.

    Why would bankers stage a hold-up of the administration you ask? Because, to echo the words of an old bank robber: “That’s where the money is”.

    ... So what lies ahead for the bank-owned state?

    Well, my view is that the triumphalism of the bankers is a little overdone, and may not last. Why? Because they can’t get away with cooking the books forever. As with Enron, some day the sheriff will walk through the door.

    Second, bankers do not deal in the real economy. You and I do that, by working, caring for others and producing goods and services. They need us to keep that up, if they are to keep their grip on government, and siphon off our hard-earned surplus. But by raiding government coffers and squeezing the economy dry, the bankers may be cutting the ground that is the real economy from underneath them.

    Third, the bank outlaws have failed to spot a big cloud on the horizon — Climate Change — and are not prepared for the shocks that extreme weather events will cause to their business and the economy as a whole.

    So we, the people, should face reality, end our collusion with the finance sector, recognize our power, and begin to organize — politically.

    To succeed there must be an alliance between Labor, Industry (i.e. all those engaged in productive activity by hand or brain) and the Greens — to challenge the bankers.

    ... For too long Labor and Industry have bickered, over wages and conditions — allowing the bankers to win on the big issues — control over tax revenue, regulation and government. In other words, while Labor and Industry were bickering — Finance usurped American democracy.

    For too long, Labor, Industry and the Greens have been talking over each other’s heads — or at each other — from their deeply entrenched positions. Now they must settle differences, unite and organise — to tackle the really big issues.

    It means uniting — as communities — to defend families and businesses from foreclosures. It means standing together and challenging the bankers — holding demonstrations outside banks, educating ourselves and our communities about what has happened.

    It means holding elected representatives to account for their record on this issue; and throwing them out if they collude with the outlaws.

    And it also means changes to our lifestyles — less borrowing, less dependence on the banks, and less consumption, to make the world more sustainable — and to remove the power of money over the way we live.

  4. "The Trend May Not Be Your Friend". By John Mauldin (John@FrontlineThoughts.com). Thoughts from the Frontline.

    MV=PQ. This is an important equation; this is right up there with E=MC2. M (money or the supply of money) times V (velocity, which is how fast the money goes through the system -- if you have seven kids it goes faster than if you have one) is equal to P (the price of money in terms of inflation or deflation) times Q (which roughly stands for the quantity of production, or GDP)

    So what happens is, if we increase the supply of money (ver gráfico ao fundo da pagina) and velocity stays the same, if GDP does not grow, it means we'll have inflation, because this equation must balance. But if you reduce velocity (which is happening today), and if you don't increase the supply of money, you are going to see deflation. Now, we are watching, for reasons we'll get into in a minute, the velocity of money slow. People are getting nervous, they are not borrowing as much, either because they can't or because the "animal spirits" that Keynes talked about are not quite there.

    [... ] The headline in the Wall Street Journal says China grew at 6.1% last quarter. That doesn't sound bad. But what was not in the story is that nominal growth was just 3.7%. The other 2.4% was because of deflation. To get real (after-inflation) growth you subtract inflation and/or add deflation. Growth in China is slowing down more than the headlines suggest.

  5. Segundo o Bank of International Settlements, o valor nocional do mercado global de derivados (derivatives) é da ordem dos $746 708 000 000 000 (BIS Quaterly Review, December 2008) — i.e. mais de 12 vezes o PIB mundial! Admitindo um risco de exposição média na ordem dos 7%, a estimativa líquida do risco de exposição deste buraco negro da especulação financeira, localizada sobretudo no Reino Unido e nos EUA, aponta para um valor de $52 269 560 000 000 — i.e. muito próximo do PIB mundial ($60 689 812 000 000). Como mais de 70% destes contratos incidem no casino das taxas de juro —contratos OTC sobre taxas de juros (Forward rate agreements, Interest rate swaps e Options)— e a América, bem como o Reino Unido, o Japão e a própria União Europeia, decidiram reduzir a zero estas mesmas taxas, podemos imaginar as consequências!

  6. O vazio gerado pelo colapso em curso da economia americana está a forçar a China a movimentos acelerados, que poderão passar pela aquisição de activos e estabelecimento de entrepostos comercais e financeiros avançadas em certos vértices do seu futuro espaço vital. Portugal será seguramente um desses objectivos.

    "China's Coming Of Age In The WTO War"
    Tina Wang, 04.20.09, 10:00 PM EDT (Forbes newsletter)

    In a massive shift, China is getting more aggressive about launching WTO disputes. Amid the global economic slump, the U.S. may find itself getting dragged to the WTO's court more often.

    HONG KONG -- Gone are the days when China shied away from launching suits against other countries before the World Trade Organization's top court. Facing a distressed export sector and rising protectionism amid the global economic crisis, the Chinese government will get more comfortable and aggressive about lodging WTO complaints against the U.S., scholars and lawyers say.

  7. "Graves Erros na Política de Transportes", Rui Rodrigues

    20-04-2009 (Público) — Os portos portugueses, por não estarem ligados directamente à nova rede ferroviária, com a mesma bitola, electrificação e sinalização, não poderão transportar directamente os contentores para à U.E. e o nosso país ficará mais isolado e menos competitivo.

    TRÊS ERROS NA NOVA REDE PORTUGUESA

    No site da RAVE, empresa que efectua os estudos da nova rede ferroviária em Portugal, é possível observar vários erros de conceito muito graves.

    1. A nova linha Lisboa-Porto só está projectada para passageiros;

    2. Não há ligação, através de linhas de bitola europeia, aos portos de Sines e Setúbal;

    3. Não se justifica uma linha convencional de mercadorias para cargas de 25 Ton/eixo, ao lado de uma linha mista (passageiros e mercadorias), também para 25 Ton/eixo.

  8. Governo adia privatização da TAP e da ANA depois de ter instruído o gaúcho Pinto para comprar por 140 milhões de euros uma empresa falida ao BES —a Portugália Airlines—, e manter no ar aviões vazios, só para atrasar a cedência de Slots às Low Cost, simulando a tão necessária saturação virtual da Portela que justificasse o famigerado NAL.

  9. Em Março de 2009, Lisboa registou -17.1% passageiros a utilizar a sua infra-estrutura aeroportuária. A acompanhar este decréscimo está a variação de movimentos, que 12 meses depois conta com -8,9%.

    Mas se olharmos para os valores acumulados desde o princípio deste ano relativamente ao mesmo período de 2008, a queda é respectivamente de -10,4% e -8,5%.

    Os movimentos de carga revelam a mesma tendência: -10,2% em Março relativamente ao mês homólogo de 2008, e -13,1% no valor acumulado desde o princípio do ano relativamente a período homólogo de 2008.

    Entre as cinco companhias comerciais preferidas pelos passageiros que chegam e partem de Lisboa, só a Lufthansa assinala crescimento.

    TAP 527.966 -16.4%
    easyJet 89.773 -3.1%
    Lufthansa 45.316 5,0%
    Iberia 39.592 -4.7%
    SATA 39.116 -31.7%

    Na origem dos tráfegos constata-se que 80% dos passageiros provêem de aeroportos europeus. E destes 30% são oriundos de Espanha e Portugal.

    América do Sul (Brazil e Venezuela) subiu de 8% para 10% nos periodos de Janeiro-Março de 2008 e 2009. O tráfego de Angola subiu de 2,8% para 3,0% e os Estados Unidos decaíram de 1,7% para 1,5%, representando hoje a mesma importância em termos de movimento de passageiros que Cabo Verde, ou seja cerca de 13 500 passageiros por mês, representando uma queda superior a 30% no que vai de ano relativamente a 2008!


USA-GDP-MEW



OAM 577 26-04-2009 01:00 (última actualização: 13:26)

sexta-feira, janeiro 16, 2009

Alta Velocidade 3

Ó Manuela, que desgraça!
O Bloco Central do Betão esperneia pelos terrenos da Portela e por cidades aeroportuárias

Projecto do TGV é campo de batalha entre PSD de Ferreira Leite e Governo

16-01-2009 (RTP) — Os ecos da entrevista de Manuela Ferreira Leite à RTP assumiram esta sexta-feira a forma de um duelo político entre a direcção social-democrata e o ministro das Obras Públicas, a propósito da oportunidade do projecto da rede ferroviária de alta velocidade. O PSD de Ferreira Leite promete “riscar” o TGV do mapa se vencer as legislativas, ao que Mário Lino responde com acusações de “falta de credibilidade” e “embuste”.

O governo já percebeu que a conversa dos aeroportos, TGVs e novas pontes sobre o Tejo foi chão que deu uvas e vai precisar de uma pausa para reflexão. Este cesto de fruta só voltará a estar acessível depois do ciclo eleitoral de 2009 — avaliados os estragos da crise em curso, e a nova configuração político-partidária emergente do naufrágio à vista do Bloco Central — assim faça Cavaco Silva o que tem que fazer, sob pela de, não o fazendo, acompanhar o dito bloco no afundamento geral do actual regime político.

A prova de que o PS já percebeu a situação é que nada de substancial incluiu sobre estes três dossiers no Orçamento de Estado de 2009 — com a possível excepção da anunciada privatização da ANA e venda a patacos dos terrenos da Portela a um sindicato de empresários inúteis, incapazes de vencer um único concurso internacional (nem que seja na Bulgária), ou de produzir qualquer coisa de boa para o país.

Este exército de lapas, unido pela sua congénita dependência do Estado e pela corrupção, apesar de ter estuporado meio Portugal, insiste em continuar a esburacar o país com as suas retro-escavadoras e orçamentos fraudulentos até que Portugal desapareça literalmente do mapa! A explicação é simples: estão endividados até ao tutano, tiveram mais olhos do que barriga, fartaram-se de comprar tudo e todos com dinheiro emprestado que agora não podem pagar, estão apavorados com a perspectiva mais do que certa das falência que aí vêm — em suma, imagino-os aos gritos, entupindo os telemóveis de José Sócrates, Manuela Ferreira Leite e Aníbal Cavaco Silva com gemidos do estilo:

— Mais obras!
— Mais concursos martelados!
— Mais trabalhos a mais!
— Mais avales!
— Mais dívida!
— Mais dívida infinita, por favor! — imploram perante um poder político cada vez mais borrado de medo.

Ora como toda a gente sabe, a extensão da rede de Alta Velocidade e Velocidade Elevada da Europa/Espanha até Portugal —apesar da sua óbvia importância estratégica e sustentabilidade a médio-longo prazo— não alimenta os Ferraris, os Jaguares, os Bentleys, os Porche Cayaenne e os Aston Martin dos cérebros altamente evoluídos da Mota-Engil, da Pedro Duarte, da Brisa e da vasta rede de concessionários da nossa mentalmente atrasada burguesia palaciana. Estas mioleiras não produzem aço. Não fabricam comboios. Nem sequer sistemas de sinalização e gestão avançada de tráfego ferroviário sabem fazer. Querem pois lá saber do TGV! Mesmo que este possa aproximar portugueses e produtos portugueses do resto da Europa, a velocidades e fretes muito mais competitivos, com ganhos de contexto evidentes, diminuindo substancialmente a nossa pegada ecológica, a intensidade energética da nossa economia, a dívida externa (pela óbvia diminuição de importações petrolíferas) e a propalada, embora completamente falsa, saturação dos nossos principais aeroportos. Não, o que esta gajada quer é mesmo especular com os terrenos da Portela e de Rio Frio, fazer buracos, aldrabar o betão, e construir aeroportos desnecessários, para logo erguer a Babilónia do Alto da Portela, com um jardinzinho no meio, cheio de cocó de cão, que António Costa inaugurará alegremente acompanhado pelas luminárias da Ordem dos Arquitectos. A Nova Moscavide (vulgo Zona Expo) está no fim. Que bom seria mover o parque de máquinas o mais depressa possível para a Portela!

Aeroportos e cidades aeroportuárias, especialmente se forem projectadas pelo genial criador do aeromoscas de Beja — o famoso Augusto Mateus, especialista em exportações de peixe congelado alentejano — é a quinta essência do pensamento político de Manuela Ferreira Leite (certamente inspirado pelo homem da mala Arnaut) e de José Sócrates. Ambos querem afinal o mesmo. A diferença de opiniões resulta apenas de um pormenor: José Sócrates comprometeu a palavra de Portugal relativamente à rede de bitola europeia e velocidade elevada/alta em sucessivas cimeiras ibéricas!

A ave rara da economia portuguesa chamada Augusto Mateus tem a extraordinária peculiaridade criativa de inventar nado-mortos como ninguém. Ora de nado-mortos (conhecem a estação ferroviária de Castanheira do Ribatejo?) é que a produtiva indústria betoneira nacional precisa, para poder continuar a esburacar as montanhas, planícies e rios do país. Em vez de uma solução simples de aproveitamento do fenómeno Low Cost —que teria sido a adaptação do aeroporto do Montijo às companhias aéreas de baixo custo, atraindo-as em força—, acompanhada de uma modernização com pés e cabeça da Portela (prolongamento das pistas, extensão do taxiway, colocação de mangas, ocupação da placa de Figo Maduro, substituição dos incompetentes que há anos malbaratam a principal porta de entrada no país com um serviço indigno de qualquer país europeu), o dromedário das Obras Públicas, mais a amazona que exponencialmente o acompanha na asneira, tudo têm feito para servir os superiores interesses no Bloco Central do Betão e rebentar com a possibilidade de termos uma política de transportes racional e adaptada às necessidades do país.

Manuela Ferreira Leite está pelos vistos disposta a rebentar com a Portela, assinando de cruz a futura privatização da ANA. O pacto do Bloco Central está pois assinado por baixo da mesa. O folclore da polémica não passa disso mesmo; de um folclore mediático para esconder a corrupção que prossegue ao mais alto nível!

Nota final: João Cravinho continua impávido na sua senda obtusa pela única ligação de Alta Velocidade económica e politicamente insustentável no médio prazo, e que os portugueses manifestamente não querem porque não poderão pagá-la: a linha AV Porto-Lisboa. Basta meditar no seguinte facto: o que mais cresce na ligação ferroviária Lisboa-Braga, não é o Alfa, mas sim o Intercidades. Pelo contrário, as ligações transversais do país à Europa, a começar pela Espanha, mesmo se servem os desígnios estratégicos de Madrid, não deixam de servir ainda melhor os portugueses! As únicas obras públicas de grande envergadura de que Portugal precisa urgentemente são precisamente as ligações ferroviárias em bitola europeia às Espanhas e às Europas, e a criação dum fortíssimo cluster de indústrias associadas ao mar, começando por definir uma política portuária racional, ambiciosa e desapaixonada. Tudo o resto —barragens fraudulentas, aeroportos intercontinentais, mais auto-estradas— não passa de um mau serviço ao país e da prova provada de que a burguesia burocrática que domina Portugal ainda não encontrou um político à altura, capaz de a pôr a trabalhar e nos eixos.

OAM 515 16-01-2009 18:38

sexta-feira, agosto 08, 2008

Portugal 39

O Estado, a falência e a bolha das infraestruturas
Roads, airports on the block as budgets tighten

By Jonathan Stempel (Reuters)

NEW YORK (Reuters, Fri Aug 1, 2008) - Cash-strapped U.S. state and city governments are likely to sell or lease more highways, bridges, airports and other assets to investors desperate for stable returns after being frazzled by the credit crisis.

The trend is set to pick up speed given worsening budget deficits in state capitals and city halls nationwide.

It will also be welcomed by Wall Street bankers hoping to help create and market so-called "infrastructure" transactions at a time many debt markets remain paralyzed, and after major U.S. stock indexes fell into bear market territory.

... Critics say some infrastructure transactions are short-term budget fixes that deprive governments of steady cash streams from taxpayer-funded assets. There is also the risk that private operators won't do their jobs well.

Manuela Ferreira Leite afirmou que não há dinheiro para nada. A nomenclatura clientelar do regime ficou com os cabelos em pé. Não por descobrir algo que não sabia. Mas por não ter conseguido evitar que uma pessoa informada e aspirante ao cargo de primeiro ministro tivesse dito a verdade.

A realidade é simples: não há dinheiro, nem sequer para pagar aos funcionários públicos. Ou seja, o Estado só consegue assumir os seus compromissos, somando dívida à enorme dívida que já tem. Quem lhe empresta o dinheiro não são os bancos nacionais, pois esses estão também altamente endividados, mas a banca europeia e internacional (que por sua também está endividada!), através dos seus representantes e parceiros locais. Como o dinheiro escasseia e subiu de preço em resposta a uma espiral inflacionista que não cederá tão cedo, as perspectivas económico-financeiras aproximam-se cada vez mais do cenário de uma prolongada recessão europeia, que poderá chegar já em 2009.

É perante o dramatismo desta situação, que Manuela Ferreira Leite reconhece, mas sobre a qual os beneficiários oportunistas do sistema nem querem ouvir falar, que deveremos analisar a misteriosa polémica estival sobre uma meretriz chamada ANA.

A ANA deste Verão não é, porém, uma pessoa, e muito menos uma pessoa de bem. É uma empresa pública que dá lucro apesar de mal gerida. Por mais mordomias que tenha e aselhices que faça -- e faz muitas --, explorar os aeroportos do país em regime de monopólio dá algum dinheiro precioso ao país, de forma segura e continuada. Enquanto houver aviões, aeroportos, profissionais e emigrantes em viagens, e turistas low cost, este género de negócio é tão apetecível quanto os das auto-estradas com portagens, portos marítimos, barragens e redes de distribuição eléctrica, centrais solares, redes de abastecimento de águas, estações de tratamento de esgotos, centrais de recolha e tratamento de lixos, em suma, tudo o que esteja na origem dum bem público indispensável.

A razão pela qual todos estes negócios -- que as economias de casino querem transformar num novo balão especulativo -- foram até agora propriedades de Estado, i.e. bens públicos, é também muito simples. Por um lado, emergiram como necessidades gerais das comunidades, não podendo por isso ser tratados como negócios destinados à obtenção do lucro máximo. Por outro, dada a escala das operações e dos investimentos necessários ao seu estudo, projecto, construção, implementação e gestão de longo prazo, não se coadunavam, em parte nenhuma do planeta (nem sequer nos Estados Unidos), com as escalas e os objectivos típicos das actividades industriais e comerciais centradas na obtenção do lucro máximo.

No entanto, a falência do capitalismo na Europa e nos Estados Unidos está a levar os governos a um beco sem saída. Tendo evoluído em direcção à chamada economia imaterial, associada ao consumo e à liquidez electrónica, o Ocidente exportou boa parte da sua capacidade produtiva, dos seus conhecimentos e das suas tecnologias para o Oriente, tornando-se progressivamente numa imensa mancha demográfica de consumidores ávidos e psicologicamente dependentes. A compensação deste desequilíbrio tem sido colmatada à custa do endividamento geral do Ocidente, sob a forma da criação de dinheiro virtual, com o qual temos vindo a fingir que pagamos quase tudo o que consumimos. Sucede, porém, que essas fichas de casino, chamadas Dólar, são aceites em todo o mundo como meio válido de pagamento. E assim sendo, chegará o momento em que os produtores de matérias-primas e de outros bens transaccionáveis se transformarão na própria banca, comprando, por assim dizer, a Casa da Moeda dominante.

Eis porque um número crescente de governos de todo o mundo (mas não da China, nem da Rússia, nem de boa parte dos grandes países produtores de petróleo, gás natural e matérias primas) tem sido levado a alienar os anéis nacionais. A venda a correr do que resta de público na GALP (com a desculpa esfarrapada das imposições comunitárias), a tentativa de vender o monopólio estatal das infraestruturas e actividades aeroportuárias a um único privado, o qual levará também de mão-beijada os terrenos da Portela, para em contrapartida construir um grande aeroporto que ninguém pediu e, pior do que isso, que se pretende fazer contra a evidência escancarada dos tempos, é toda uma demonstração prática do colapso que aí vem.

Depois de vender tudo aquilo que os portugueses levaram um século a construir, sob o peso dos impostos que foram pagando, e dos fracos salários que sempre foi o timbre da sua fraca economia, que farão os governos que sucederam ao Bloco Central do Betão? Quando já não houver golden shares, como pagarão os vencimentos da Função Pública? Carregando mais nos impostos? Eu diria que é uma impossibilidade teórica manifesta. Vendendo o resto da pouca superfície de terra agrícola disponível aos chineses, para aí se construírem réplicas do Empire State Building, lançando o país na fome e na insolvência alimentar mais do que certa? Não creio que consigam. Nem que os ditos chineses venham a estar interessados!

O mistério da ANA, de que a maioria socratintas e os seus aliados do Bloco Central do Betão fazem uma mal disfarçada caixinha, não é, como se vê, nenhum mistério. Trata-se tão só de continuar a descer a ladeira para a total perda de independência económica do país, muito provavelmente a favor dos sonhos húmidos de la Moncloa e da Zarzuela!

Agora mistério, mistério, é saber quem irá pagar os prejuízos aos privados que hoje especulam com as infraestruturas, quando o povo deixar de poder pagar as rendas e as portagens, ou os aviões deixarem de voar como hoje. Os contratos e as já tristemente famosas Parcerias Público Privadas (PPP) rezam invariavelmente que, quando o negócio não dá os lucros previstos, será o Estado a pagar a diferença! Mas se este estiver, como vai estar, falido, como é? Ou por outra, como será?!

OAM 408 08-08-2008 1:22

segunda-feira, agosto 04, 2008

Mobilidade 2

Desnorte governativo
ANAtonta encomenda relatório masoquista, com o nosso dinheiro, claro!
Porto
4-08-2008. "A minha preocupação, enquanto presidente da Junta Metropolitana do Porto (JMP), é que, depois de um estudo ter considerado o aeroporto Sá Carneiro (1) como a infraestrutura mais importante para o desenvolvimento regional, ele fique ao serviço da economia desta região", frisou Rui Rio. -- in Expresso (Lusa).

Madeira
O estudo apresentado na semana passada pela Associação Comercial e Industrial do Funchal e realizado pela empresa Price Waterhouse Coopers, conclui que até 2015 o PIB turístico da Região Autónoma da Madeira pode crescer entre 1 e 4.3% devido ao tráfego das companhias low cost.

O contributo do turismo para o PIB regional estima-se em 688 milhões de euros, o que representa 21.3% do PIB.

Com operações para a Madeira desde Outubro de 2007 as “low cost”, contribuíram para um acréscimo de 10.6 % de turistas no arquipélago. -- in Low Cost Portugal.

Creio que a viagem de José Sócrates a Luanda correu mal para a TAP, para a tríade de Macau (TdM) e para o Bloco Central do Betão (BCB). Por outro lado, as notícias que me chegam do Brasil não são nada animadoras relativamente ao futuro político daquele país atolado em corrupção. Quando se souber (EIA) que a campanha mediática em volta do petróleo ao largo da Baía de Santos foi pouco mais do que uma boleia especulativa oferecida pela crise petrolífera em curso, pois o dito crude é em geral pesado, encontra-se a profundidades entre 3600 e 6000 metros e debaixo de camadas de sal que podem medir 2 Km de espessura, haverá seguramente um terramoto em algumas empresas energéticas e gente a fugir para os paraísos da concorrência. Os dados conhecidos em Setembro de 2007, relativos à situação brasileira, eram basicamente estes: consumo anual de barris de crude em 2006 = 789.495.000; reservas conhecidas em Janeiro de 2007 = 11.700.000.000 barris; duração do recurso, mantendo-se constantes a produção e o consumo = 14,8 anos, i.e. 2020! Na realidade, muito antes de as reservas chegarem ao fim, os poços serão abandonados, as empresas petrolíferas mudarão de sector e o mundo estará (já está!) envolvido numa guerra global pelos recursos vitais à sobrevivência da espécie.

Entretanto, no pouco tempo que resta à aviação civil comercial de massas, e cortando o mal pela raiz, a TAP deve negociar imediatamente a entrada no vagão da BA+Iberia. As 3 companhias manteriam as suas "bandeiras", i.e. marcas (como aliás está previsto no pré-acordo entre a BA e a Ibéria), mas fariam uma preciosa vaquinha de fundos para compra de aviões, além de excepcionais economias de escala -- fundindo serviços comuns, eliminando rotas sobrepostas com load factors a descer, vendendo empresas fora do respectivo core business e, inevitavelmente, reduzindo substancialmente a força laboral.

De contrário, a TAP caminhará para um beco sem saída semelhante ao da Alitalia!

Como não se cansa de repetir Rui Rodrigues (2), o "fundamental" argumento do estudo do MOPTC sobre o suposto impacto negligenciável da Alta Velocidade nos voos até 800Km não só era previsivelmente falso, como se verifica agora, no caso daquela que é a segunda maior ponte aérea do mundo --Madrid-Barcelona--, que o futuro do transporte aéreo em distâncias entre 300 e 800 Km será rapidamente desviado para a ferrovia de qualidade e para os comboios rápidos.

Até ao fim deste ano, em apenas 10 meses de existência, a rota do AVE entre Madrid e Barcelona transportará mais passageiros do que todas as companhias aéreas que voam entre as duas cidades. Por outro lado, o movimento de passageiros no aeroporto de Málaga tem vindo a cair a pique desde que o AVE passa por lá.

O petróleo continuará a subir de forma empinada (apesar da forma tipicamente serrada dos gráficos), pelo que a aviação de "médio curso", só muito subsidiada poderá competir com a Alta Velocidade ferroviária. A conclusão a termo é óbvia.

Na concorrência aérea, por sua vez, a vantagem vai claramente para as companhias Low Cost (LC).

A TAP, que já praticamente deixou de por as asas em Faro (LC=70%), será muito provavelmente ultrapassada no Porto até ao fim deste ano (LC=44%), apesar de o movimento de passageiros no aeroporto Sá Carneiro estar a crescer vinte vezes mais do que o PIB nacional!

O exemplo da Madeira é mais uma acha para fogueira que consumirá irremediavelmente a estratégia do Bloco Central do Betão e da Tríade de Macau: o PIB da Madeira poderá crescer 4,3% em resultado do fenómeno Low Cost!

As LC e a Alta Velocidade ferroviária são os principais factores na evolução rápida actualmente em curso no negócio da aviação comercial. Um dos corolários desta evolução é o aumento exponencial da concorrência entre aeroportos situados nas imediações das redes europeias de Alta Velocidade e Velocidade Elevada. Qualquer pessoa tomará o TGV ou o AVE para apanhar um avião num aeroporto "perto de casa" -- i.e. até 300 Km de distância! Daí que a ameaça a Lisboa não venha do longínquo e improvável novo aeroporto de Campo Real, como refere o desmiolado relatório do Ministério da Obras Públicas e Transportes, mas do actual Aeropuerto de Badajoz -- que entrou num período de obras de melhoria de instalações, com conclusão prevista para 2011 --, e do possível novo aeroporto de Cáceres, previsto para 2016. Ou ainda... do Porto! Façam um inquérito para saber quantas pessoas deixam o carro na Estação do Oriente, apanham o Alfa até Campanhã, o Andante até Pedras Rubras, para finalmente voar na Ryanair, e terão uma surpresa. A teimosia da Ota não passou, como vai ficando escancarado para quem quiser entender, de uma estratégia estúpida para bloquear o Norte do país, sem trazer nada de bom a Lisboa. Os empreiteiros-banqueiros que foram na conversa não passam de idiotas de curto prazo, ou de traidores.

Em suma, como mais de 82% do negócio da TAP acontece num raio de 2300 Km a partir de Lisboa, o fim da coisa está à vista. A minha pergunta é simples: que fazer aos responsáveis de tanta asneira?


NOTAS
  1. Pista única do aeroporto Sá Carneiro.
    Para aumentar o número de operações por hora (descolagens e aterragens) neste excelente aeroporto só falta mesmo ampliar o incompleto taxiway disponível e implementar um já inadiável sistema de auxílio à aterragem de precisão (ILS) -- que a ANA não implementou até agora por motivos de perigosa estratégia política.

  2. Efeito das Low Cost e AV
    Ao consultar-se o documento Orientações Estratégicas para o Sistema Aeroportuário Nacional, de 30-6-2006 do Ministério das Obras Públicas poderá confirmar-se que o efeito da AV é ignorado no referido relatório e pouca importância é dada às Low Cost. Na pág. 63 (PDF) em está escrito:

    “Considerando o aeroporto de Lisboa os potenciais concorrentes futuros serão o comboio de alta velocidade e o futuro aeroporto de Campo Real. O possível impacto da alta velocidade supõe-se ser baixo e em termos dos passageiros de turismo e de negócios. O novo aeroporto de Madrid em Campo Real por sua vez, que poderá entrar em funcionamento dentro de 25 a 30 anos, e a concretizar-se terá um impacto alto.”

    Estes comentários são surpreendentes dado que o Ministério das Obras Públicas em vez de estar atento à nova base, em Badajoz, está mais preocupado com o novo aeroporto de Madrid que só será construído nos próximos 25 a 30 anos. -- in Público-Transportes.

OAM 403 4-08-2008 19:54

domingo, fevereiro 10, 2008

o Grande Estuário

Vista do estuário do Tejo e da ponte Vasco da Gama, de Alcochete
Vista do estuário do Tejo e da ponte Vasco da Gama, de Alcochete.

Do teimoso Cravinho à TTT

A corrupção.
A cruzada de João Cravinho contra a corrupção é admirável e revela um homem corajoso com princípios bem assentes. Apoio-o inteiramente nesta guerra, que não podemos adiar, sob pena de vermos o país transformado numa paisagem siciliana atravancada de Sopranos e governada por uma tríade de piratas! A indignação pública contra esta epidemia que nos definha tem vindo a crescer, o que não deixa de ser uma boa notícia. Mas como há muito escrevi, enquanto não virmos um empresário ou banqueiro dos grandes e meia dúzia de políticos na prisão, ou expulsos da política por indecência e má figura, tudo não passará de fogo de vista e intenção piedosa. Enquanto a polícia (ela própria corroída pela mesma doença), os tribunais (pejados de vícios burocráticos e corporativistas execráveis) e os advogados (onde assomam individualidades promiscuas, se não mesmo mafiosas, cujo mediatismo é por vezes proporcional à impunidade de que gozam) não remarem para o mesmo lado - isto é, para o lado da Justiça -, não haverá verdadeira mudança de atitude. Muito pelo contrário! Se os processos anti-corrupção não obtiverem resultados tranquilizadores em tempo razoável, prevalecerá a ideia de que o ilícito compensa, sobretudo se praticado pelos ricos e poderosos. Os crimes têm que ser punidos e sobretudo prevenidos. Se o tempo do castigo decorre ainda da proverbial lentidão dos processos judiciais, já o tempo da precaução e da prevenção, isto é da criação de leis, de regras e de consensos subjectivos assumidos socialmente, pode e deve ser encurtado drasticamente, em nome da absoluta necessidade de estancar a actual tendência aparentemente irreprimível para o cabotinismo, o nepotismo e a corrupção (1).

A leviandade sobre aeroportos e ferrovias.
Há porém outra doença na nossa democracia que pode ser tão ou mais letal: a leviandade. Trata-se de um mal que afecta uma franja crescente de altos responsáveis administrativos, técnicos e sobretudo políticos. Quase sempre ignorantes das coisas práticas da vida que não acontecem no regaço do Estado, adquiriram o péssimo hábito de dizer e fazer (ou tentar fazer) o que lhes vem à cabeça, ou é soprado do Além! É o caso da obsessão de João Cravinho pela Ota, e tem sido também o caso da telenovela produzida pelo MOPTC, protagonizada por Mário Lino e agora também pela sua tão ambiciosa quanto ignorante ajudante de campo, Ana Paula Vitorino.

Cravinho continua sem perceber que o fecho do aeroporto da Portela, em nome da construção dum Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) na Ota, seria um desastre monumental, sob todos os pontos de vista! E continua sem perceber a essência escondida de toda esta polémica, ou seja, que no actual contexto ibérico, europeu e euro-atlântico, terá forçosamente que haver dois, e não apenas um, eixos estruturantes do futuro protagonismo de Portugal na nova geometria estratégica europeia. É pois tão decisivo fortalecer o eixo Lisboa-Porto-Corunha, como fortalecer o eixo Lisboa-Madrid-Barcelona. O protagonismo euro-atlântico cabe de novo aos países ibéricos, mas para lá chegarmos precisamos de fortalecer a aliança ibérica em todas as suas vertentes, sem confusões e sem complexos.

Ora, para fazermos a nossa parte, resulta evidente que, depois de quase concluída a rede de autoestradas e rodovias rápidas construída nos últimos trinta e quatro anos, a prioridade deve agora inflectir para a renovação e recuperação da nossa rede ferroviária (2), estabelecendo o Pi da Alta Velocidade e da Velocidade Elevada do país e da sua ligação a Espanha e ao resto da Europa, bem como um plano acelerado de substituição da bitola ibérica, das actuais linhas férreas nacionais, para a bitola standard europeia.

Por outro lado, no que refere ao transporte aéreo, a principal prioridade nem sequer é construir um novo aeroporto internacional, e muito menos a cidade aeroportuária defendida à toa por Augusto Mateus - o mesmo que estudou, cobrou e agora deveria ser responsabilizado pelo aeromoscas de Beja!

Atender às verdadeiras prioridades deste sector passa por decisões simples e muito menos caras de executar. Passa por despedir a actual e desastrosa administração da ANA e por fracturar esta instituição estatal em três entidades regionais (ANA-Sul, ANA-Norte e ANA-Ilhas). Passa por explorar imediatamente o potencial todavia existente no aeroporto da Portela. Passa por melhorar a operacionalidade das aeronaves no aeroporto Sá Carneiro, resolvendo o problema técnico gritante do respectivo Taxi way. Passa por desbloquear os entraves sucessiva e reiteradamente levantados às companhias de Low Cost que pretendem operar ou incrementar a sua presença nos aeroportos do continente e ilhas. Passa por manter o NAL de Alcochete em banho-maria, pronto a avançar caso se verifique que a recessão mundial que aí vem e o pico petrolífero não passam de uma invenção pérfida da Al-Qaeda! Passa por uma dolorosa mas inevitável racionalização da TAP, e pela busca de um solução de viabilidade para esta histórica companhia. E pode passar ainda, se for preciso, pela utilização complementar da Base Aérea do Montijo, oferecendo aí novas plataformas operacionais às companhias Low Cost.

A Terceira Travessia do Tejo (TTT)
A previsão do preço do petróleo para 10 de Fevereiro de 2009 era de US$119,22. Isto significa que, não apenas o petróleo e o gás natural deixaram de ser recursos baratos, mas também o ferro, o cimento, o PVC, tal como o pão e o leite, estarão dentro de um ano proporcionalmente mais caros. Seria aliás interessante as nossas universidades estudarem que parte desta inflação estrutural-global tem vindo a influenciar a sistemática derrapagem dos orçamentos das obras públicas, já que os preços das principais matérias-primas sobem diariamente! Ou seja, tal como no caso do NAL, a TTT terá que ser equacionada tendo bem presente o adverso contexto sistémico que aí vem.

Para já, precisamos de uma ponte ferroviária - apenas ferroviária - que permita ao AVE chegar à cidade de Lisboa. O corredor mais lógico e com menos impacte ambiental é o que se aproxima da actual ponte Vasco da Gama, ligando o Pinhal Novo à futura estação ferroviária central de Lisboa, algures no vale de Chelas (ver PDF de Rui Rodrigues). Por outro lado, precisamos de mais comboios a servirem a ligação, pela ponte 25 de Abril, entre Setúbal e Lisboa. Uma eventual ligação submarina entre Algés e a Trafaria, para carros e metropolitano, tem vindo a ser proposta como fecho duma CRIL alargada à Margem Esquerda do Tejo. Faz sentido, mas a sua real viabilidade depende, tal como a necessidade de avançar já para o NAL de Alcochete, de uma avaliação mais atenta dos efeitos das crises energética e sistémica em que o mundo parece ter entrado.

A hipótese de uma ponte entre Chelas e o Barreiro, submetida entretanto à consideração técnica do LNEC, seguir em frente, seria o verdadeiro hara-kiri do Grande Estuário. Se as mentes iluminadas que vão estudar o assunto nos próximos 45 dias (ler despacho governamental), não repararem no óbvio, teremos nova frente de luta contra o dromedário-mor do reino!



NOTAS
  1. 12-02-2008. Portugal tem elevados níveis de corrupção e má governança, mas não se encontra no topo da tabela, longe disso. Daí que seja importante, no debate em curso, fazer uma avaliação aprofundada e sobretudo bem documentada do problema. A breve comparação sumária que se segue serve apenas de mote a uma percepção mais aprofundada, que os documentos a seguir indicados ajudarão certamente a construir. Nos estudos abaixo sugeridos não constam, porém, os grandes jogos político-financeiros, de que a actual crise internacional é reflexo directo, e que, bem vistas as coisas, constituem um imenso continente de corrupção disfarçada sob as máscaras da política económica e da suposta idoneidade das instituições financeiras e bancárias mundiais.

    Índice de corrupção segundo o Banco Mundial
    Corporate Corruption / Ethics Indices (Theoretical range of indices 0-100%)

    Alemanha | Portugal | Espanha | Angola

    1 - Corporate Illegal Corruption Index -- 85,5 | 68,2 | 62,2 | 18,3
    2 - Corporate Legal Corruption Index -- 62,4 | 42,0 | 39,7 | 30,7
    3 - Corporate Ethics Index (1+2) -- 73,7 | 55,1 | 51,0 | 24,5
    4 - Public Sector Ethics Index -- 74,3 | 60,4 | 59,4 | 13,7
    5 - Judicial / Legal Effectiveness -- 85,5 | 65,0 | 53,0 | 15,5
    6 - Corporate Governance Index -- 90,8 | 49,5 | 52,4 | 15,4

    Referências

    -- Corporate Corruption / Ethics Indices: Country Averages
    -- World Bank Institute Governance & Anti-Corruption
    -- SSRN-Corruption, Governance and Security: Challenges for the Rich Countries and the World by Daniel Kaufmann
    -- SSRN-Governance Matters VI: Governance Indicators for 1996-2006 by Daniel Kaufmann, Aart Kraay, Massimo Mastruzzi

  2. 11-02-2008. A este propósito não poderia ser mais instrutivo comparar a política de transportes da Espanha com o cretinismo decisório das maiorias que nos têm governado ultimamente. A Espanha terá em 2010 a maior rede de Alta Velocidade e Velocidade Elevada do mundo! Esta ambiciosa decisão estratégica reduzirá drasticamente a pressão insustentável do transporte aéreo, fortalecendo de forma sábia e multiplicadora a sua ameaçada coesão territorial. As ligações AV entre Madrid e Sevilha, desde 23 de Dezembro passado, entre Madrid e Málaga, e a chegada técnica do primeiro AVE Siemens S-103 a Barcelona na passada Sexta-Feira, irão demonstrar o efeito previsto da competição crescente que a ferrovia fará ao transporte aéreo em distâncias até 800Km e sobretudo nas ligações regionais e interregionais. As actuais taxas de crescimento do tráfego aéreo cairão, só pelo efeito deste tipo de concorrência, para metade. O mesmo ocorrerá na Portela, seja por efeito da concorrência imparável das companhias de Low Cost no Porto, em Faro, no Funchal e em Ponta Delgada, seja por efeito das futuras ligações ferroviárias de AV/VE entre Lisboa e Madrid, e entre Lisboa e o Porto. Recomendo sobre este tema o mais recente artigo de Rui Rodrigues, Portela ultrapassa Málaga, publicado hoje no Público online. Especial atenção para o vídeo promocional do governo espanhol sobre a rede de Alta Velocidade, apontado na versão PDF do mesmo artigo.

    Os nossos levianos governantes têm que aprender de uma vez por todas que um atraso dramático relativamente à Espanha terá consequências dramáticas no país. Desde logo, pela drenagem inevitável de recursos humanos e económicos para o país vizinho. Por outro lado, têm que perceber que, sobretudo num país pobre como o nosso, a eficiência na energia, na mobilidade, na administração e na justiça, valem mais do que todos os Quadros Comunitários de Apoio desperdiçados e por vir.


OAM 308 10-02-2008, 04:56